domingo, 31 de maio de 2009

Gasto ilícito de recursos. Não-ocorrência. Camisetas padronizadas distribuídas a cabos eleitorais. Referência ao candidato. Ausência.

Recurso Ordinário no 1.449/GO
Relator: Ministro Eros Grau
Ementa: Recurso ordinário. Representação. Artigo 30-A da Lei no 9.504/97. Gasto ilícito de recursos. Não-ocorrência. Camisetas padronizadas distribuídas a cabos eleitorais. Referência ao candidato. Ausência. Limite previsto no art. 27 da Lei no 9.504/97. Provimento.
1. A organização de cabos eleitorais por meio de camisetas que não ostentem identificação relacionada às eleições ou ao candidato em disputa não contraria o disposto no art. 39, § 6o da Lei no 9.504/97.
2. Não aplicável, no caso, a sanção prevista no art. 30-A da Lei no 9.504/97.
3. Recurso ordinário provido para afastar a cassação do diploma expedido em favor do recorrente.
DJE de 21.5.2009.

Fundef. Contas. Prefeito. Julgamento. Competência. TCU.

Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral no 32.488/MA
Relator: Ministro Eros Grau
Ementa: Agravo regimental. Recurso especial. Fundef. Contas. Prefeito. Julgamento. Competência. TCU. Precedente do STF. Não-provimento.
1. Compete ao Tribunal de Contas da União julgar as contas de prefeito municipal referentes à aplicação de recursos do Fundef. Precedente do STF.
2. Decisão agravada que se mantém pelos seus próprios fundamentos.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
DJE de 21.5.2009.

Ausência de apelo explícito ou implícito ao eleitor. Propaganda eleitoral extemporânea.

A matéria já é bem conhecida, mas não podemos deixar de criticar a grande margem que decorre desse entendimento quanto à caracterização da propaganda eleitoral extemporânea. O TSE é bem restritivo em relação a determinados assuntos, mas deixa uma significativa brecha quando se fala em propagandas eleitorais que têm o nítido propósito de fazer promoção pessoal visando futuras (próximas ou remotas) eleições.

Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral no 26.901/SC
Relator: Ministro Felix Fischer
Ementa: Agravo regimental. Recurso especial eleitoral. Eleições 2006. Outdoors. Ausência de apelo explícito ou implícito ao eleitor. Propaganda eleitoral extemporânea. Não configuração. Não provimento.
1. A partir da moldura do acórdão recorrido, admite-se a revaloração jurídica dos fatos nela delineados, sem que isso implique contrariedade às súmulas nos 7/STJ e 279/STF. Precedentes: AgRAgRREspe no 26.209/MG, rel. Min. Caputo Bastos, DJ de 2.5.2007; AgRREspe no 25.961/PB, rel. Min. Gerardo Grossi, DJ de 21.2.2007; REspe no 25.144/BA, DJ de 24.3.2006; REspe no 25.247/PE, DJ de 16.9.2005, ambos da relatoria do Min. Marco Aurélio Mello. In casu, na decisão agravada, houve a revaloração jurídica dos fatos descritos no aresto regional e não reexame de fatos.
2. Na linha dos precedentes desta Corte superior, mensagens de cumprimento e felicitação, sem
referência a eleição vindoura ou a outro elemento que induza o eleitor a concluir que o possível candidato é o mais apto a exercer mandato eletivo, não configuram propaganda eleitoral extemporânea. Precedentes: AgRREspe no 26.236/MG, rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJ de 11.4.2007; AgRREspe no 25.961/PB, rel. Min. Gerardo Grossi, DJ de 21.2.2007.
3. Agravo regimental desprovido.
DJE de 21.5.2009.

A falta de aplicação do percentual mínimo em educação não gera inelegibilidade

Agravo Regimental no Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral no 30.169/MG
Relator: Ministro Eros Grau
Ementa: Agravos regimentais. Recurso especial. Decisão agravada alinhada com a jurisprudência do TSE.
1. A falta de aplicação do percentual mínimo em educação não gera inelegibilidade. Precedentes.
2. Decisão agravada que se mantém pelos seus próprios fundamentos.
3. Agravos regimentais desprovidos.
DJE de 19.5.2009.

sexta-feira, 29 de maio de 2009

TSE absolve governador de Santa Catarina em processo que pedia sua cassação

Os contornos que delimitam a publicidade institucional regular são tênues acarretando a necessidade de análise dos elementos fáticos do caso concreto.
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Cinco ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) acompanharam o voto do ministro Felix Fischer para negar o pedido de cassação do governador de Santa Catarina, Luiz Henrique da Silveira e seu vice, Leonel Pavan na sessão plenária desta quinta-feira (28). Apenas o presidente do tribunal, ministro Carlos Ayres Britto, votou em sentido contrário.
De acordo com o ministro Fischer, relator do caso, as irregularidades apontadas pela coligação Salve Santa Catarina – autora do pedido de cassação – não tiveram potencialidade para influenciar no resultado das eleições para o governo do estado em 2006. Em voto minucioso, o ministro Felix Fischer analisou cada argumento da acusação e concluiu que não havia motivos suficientes para cassar o mandato do governador.
A coligação apontou uso indevido dos meios de comunicação com propaganda institucional irregular; propaganda não institucional, mas com caráter personalíssimo; suplementos publicados em mídia impressa, todos pagos com recursos públicos; e entrevista com Luiz Henrique exibida em emissora de televisão.
Para a acusação, as propagandas “não continham qualquer caráter educacional, informativo ou de interesse social e foram pagas com dinheiro público, com a marca do desvio de finalidade pública e desrespeito ao equilíbrio dos candidatos”.
Já a defesa do governador e do vice alegou que não houve em nenhuma propaganda institucional do governo do estado menção ao nome do acusado. Para a defesa do governador, é necessária propaganda pessoal para se caracterizar o abuso dos meios de comunicação.
Ressaltou também que não existiu afronta alguma aos princípios constitucionais nas ações do governo estadual. Os advogados também afirmam que não há provas nos autos e nem documentos que comprovem as acusações.
Votos
Apesar de reconhecer irregularidade na divulgação dos suplementos, o ministro Fischer observou que não basta haver a irregularidade, é necessário haver a potencialidade para influenciar no resultado das eleições. E nesse sentido, não é possível medir essa potencialidade porque em nenhum momento há informação sobre a tiragem dos jornais, informação essencial, segundo ele, para saber a quantidade de leitores atingida pelas publicações.Em relação à divulgação de entrevista na televisão, ele afirmou que “uma única entrevista não é suficiente para se afirmar a existência de tratamento privilegiado na programação da emissora de modo a traduzir potencialidade a influir no pleito”.
Sobre a publicidade institucional, o ministro afirmou que o texto não promove a figura do governador, mas tem como fim informar a população sobre a gestão da coisa pública.Ele lembrou citação do ministro aposentado Sepúlveda Pertence, para quem é indiscutível que a propaganda institucional beneficia o titular do Executivo que se candidata a reeleição, mas se a Constituição permite a reeleição, não se pode proibir a propaganda a não ser nos três meses que antecedem a eleição, conforme determina a legislação eleitoral. O relator destacou também que parte da propaganda não institucional trata de divulgação de obras e tem caráter informativo.
O ministro Ricardo Lewandowski disse que vê de forma positiva o fato de Luiz Henrique ter se afastado do cargo para trabalhar em sua campanha a reeleição. Observou também que o Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina não viu potencialidade para cassar o mandato ao analisar o caso e o Ministério Público Eleitoral deu parecer pela absolvição. Ele concordou com o relator no ponto em que afirma que não há provas de que houve cooptação dos meios de comunicação, que a propaganda institucional se manteve dentro dos lindes institucionais, que as notícias dos jornais conservaram-se dentro dos limites da liberdade de imprensa e que o encaminhamento de projeto de lei a Assembléia Legislativa configura uma ato legítimo de governo e, portanto, não se pdoe presumir que ele tem um efeito ilegal.
Divergência
O ministro Carlos Ayres Britto disse que, em sua opinião, o governador praticou abuso de poder político e fez uso indevido dos meios de comunicação. Para ele, houve mistura entre ação de governo e promoção pessoal causando assim uma “promiscuidade” que influenciou no resultado das eleições.
Ele fez referência também a fato de o governo do estado ter encaminhado projeto de lei à Assembléia Legislativa para isentar de impostos os proprietários de motocicletas de menores cilindradas. O projeto foi aprovado e beneficiou milhares de eleitores, tendo contribuído para o resultado das eleições.
Apesar de estar afastado do governo na ocasião para trabalhar na campanha para o governo, Luiz Henrique teria sido beneficiado uma vez que o projeto foi enviado por Eduardo Moreira, vice-governador à época, que passou a ocupar o Poder Executivo no estado.Para Ayres Britto, houve “parceria ruinosa para o resultado do pleito”.
Processo relacionado:Rced 703

Escritório de advocacia garante pagamento de precatório alimentar antes dos demais

Essa decisão causará grande controvérsia no meio jurídico, uma vez que a Administração Pública geralmente classifica os precatórios em relações autônomas e realiza os respectivos pagamentos conforme a ordem cronológica de cada uma dessas relações independentemente do esgotamento dos precatórios alimentares.
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O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o pagamento de qualquer parcela de créditos de precatório comum antes do integral pagamento de precatórios alimentares representa quebra da precedência estabelecida pelo artigo 100 da Constituição Federal em favor dos créditos de natureza alimentícia. Ao analisar um recurso em mandado de segurança, a Primeira Turma autorizou o sequestro de cerca de R$ 11 milhões correspondentes a um precatório alimentar em benefício de um escritório de advogados de São Paulo.
A posição se firmou por maioria e baseou-se no entendimento do ministro Teori Albino Zavascki, segundo o qual os créditos alimentares têm preferência absoluta, devendo ser atendidos prioritariamente. O ministro destacou que os créditos alimentares foram retirados do regime de pagamento parcelado dos demais precatórios (previsto no artigo 78 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT) com a intenção de conferir a eles essa prioridade.
O débito em questão é relativo à condenação judicial em processo movido por uma empresa de limpeza contra o Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. O processo tramitou na 7ª Vara da Fazenda Pública da Capital. Dele, resultaram dois precatórios: um de natureza não alimentar, para a empresa (no valor de R$ 38.320.097,22), e outro de natureza alimentar, referente a honorários de sucumbência e contratados, em favor do escritório (no valor de R$ 11.183920,78). Os valores estão atualizados até 2001.
O escritório de advocacia não se conformou com o pagamento dos décimos do precatório não alimentar e nenhum do alimentar. O precatório da empresa de limpeza está sendo pago em dez prestações anuais, entre 2003 e 2012. A empresa apresentou pedido de sequestro de bens, o que foi negado pelo presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP). A posição era que o pagamento do precatório do escritório só poderia ocorrer após o pagamento de todos os “requisitórios alimentares que lhe antecedem”. Já as parcelas do precatório não alimentar estão sendo inseridas nos orçamentos anuais do estado de São Paulo.
Desta decisão, o escritório apresentou mandado de segurança contra o ato do presidente. O TJSP entendeu que não teria havido violação da ordem cronológica de pagamento, que deve se dar dentro da mesma classe de precatórios. Daí o recurso em mandado de segurança apresentado ao STJ.
A relatora do recurso, ministra Denise Arruda, votou no sentido de negar o pedido. Para ela, a decisão individual do presidente do TJSP teria natureza jurisdicional, o que significa que dela caberia agravo regimental (uma espécie de recurso interno) ao órgão especial do Tribunal de segundo grau.
Neste ponto, o ministro Teori Zavascki afirmou que a decisão do presidente do TJSP, dada no processamento de precatórios, negando o pedido de sequestro de verba pública, tem natureza administrativa. Conforme o ministro, o controle jurisdicional desses atos pressupõe ação própria, como o mandado de segurança. Para ele, não faria sentido supor que, no âmbito de um processo reconhecidamente administrativo, alguns atos assumam natureza jurisdicional. O voto vista do ministro Teori Zavascki foi acompanhado pelos ministros Francisco Falcão, Luiz Fux e Benedito Gonçalves.

terça-feira, 26 de maio de 2009

CNJ quer saber como tribunais contratam advogados

por Rodrigo Haidar
O Conselho Nacional de Justiça decidiu enviar ofícios aos tribunais pedindo informações sobre a contratação de advogados privados para atuar em defesa de seus interesses. A ação foi provocada pelo fato de o Tribunal de Justiça do Rio ter sido defendido, de graça, pelo escritório do advogado Sérgio Bermudes, em uma causa no CNJ.

Quando viu um advogado particular na tribuna, falando em nome do tribunal fluminense, o ministro Gilson Dipp lembrou que a defesa deveria ser feita pelo Estado, já que a ação contestava ato do presidente do TJ, Luiz Zveiter. Foi seguido por conselheiros que criticaram a direção do tribunal, defenderam licitação e decidiram pesquisar as relações entre tribunais e advogados país afora. Afinal, não existe almoço grátis.

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Propaganda eleitoral em bem público - prévio conhecimento - multa

Acho que o posicionamento do TRE/SP e do TSE está equivocado, pois, nos termos do §1º do art. 37 da Lei 9.504/97, somente é cabível a sanção pecuniária se, após a notificação e comprovação, a propaganda eleitoral irregular veiculada em BEM PÚBLICO não for removida ou o BEM PÚBLICO restaurado. Logo, não há que se perquirir sobre o prévio conhecimento, o qual deve ser investigado, somente, com relação às propagandas eleitorais instaladas em bens particulares.


Eleições 2008. Agravo regimental. Recurso especial. Via pública. Outdoor. Propaganda irregular. Caracterização. Infrator. Conhecimento prévio. Multa. Aplicação. Possibilidade. Dissídio jurisprudencial. Ausência. Matéria de fato. Prova. Reexame. Inadmissibilidade.
Caracteriza propaganda eleitoral irregular aquela veiculada em via pública, por meio de elemento móvel, mas utilizado de forma fixa.
Consoante a última parte do parágrafo único do art. 65 da Res.-TSE no 22.718/2008, o prévio conhecimento do infrator pode ser caracterizado consoante as peculiaridades do caso concreto, o que autoriza a aplicação de multa.
Não se caracteriza dissídio jurisprudencial quando a decisão regional é limitada à legislação e conforme o entendimento desta Corte.
Consubstanciada nas provas dos autos conclusão de TRE, ante as particularidades e características do caso concreto, é inviável o reexame do acervo fático-probatório, nos termos da Súmula-STF no 279.
Nesse entendimento, o Tribunal negou provimento ao agravo regimental. Unânime.
Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral no 32.738/SP, rel. em substituição Min. Ricardo Lewandowski, em 5.5.2009.

Prestação de contas de campanha eleitoral - Matéria administrativa - Recurso especial - Cabimento

Até que enfim o STF vai por a mão nesse assunto por meio RE com repercussão geral!!!

Agravo regimental. Agravo de instrumento. Prestação de contas de campanha eleitoral. Matéria administrativa. Recurso especial. Descabimento.
A atual jurisprudência desta Corte assentou não caber recurso especial contra decisão relativa a prestação de contas de campanha, por versar sobre matéria administrativa.
Nesse entendimento, o Tribunal anulou a decisão que negava provimento ao agravo regimental – proferida nesta sessão – e sobrestou o julgamento em razão do que decidido na repercussão geral em Recurso Extraordinário no 591.470-4/MG pelo Supremo Tribunal Federal. Este reconheceu a existência de repercussão geral na questão relativa ao cabimento de recurso especial de decisão sobre prestação de contas. Unânime.
Agravo Regimental no Agravo de Instrumento no 7.186/RJ, rel. em substituição Min. Ricardo Lewandowski, em 5.5.2009.

Termo de Ocorrência de Irregularidade

Por primeiro, faz-se necessário um esclarecimento acerca da natureza jurídica dos serviços de energia elétrica, que, ressalte-se, não se trata de serviço público essencial, mas sim, serviço de utilidade pública.

Nesse sentido, cumpre aduzir que, em inúmeros momentos, a doutrina tem distinguido os serviços públicos dos serviços de utilidade pública, para, no campo do Direito Administrativo, determinar a essencialidade de uns e a conveniência de outros, a fim, de distinguindo-se assim, dar-lhes as tratativas peculiares de modo a preservar sempre o bem estar público.

Assim, nos ensina HELY LOPES MEIRELLES[1]:

Serviços públicos: propriamente ditos, são os que a Administração presta diretamente à comunidade, por reconhecer a sua essencialidade e necessidade para a sobrevivência do grupo social, e do próprio Estado. Por isso mesmo, tais serviços são considerados privativos do Poder Público, no sentido de que só a Administração deve prestá-los, sem delegação a terceiros, mesmo porque, geralmente exigem atos de império e medidas compulsórias em relação aos administrados. Exemplos desses serviços são os de defesa nacional, os de polícia, os de preservação da saúde pública.
SERVIÇOS DE UTILIDADE PÚBLICA: são os que a Administração, reconhecendo a sua conveniência (não essencialidade, nem necessidade) para os membros da coletividade, presta-os diretamente, ou aquiesce em que sejam prestados por terceiros (concessionários, permissionários ou autorizatários), nas condições regulamentadas e sob seu controle, mas por conta e risco dos prestadores, MEDIANTE REMUNERAÇÃO DOS USUÁRIOS. São exemples dessa modalidade, os serviços de transporte coletivo, ENERGIA ELÉTRICA, gás, telefone
”. –
destacamos.

Verifica-se, então que, no primeiro caso (serviço público), a finalidade da prestação pelo Estado é satisfazer a necessidade geral e essencial da sociedade “para que ela possa subsistir”, enquanto que, no segundo caso (serviço de utilidade pública), o que se pretende é proporcionar mais conforto e bem-estar à coletividade. Nesse sentido, Hely Lopes Meirelles assevera que os serviços de utilidade pública, ou também chamados deserviços industriais, são impróprios do Estado, porque consubstanciam atividade que só pode ser explorada em caráter suplementar da iniciativa privada (CF, art. 173).

Nesta esteira de entendimento, NELSON SCHIESARI[2] classifica tal serviço como “serviço de execução indireta”, isto é, “aqueles tidos como não essenciais para sobrevivência do Estado, de caráter social ou econômico, por isto mesmo entregues a particulares, seja pela concessão, especialmente os de caráter industrial ou comercial, seja pela delegação”.

Destarte, o saudoso Mestre HELY LOPES MEIRELLES[3], define que o fornecimento de energia elétrica constitui serviço público não essencial, o classificado como serviço uti singuli ou individual, que é aquele que tem usuários determinados e utilização particular e mensurável, para tanto leciona que:

“Serviços uti singuli são os que têm usuários determinados e utilização particular e mensurável para cada destinatário, como ocorre com o telefone, a água e a ENERGIA ELÉTRICA domiciliares. Esses serviços, desde que implantados, geram direito subjetivo à sua obtenção para todos os administrados que se encontrem na área de sua prestação ou fornecimento e satisfaçam as exigências regulamentares. São sempre serviços de utilização individual, facultativa e mensurável, pelo quê devem ser remunerados portaxa (tributo) ou tarifa (preço público), e não por imposto.
O não pagamento desses serviços por parte do usuário tem suscitado hesitações da jurisprudência sobre a legitimidade da suspensão de seu fornecimento. Há de distinguir entre o serviço obrigatório e o facultativo. Naquele, a suspensão do fornecimento é ilegal, pois, se a Administração o considera essencial, impondo-o coercitivamente ao usuário (como é a ligação domiciliar à rede de esgoto e água e a limpeza urbana), não pode suprimi-lo por falta de pagamento; neste, é legítima, porque, sendo livre sua fruição, entende-se não essencial, e, portanto, suprimível quando o usuário deixar de remunerá-lo, sendo, entretanto, indispensável aviso prévio. Ocorre, ainda, que, se o serviço é obrigatório, sua remuneração é por taxa (tributo), e não por tarifa (preço), e a falta de pagamento do tributo não autoriza outras sanções além de sua cobrança executiva com os gravames legais (correção monetária, multa, juros, despesas judiciais).”

Desta feita, o fornecimento de energia elétrica trata-se de serviço de execução indireta ou uti singuli, remunerado por tarifa, não essencial, de livre fruição e, logo, suprimível quando o usuário deixar de remunerá-lo.
ATO ADMINISTRATIVO E PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE
Cabe, neste instante, salientar o conceito de concessão de serviço público, para que assim então se possa compreender a característica peculiar dos atos praticados pelas concessionárias de energia elétrica no exercício de competência delegada, plenamente vinculada.

Neste diapasão, Celso Antônio Bandeira de Mello[4] ao definir o conceito de concessão, nos ensina que:
Concessão de serviço público é o instituto através do qual o Estado atribui o exercício de um serviço público a alguém que aceita prestá-lo em nome próprio, por sua conta e risco, nas condições fixadas e alteráveis unilateralmente pelo Poder Público, mas sob garantia contratual de um equilíbrio econômico-financeiro, remunerando-se pela própria exploração do serviço, em geral e basicamente mediante tarifas cobradas diretamente dos usuários do serviço”.
Nesse sentido, tem-se que os serviços concedidos são todos aqueles que o particular executa em seu nome, por sua conta e risco, mediante delegação contratual ou legal do Poder Público Concedente. Significa dizer que, “serviço concedido é serviço do Poder Público, apenas executado por particular em razão da concessão”.[5]

Destarte, as concessionárias responsáveis pela distribuição e fornecimento de energia elétrica, por força do Contrato de Concessão, receberam da União à atribuição de explorar esse serviço de utilidade pública, para tanto, no exercício de suas funções, as concessionárias dispõe, mediante a
transferência de competência[6], de parcela dos poderes públicos, consubstanciada na prática de atos administrativos.

Insta salientar a lição sempre precisa de Celso Antônio Bandeira de Mello que leciona que só “existe função quando alguém está investido no dever de satisfazer dadas finalidades em prol do interesse de outrem, necessitando, para tanto, manejar os poderes requeridos para supri-las. Logo, tais poderes são instrumentais ao alcance das sobreditas finalidades. Sem eles, o sujeito investido na função não teria como desincumbir-se do dever posto a seu cargo. Donde, quem os titulariza maneja, na verdade, deveres-poderes, no interesse alheio”.

Desta forma, as concessionárias, objetivando exercer plenamente as suas funções, praticam atos administrativos. Esta assertiva se reforça quando constatasse que esses atos são passíveis de impugnação por meio do mandado de segurança, porquanto revestidos dos atributos de atos administrativos.

Nesse sentido, pedimos vênia para trazer à lembrança, que o Colendo Supremo Tribunal Federal editou a súmula nº 510, nos seguintes termos:

Praticado o ato por autoridade, no exercício de competência delegada, contra ele cabe o mandado de segurança ou a medida judicial”.

Ainda a propósito, todas as divergências jurisprudenciais que reinavam sobre a equiparação dos atos praticados pelas concessionárias quando do exercício de competência delegada aos atos administrativos, encontram-se hoje superadas, vez que o Colendo Superior Tribunal de Justiça admite que esses atos são passíveis de impugnação por mandado de segurança, conforme se verifica na decisão proferida no REsp n° 84.082.

Assim, com o objetivo de clarear ainda mais a questão, cumpre, neste instante, trazer à colação, mais uma vez, a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello[7] que conceitua o ato administrativo como sendo:

“(...) declaração do Estado (ou de quem lhe faça às vezes – como, por exemplo, um concessionário de serviço público), no exercício de
prerrogativas públicas, manifestada mediante providências jurídicas complementares da lei a título de lhe dar cumprimento, e sujeitas a controle de
legitimidade por órgão jurisdicional
”.

Logo, resta nítido que o ato administrativo é toda manifestação de vontade do Estado ou de quem lhe faça às vezes, no exercício de prerrogativas públicas.

Ademais, oportuno se torna dizer que todo ato administrativo é dotado de atributos, que lhe são peculiares, tais como, a presunção de legitimidade, porque se presume legal a atividade administrativa, por conta da inteira submissão ao princípio da legalidade; auto-executoriedade, uma vez que será executado, quando necessário e possível, ainda que sem o consentimento do seu destinatário; imperatividade, ante a inevitabilidade de sua execução, porquanto reúne sempre poder de coercibilidade para aqueles a que se destina.

Nesta esteira, os atos administrativos, qualquer que seja sua categoria ou espécie, nascem com a presunção de legitimidade, independentemente de norma legal que a estabeleça. Vale ressaltar, que essa presunção decorre do princípio da legalidade da Administração, que, nos Estados de Direito, informa toda a atuação governamental. Além disso, a presunção de legitimidade dos atos administrativos responde a exigências de celeridade e segurança das atividades do Poder Público, que não poderiam ficar na dependência da solução de impugnação dos administrados, quanto à legitimidade de seus atos, para só após dar-lhes execução.

A presunção de legitimidade dos atos administrativos, portanto, não significa um valor absoluto, tanto que se qualifica como presunção juris tantum, ou seja, relativa, admitindo prova em contrário. Todavia, qualquer irregularidade ou invocação de nulidade deve ser necessariamente alegada e provada em juízo.

Na lição de Celso Ribeiro Bastos[8], a presunção de legitimidade:

é a qualidade de se presumirem válidos os atos administrativos até prova em contrário, é dizer, enquanto não seja declarada a sua nulidade por autoridade competente. Há, pois, uma presunção juris tantum de que o ato foi editado conforme o direito, ou seja, com observância das normas que regulam a sua produção. É que o Estado tem a seu favor a presunção legal de que sua atividade é legítima”.

Diante disto, outra conseqüência da presunção de legitimidade é a transferência do ônus da prova de invalidade do ato administrativo para quem a invoca. Cuida-se de argüição de nulidade do ato, por vicio formal ou ideológico, incumbindo a prova do defeito apontado ao impugnante, do
que resulta que, até sua anulação o ato terá plena eficácia.

Isso porque, conforme ensina Celso Antonio Bandeira de Mello[9], a “presunção de legitimidade – é a qualidade, que reveste tais atos, de se presumirem verdadeiros e conformes ao Direito, até prova em contrário. Isto é: milita em favor deles uma presunção juris tantum de legitimidade”.

TERMO DE OCORRÊNCIA DE IRREGULARIDADE

Dentre os muitos fatos que lhe são peculiares, as regras do direito juridicizam os fatos sociais, também chamados de eventos, fazendo irromper relações jurídicas, no seio das quais aparecem os direitos subjetivos e os deveres correlatos.

Nesse sentido, o Termo de Ocorrência de Irregularidade – TOI é um instrumento legal, previsto no artigo 72, da Resolução nº 456/2000 da ANEEL, que tem por finalidade formalizar a constatação de qualquer irregularidade encontrada nas unidades de consumo dos usuários de energia elétrica, que proporcione faturamento inferior ao real. Para tanto, este ato administrativo pormenoriza todos os dados do titular e da unidade consumidora irregular, bem como a irregularidade constatada.

Art. 72. Constatada a ocorrência de qualquer procedimento irregular cuja responsabilidade não lhe seja atribuível e que tenha provocado faturamento inferior ao correto, ou no caso de não ter havido qualquer faturamento, a concessionária adotará as seguintes providências:
I - emitir o "Termo de Ocorrência de Irregularidade", em formulário próprio, contemplando as informações necessárias ao registro da irregularidade, tais como:
(...)
IV - proceder a revisão do faturamento com base nas diferenças entre os valores efetivamente faturados e os apurados por meio de um dos critérios descritos nas alíneas abaixo, sem prejuízo do disposto nos arts. 73, 74 e 90:
a) aplicação do fator de correção determinado a partir da avaliação técnica do erro de medição causado pelo emprego dos procedimentos irregulares apurados;
b) na impossibilidade do emprego do critério anterior, identificação do maior valor de consumo de energia elétrica e/ou demanda de potência ativas e reativas excedentes, ocorridos em até 12 (doze) ciclos completos de medição normal imediatamente anteriores ao início da irregularidade; e
c) no caso de inviabilidade de utilização de ambos os critérios, determinação dos consumos de energia elétrica e/ou das demandas de potência ativas e reativas excedentes por meio de estimativa, com base na carga instalada no momento da constatação da irregularidade, aplicando fatores de carga e de demanda obtidos a partir de outras unidades consumidoras com atividades similares.

Desta forma, o Termo de Ocorrência de Irregularidade, se apresenta como um veículo introdutor de uma norma individual e concreta que tem, no suposto, a descrição de um delito e, no conseqüente, a instituição de um liame jurídico sancionatório, cujo conteúdo da obrigação é um valor pecuniário, representado por uma multa administrativa[10], apurada por meio de um dos parâmetros pré-estabelecidos pelo artigo 72, da Resolução nº 456/2000 da ANEEL, podendo ser acrescido de um custo administrativo, artigo 73, sem prejuízo da suspensão do fornecimento de energia elétrica para o usuário irregular, artigo 90, da mesma Resolução.

Destarte, como decorrência da irregularidade prevista hipoteticamente no artigo 72, da Resolução nº 456/2000 da ANEEL (norma geral e abstrata), instala-se o fato (norma individual e concreta), constituído pela linguagem competente (Termo de Ocorrência de Irregularidade), irradiando-se o efeito jurídico próprio, qual seja o vínculo abstrato, mediante o qual a concessionária, na qualidade de sujeito ativo, ficará investida do direito subjetivo de exigir do usuário, chamado de sujeito passivo, o cumprimento de determinada obrigação (sanção), especificada nos artigo 72 e seguintes da referida Resolução, ao passo que o usuário ficará na contingência de cumpri-la.

Com supedâneo em tais considerações, podemos dizer que o Termo de Ocorrência de Irregularidade – TOI – é o ato administrativo que consubstancia a aplicação de uma providência sancionatória a quem, tendo violado preceito de conduta obrigatória, realizou evento inscrito na lei como ilícito administrativo.

Trata-se, deste modo, de ato administrativo punitivo, que, segundo Hely Lopes Meirelles[11], “são os que contêm uma sanção imposta pela Administração àqueles que infringem disposições legais, regulamentares ou ordinatórias dos bens ou serviços públicos”. Visando punir e reprimir as infrações administrativas ou a conduta irregular dos administrados ou usuários perante a administração pública ou quem lhe faça às vezes.

Vê-se, então, que a matéria semântica do antecedente das regras sancionatórias alude a um evento caracterizado, sempre, pelo desatendimento de um dever. É o modelo iterativo dos antessupostos de normas sancionatórias. Daí mencionar-se o fato assim composto como delito, infração, ilícito.

CONCLUSÃO

À luz destas seguras lições é que se deve entender que as concessionárias de energia elétrica, para poderem praticar suas funções, executam atos administrativos. Assim, no caso de ser constatada a ocorrência de qualquer irregularidade no equipamento de medição, que importe na diminuição do faturamento do consumo de energia elétrica, as concessionárias estão obrigadas a lavrar o Termo de Ocorrência de Irregularidade, nos exatos termos do estabelecido pelo artigo 72, da Resolução n° 456/2000 da ANEEL, eis que, referido ato administrativo deve ser praticado sem margem alguma de liberdade para as concessionárias, pois a lei previamente tipificou o único e possível comportamento a ser seguido diante da irregularidade constatada.
Por fim, cumpre observar que o ato vinculado, consistente no Termo de Ocorrência de Irregularidade, por ser um ato administrativo, goza dos atributos da presunção de legitimidade, sendo considerado válido, vigente e pronto para produzir os efeitos a que se destina, eis que presumivelmente praticado em conformidade com a lei, como também, auto-executoriedade, que é a qualidade do ato administrativo que dá ensejo às concessionárias de, direta e imediatamente, executá-los, e, imperatividade, tendo em vista o poder de coercibilidade, sendo executado independentemente do consentimento do usuário.

Notas

[1] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, Ed. Revista dos Tribunais, 10ª ed., p. 317.
[2] SCHIESARI, Nelson. Direito Administrativo. Ed. Coletânea Atualização Jurídica, 2ª edição, p. 179.
[3] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, Ed. Revista dos Tribunais, 10ª ed., p. 319.
[4] MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 13ª edição. Ed. Malheiros, p. 622.
[5] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, Ed. Revista dos Tribunais, 10ª ed., p. 363.
[6] Competência, na lição de Oswaldo Aranha Bandeira de Mello, é a “quantidade de poder” que, constitucional ou legalmente, é conferida a alguém.
[7] MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 13ª edição. Ed. Malheiros, p. 344.
[8] BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Administrativo. Ed. Saraiva. p. 118.
[9] MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 13ª edição. Ed. Malheiros, p. 373.
[10] Hely Lopes Meirelles sustenta que “multa administrativa é toda imposição pecuniária a que se sujeita o administrado a título de compensação do dano presumido da infração”.
[11] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, Ed. Revista dos Tribunais, 10ª ed., p. 190.