quarta-feira, 17 de junho de 2009

Ação de investigação judicial eleitoral (AIJE) com base no art. 22 da Lei Complementar no 64/90 e art. 30-A da Lei no 9.504/97.


Recurso Ordinário no 1.540/PA
Relator: Ministro Felix Fischer
Ementa: Recurso ordinário. Ação de investigação judicial eleitoral (AIJE) com base no art. 22 da Lei Complementar no 64/90 e art. 30-A da Lei no 9.504/97. Irregularidades na arrecadação e gastos de recursos de campanha. Prazo para o ajuizamento. Prazo decadencial. Inexistência. Competência. Juiz auxiliar. Abuso de poder político. Conexão. Corregedor. Propositura. Candidato não eleito. Possibilidade. Legitimidade ativa. Ministério Público Eleitoral. Possibilidade. Sanção aplicável. Negativa de outorga do diploma ou sua cassação. Art. 30-A, § 2o.
Proporcionalidade. Provimento.
1. O rito previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64/90 não estabelece prazo decadencial para o ajuizamento da ação de investigação judicial eleitoral. Por construção jurisprudencial, no âmbito desta c. Corte superior, entende-se que as ações de investigação judicial eleitoral que tratam de abuso de poder econômico e político podem ser propostas até a data da diplomação porque, após esta data, restaria, ainda, o ajuizamento da ação de impugnação de mandato eletivo (AIME) e do recurso contra expedição do diploma (RCED). (REspe no 12.531/SP, rel. Min. Ilmar Galvão, DJ de 1o.9.95 RO no 401/ES, rel. Min. Fernando Neves, DJ de 1o.9.2000, RP no 628/DF, rel. Min. Sálvio de Figueiredo, DJ de 17.12.2002). O mesmo argumento é utilizado nas ações de investigação fundadas no art. 41-A da Lei no 9.504/97, em que também assentou-se que o interesse de agir persiste até a data da diplomação (REspe no 25.269/SP, rel. Min. Caputo Bastos, DJ de 20.11.2006). Já no que diz respeito às condutas vedadas (art. 73 da Lei no 9.504/97), para se evitar o denominado “armazenamento tático de indícios”, estabeleceu-se que o interesse de agir persiste até a data das eleições, contando-se o prazo de ajuizamento da ciência inequívoca da prática da conduta. (QO no RO no 748/PA, rel. Min. Carlos Madeira, DJ de 26.8.2005 REspe no 25.935/SC, rel. Min. José Delgado, rel. designado Min. Cezar Peluso, DJ de 20.6.2006).
2. Não houve a criação aleatória de prazo decadencial para o ajuizamento das ações de investigação ou representações da Lei no 9.504/97, mas sim o reconhecimento da presença do interesse de agir. Tais marcos, contudo, não possuem equivalência que justifique aplicação semelhante às hipóteses de incidência do art. 30-A da Lei no 9.504/97. Esta equiparação estimularia os candidatos não eleitos, que por ventura cometeram deslizes na arrecadação de recursos ou nos gastos de campanha, a não prestarem as contas. Desconsideraria, ainda, que embora em caráter excepcional, a legislação eleitoral permite a arrecadação de recursos após as eleições (art. 19, Res.-TSE no 22.250/2006). Além disso, diferentemente do que ocorre com a apuração de abuso de poder e captação ilícita de sufrágio não há outros instrumentos processuais – além da ação de investigação judicial e representação – que possibilitem a apuração de irregularidade nos gastos ou arrecadação de recursos de campanha (art. 30-A da Lei no 9.504/97). Assim, tendo sido a ação ajuizada em 5.1.2007, não procede a pretensão do recorrente de ver reconhecida a carência de ação do Ministério Público Eleitoral em propor a representação com substrato no art. 30-A da Lei no 9.504/97. Tendo em vista que a sanção prevista pela violação ao mencionado dispositivo representa apenas a perda do mandato, sua extinção é que revela o termo a partir do qual não mais se verifica o interesse processual no ajuizamento da ação.
3. Durante o período eleitoral, os juízes auxiliares são competentes para processar as ações propostas com fulcro no art. 30-A da Lei no 9.504/97 (AgRRep no 1.229/DF, rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJ de 13.12.2006; RO no 1.596/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ de 16.3.2009), o que não exclui a competência do corregedor, pela conexão, quando a ação tiver por objeto a captação ilícita de recursos cumulada com o abuso de poder econômico.
4. O Ministério Público Eleitoral é parte legítima para propor a ação de investigação judicial com base no art. 30-A (RO no 1.596/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ de 16.3.2009).
5. A ação de investigação judicial com fulcro no art. 30-A pode ser proposta em desfavor do candidato não eleito, uma vez que o bem jurídico tutelado pela norma é a moralidade das eleições, não havendo falar na capacidade de influenciar no resultado do pleito.
No caso, a sanção de negativa de outorga do diploma ou sua cassação prevista no § 2o do art. 30-A também alcança o recorrente na sua condição de suplente.
6. Na hipótese de irregularidades relativas à arrecadação e gastos de recursos de campanha, aplica-se a sanção de negativa de outorga do diploma ou sua cassação, quando já houver sido outorgado, nos termos do § 2o do art. 30-A. No caso, o recorrente arrecadou recursos antes da abertura da conta bancária, em desrespeito à legislação eleitoral, no importe de sete mil e noventa e oito reais (R$7.098,00), para a campanha de deputado estadual no Pará.
7. Não havendo, necessariamente, nexo de causalidade entre a prestação de contas de campanha (ou os erros dela decorrentes) e a legitimidade do pleito, exigir prova de potencialidade seria tornar inóqua a previsão contida no art. 30-A, limitado-o a mais uma hipótese de abuso de poder. O bem jurídico tutelado pela norma revela que o que está em jogo é o princípio constitucional da moralidade (CF, art. 14, § 9o). Para incidência do art. 30-A da Lei no 9.504/97, necessária prova da proporcionalidade (relevância jurídica) do ilícito praticado pelo candidato e não da potencialidade do dano em relação ao pleito eleitoral. Nestes termos, a sanção de negativa de outorga do diploma ou de sua cassação (§ 2o do art. 30-A) deve ser proporcional à gravidade da conduta e à lesão perpetrada ao bem jurídico protegido. No caso, a irregularidade não teve grande repercussão no contexto da campanha em si. Deve-se, considerar, conjuntamente, que:
a) o montante não se afigura expressivo diante de uma campanha para deputado estadual em estado tão extenso territorialmente quanto o Pará; b) não há contestação quanto a origem ou destinação dos recursos arrecadados; questiona-se, tão somente, o momento de sua arrecadação (antes da abertura de conta bancária) e, consequentemente, a forma pela qual foram contabilizados.
8. Quanto à imputação de abuso de poder, para aplicação da pena de inelegibilidade, necessária seria a prova de que o ilícito teve potencialidade para desequilibrar a disputa eleitoral, ou seja, que influiu no tratamento isonômico entre candidatos (“equilíbrio da disputa”) e no respeito à vontade popular (Ag no 7.069/RO, rel. Min. Carlos Ayres Britto, DJ de 14.4.2008, RO no 781, rel. e. Min. Peçanha Martins, DJ de 24.9.2004). No caso, não se vislumbra que as irregularidades na prestação de contas tenham tido potencial para influir na legitimidade do pleito, desequilibrando a disputa entre os candidatos e viciando a vontade popular. Assim, como a relevância da ilicitude relaciona-se tão só à campanha, mas sem a demonstração da potencialidade para desequilibrar o pleito (afetação da isonomia), não há falar em inelegibilidade.
9. Recurso ordinário provido para afastar a inelegibilidade do candidato, uma vez que não foi demonstrada a potencialidade da conduta para desequilibrar o pleito, e reformar o acórdão e manter hígido o diploma do recorrido, considerando que as irregularidades verificadas e o montante por elas representado, não se mostraram proporcionais à sanção prevista no § 2o do art. 30-A da Lei no 9.504/97.
DJE de 1o.6.2009.

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