terça-feira, 14 de junho de 2011

Declarada atribuição do MP/PE para investigar suposta irregularidade em fundo municipal de saúde

A ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia Antunes Rocha declarou a atribuição do Ministério Público do Estado de Pernambuco (MP/PE) para apurar responsabilidade por suposta irregularidade na aplicação de recursos do Fundo Municipal de Saúde do Recife.

A decisão foi tomada na Ação Cível Originária (ACO) 1790, resolvendo um conflito negativo de atribuição suscitado pelo Ministério Público Federal (MPF) ante o MP/PE.

O caso originou-se em decisão do Tribunal de Contas de Pernambuco (TC/PE), que julgou irregular a dispensa de licitação e contratação da Fundação de Apoio ao Desenvolvimento da Universidade Federal de Pernambuco (FADE/UFPE) para a prestação de serviços de apoio técnico para suporte ao Processo de Descentralização do Sistema de Informação dos Distritos Sanitários, com vistas à manutenção das atividades de acompanhamento e monitoramento do Programa Bolsa Família.

Diante da glosa do TCU, o ex-secretário municipal de Saúde responsável pela contratação sem licitação foi multado, sendo ainda encaminhada representação ao MP/PE.

Entretanto, a 15ª Promotoria de Justiça de Defesa da Cidadania do Recife determinou a remessa dos autos ao Ministério Público Federal (MPF), por entender que a questão “envolveria recursos do Programa Federal Bolsa Alimentação”, o que evidenciaria o interesse jurídico da União e a competência da Justiça Federal para examinar eventual ação civil pública.

A Procuradoria da República em Pernambuco, no entanto, declinou de sua atribuição. Segundo ela, inexiste interesse direto da União, pois não se teriam “notícias de que recursos do Programa Bolsa Alimentação (ou do Bolsa Família) teriam sido desviados, malbaratados, embolsados”.

Ademais, segundo a Procuradoria da República em Pernambuco, “o próprio contrato dá conta de que os recursos destinados à consecução do objeto nele delineado foram provenientes do Fundo Municipal de Saúde”.

Diante disso, o procurador-geral da República requereu a instauração de conflito negativo de atribuições e pediu que fosse reconhecida a atribuição do MP/PE para atuar no caso.

O referido conflito foi protocolado no STF em maio deste ano (2011), sendo autuado como Ação Cível Originária.

Decisão

Ao decidir, a ministra Cármen Lúcia observou que, embora a descentralização do sistema de tecnologia da informação da Secretaria Municipal de Saúde do Recife favoreça o acompanhamento e monitoramento do Programa Bolsa Família pelo ente municipal, “não se constata, na espécie, interesse direto da União”.

Segundo ela, com a dita descentralização, o município do Recife “revela apenas seu empenho no cumprimento dos compromissos assumidos na carta de adesão ao Programa Bolsa Alimentação (incorporado ao Programa Bolsa Família em 2004)", mas os documentos juntados aos autos comprovam que os custos decorrentes dessa descentralização foram suportados exclusivamente pelo município, com recursos do seu fundo de saúde.

Assim, “eventual irregularidade na aplicação dos recursos públicos municipais, decorrente da dispensa indevida de licitação, somente pode lesar o patrimônio do Município do Recife”. E isso, conforme a ministra, “evidencia ser do MP/PE a atribuição de apurar responsabilidade e propor as medidas judiciais cabíveis contra gestores municipais faltosos”.

Ao decidir que o caso não está compreendido entre as funções institucionais atribuídas ao MPF, a ministra apoiou-se em jurisprudência firmada pela Suprema Corte, entre outros, no julgamento da ACO 1445, relatada pelo ministro Marco Aurélio.

Naquele caso, o Plenário do STF decidiu que “a definição do conflito de atribuições ocorre considerado o objeto do procedimento administrativo criminal. Não envolvendo bem, serviço ou interesse da União, entidade autárquica ou empresa pública federal, cumpre ao Ministério Público do estado atuar”.

Ainda segundo a ministra Cármen Lúcia, o fato de a licitação impugnada envolver a Universidade Federal de Pernambuco não é suficiente para atrair a competência da Justiça Federal e, por conseguinte, demandar a atuação do Ministério Público Federal. Isto porque a FADE-UFPE é entidade de direito privado com foro em Recife e, ademais, tem autonomia financeira e administrativa.

Portanto, observou a ministra, sendo a FADE desvinculada da estrutura administrativa da UFPE, “não se pode reconhecer, de plano, a existência de risco ao patrimônio nacional ou presumir o interesse direto da União no deslinde da controvérsia”.

Desse modo, as medidas a serem adotadas contra ex-gestores públicos de Recife/PE ou, eventualmente, funcionários da FADE em razão dos fatos apurados pelo TC-PE, “devem ser coordenadas e promovidas pelo MP daquele estado, na linha da manifestação do procurador-geral da República (pela competência do MP/PE) e da assentada jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal”, concluiu a ministra Cármen Lúcia.

FK/AD

Processos relacionados
ACO 1790

TSE já recebeu 106 processos por doações irregulares nas Eleições 2010

Até o fim da noite dessa terça-feira (7), o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) recebeu do Ministério Público Eleitoral (MPE) 106 representações contra pessoas físicas e pessoas jurídicas que supostamente fizeram doações irregulares durante a campanha presidencial das eleições de 2010. Esses processos se referem às doações feitas para os candidatos à Presidência da República.
Já os Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) em todo o Brasil registraram, até então, o recebimento de cerca de 2000 ações sobre doação irregular em relação às campanhas políticas dos candidatos aos demais cargos.
Receita Federal
As ações propostas pelo MPE são resultado do levantamento realizado pela Receita Federal, que apontou a relação de possíveis doadores irregulares durante as eleições de 2010. Os dados foram obtidos a partir de cruzamento entre as prestações de contas dos candidatos e comitês financeiros e a base de dados da Receita Federal relativa a 2009. Os limites de doação estão previstos na Lei nº 9.504/1997 (Lei das Eleições), que define o teto de 10% dos rendimentos brutos do ano anterior à eleição no caso de pessoa física, e de 2% do faturamento bruto do ano anterior à eleição para pessoa jurídica. Aqueles que tiverem feito doações fora desses limites poderão sofrer as consequências previstas na legislação eleitoral.
Presidente do TSE
O levantamento da Receita Federal foi repassado ao MPE pelo presidente do TSE, ministro Ricardo Lewandowski, no final do mês de abril (27/04). A partir dessas informações, o Ministério Público pôde, então, formalizar os processos contra os doadores que, supostamente, não respeitaram o limite estabelecido por lei.
Prazo
De acordo com decisão tomada pelo Plenário do TSE em maio do ano passado, o MPE deve propor as ações contra doação irregular dentro de um prazo de 180 dias a contar da data da diplomação dos eleitos. Esse prazo corresponde ao período estipulado pela Justiça Eleitoral para que os candidatos e partidos políticos conservem a documentação referente às contas eleitorais.
Portanto, a Justiça Eleitoral receberá ações por doação irregular referente à campanha de 2010 até o próximo dia 17 de junho.

Acumulação de cargos no serviço público depende de compatibilidade de horários

Fonte: Tribunal Regional Federal da 2ª Região

A acumulação de cargos no serviço público depende da comprovação de compatibilidade de horários. O entendimento consta da decisão da 6ª Turma Especializada do TRF2, que impede a União de exigir de uma auxiliar de enfermagem, ocupante de dois cargos públicos - um federal e o outro no Município do Rio de Janeiro -, que opte por um dos cargos ou reduza a sua carga horária. A decisão reformou a sentença da 26ª Vara Federal do Rio, que havia sido favorável à União. A relatora do caso no Tribunal é a juíza federal convocada Maria Alice Paim Lyard.
A profissional ajuizou um processo na Justiça Federal para poder continuar a trabalhar como auxiliar de enfermagem no Instituto Nacional de Câncer (Inca), vinculado ao Ministério da Saúde, e no Centro Municipal de Saúde Waldir Franco, vinculado à Secretaria Municipal de Saúde. De acordo com os autos, a auxiliar de enfermagem acumula dois cargos públicos há mais de 22 anos, cumprindo carga horária no Inca, desde fevereiro de 1987, de 40 horas semanais, e no Centro Municipal de Saúde Waldir Franco, desde julho de 1987, de 32,5 horas semanais.
A relatora iniciou seu voto, explicando que a servidora já acumulava dois cargos públicos privativos de profissionais da área de saúde, antes da vigência da Constituição Federal de 1988, "encontrando-se, portanto, amparada pelo comando do artigo 17, parágrafo 2º, dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), que estabelece que é assegurado o exercício cumulativo de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde que estejam sendo exercidos na administração pública direta ou indireta”, ressaltou.
A magistrada também lembrou que o artigo 37 da Constituição permite aos profissionais de saúde a cumulação de dois cargos ou empregos quando há compatibilidade de horários. Maria Alica Paim Lyard ressaltou que documentos anexados aos autos comprovam que, "apesar da carga horária elevada, de 72,5 horas semanais, a compatibilidade de horários é observada, não havendo qualquer ofensa ao ordenamento jurídico pátrio".

Lei que regula taxas de serviços notariais e de registro é inconstitucional

Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo

O Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo declarou a inconstitucionalidade da Lei Estadual nº 13.160/08, que altera a Lei nº 11.331/02, que dispõe sobre emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro. O julgamento aconteceu no último dia 25.
De acordo com o voto do relator, desembargador José Roberto Bedran, o protesto de títulos envolve matéria de Direito Civil e Comercial, competência legislativa exclusiva da União. “Padece, inexoravelmente, da inconstitucionalidade declarada no v. acórdão suscitante, porquanto invade esfera de competência legislativa privativa da União. Ao enumerar títulos e documentos protestáveis e disciplinar a forma e o modo de protestá-los, dentre os quais o contrato de locação e o recibo de aluguel, a lei estadual, pelas normas impugnadas, versando matéria de Direito Civil e Comercial, viola os princípios federativo e da reserva legal”, relatou o desembargador.
A declaração de inconstitucionalidade não afasta, segundo Bedran, a competência da Corregedoria Geral da Justiça para normatizar a atividade dos cartórios. “Ressalte-se que a declaração de inconstitucionalidade da lei estadual não afasta a conveniência de a Corregedoria Geral da Justiça editar normas que orientem os cartórios delegados, já que ela exerce sobre eles poderes de fiscalização e orientação”, concluiu.
Com base nesses fundamentos, julgou procedente a arguição e declarou a inconstitucionalidade da Lei Estadual nº 13.160/08.
A decisão, por maioria de votos, teve a participação dos desembargadores José Roberto Bedran (presidente), Sousa Lima, Celso Limongi, Reis Kuntz, Barreto Fonseca, Corrêa Vianna, Maurício Vidigal, David Haddad, Walter de Almeida Guilherme, Xavier de Aquino, Antônio Carlos Malheiros, Armando Toledo, Mário Devienne Ferraz, José Santana, Jose Reynaldo, Artur Marques, Guilherme Strenger, Boris Kauffmann, Renato Nalini, Campos Mello, Elliot Akel e Samuel Júnior, com votos vencedores; Cauduro Padin e Roberto Mac Cracken, com votos vencidos.

domingo, 12 de junho de 2011

DOCUMENTOS APÓCRIFOS – PRUDÊNCIA E DISCRIÇÃO

EMENTA: PERSECUÇÃO PENAL E DELAÇÃO ANÔNIMA. DOUTRINA. PRECEDENTES. PRETENDIDA EXTINÇÃO DO PROCEDIMENTO PENAL. DESCARACTERIZAÇÃO, NA ESPÉCIE, DA PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. MEDIDA CAUTELAR INDEFERIDA.
- As autoridades públicas não podem iniciar qualquer medida de persecução (penal ou disciplinar), apoiando-se, unicamente, para tal fim, em peças apócrifas ou em escritos anônimos. É por essa razão que o escrito anônimo não autoriza, desde que isoladamente considerado, a imediata instauração de “persecutio criminis”.
- Peças apócrifas não podem ser formalmente incorporadas a procedimentos instaurados pelo Estado, salvo quando forem produzidas pelo acusado ou, ainda, quando constituírem, elas próprias, o corpo de delito (como sucede com bilhetes de resgate no crime de extorsão mediante seqüestro, ou como ocorre com cartas que evidenciem a prática de crimes contra a honra, ou que corporifiquem o delito de ameaça ou que materializem o “crimen falsi”, p.ex.).
- Nada impede, contudo, que o Poder Público, provocado por delação anônima (“disque-denúncia”, p. ex.), adote medidas informais destinadas a apurar, previamente, em averiguação sumária, “com prudência e discrição”, a possível ocorrência de eventual situação de ilicitude penal, desde que o faça com o objetivo de conferir a verossimilhança dos fatos nela denunciados, em ordem a promover, então, em caso positivo, a formal instauração da “persecutio criminis”, mantendo-se, assim, completa desvinculação desse procedimento estatal em relação às peças apócrifas.
- Diligências prévias que, promovidas pelo Departamento de Polícia Federal, revelariam a preocupação da Polícia Judiciária em observar, com cautela e discrição, as diretrizes jurisprudenciais estabelecidas, em tema de delação anônima, pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça.
DECISÃO: Trata-se de “habeas corpus”, com pedido de medida liminar, impetrado contra decisão, que, emanada do E. Superior Tribunal de Justiça, restou consubstanciada em acórdão assim ementado:
“‘HABEAS CORPUS’. LAVAGEM DE DINHEIRO. FORMAÇÃO DE QUADRILHA OU BANDO. MONITORAMENTO TELEFÔNICO. DENÚNCIA ANÔNIMA. NECESSIDADE DA MEDIDA DEMONSTRADA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. COAÇÃO ILEGAL NÃO COMPROVADA. ORDEM DENEGADA.
1) O monitoramento telefônico foi autorizado, porque necessária a medida para dar prosseguimento às investigações.
2) Após o recebimento da denúncia anônima, foi observado que as agências não apresentavam movimento normal, de modo que não se pode alegar que o monitoramento telefônico foi autorizado com base somente na denúncia anônima.
3) O trancamento de ação penal, em tema de ‘habeas corpus’, é possível somente se o fato for atípico, se estiver extinta a punibilidade ou se não houver indícios de autoria.
4) Coação ilegal não comprovada.
5) Ordem denegada.”
(HC 128.776/SP, Rel. Min. CELSO LIMONGI - grifei)
A parte impetrante, alegando omissão em referido julgamento, opôs, perante aquela Alta Corte judiciária, embargos de declaração, que restaram rejeitados, em decisão que está assim ementada:
“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM ‘HABEAS CORPUS’. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO CONSISTENTE EM NÃO APONTAR O RELATOR QUAL SERIA A SOLUÇÃO ALTERNATIVA, O PLANO B CITADO NO INÍCIO DOS ARGUMENTOS DO RELATOR. OMISSÃO NÃO CARACTERIZADA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS.
1. São cabíveis embargos de declaração contra acórdãos proferidos pelos Tribunais de Apelação, câmaras ou turmas, no prazo de dois dias, quando houver na sentença ambiguidade, obscuridade, contradição ou omissão, nos termos do artigo 619 do Código de Processo Penal.
2. No caso em exame, em que pesem as considerações efetuadas na sessão de julgamento, o v. acórdão embargado não é omisso, porque declinou as razões pelas quais a ordem foi denegada: necessidade do monitoramento telefônico para o prosseguimento das investigações e ausência das hipóteses de trancamento da ação penal.
3. Omissão não caracterizada.
4. Embargos de declaração rejeitados.”
(HC 128.776-EDcl/SP, Rel. Min. CELSO LIMONGI - grifei)
Busca-se, na presente sede processual, a extinção definitiva do procedimento penal ora questionado, sob alegação de que inexistiria justa causa autorizadora da adoção, contra os ora pacientes, de medidas de persecução penal, eis que – segundo sustentam os ilustres impetrantes – a investigação criminal ter-se-ia originado, unicamente, no caso, de delação anônima.
Em conseqüência desse pleito, pretende-se a concessão de medida liminar para suspender, cautelarmente, até final julgamento da presente ação de “habeas corpus”, o curso do Processo-crime n. 2008.61.81.003867-5, em trâmite perante a 2ª Vara Criminal Federal de São Paulo/SP.
Passo a apreciar o pedido de medida liminar. E, ao fazê-lo, entendo, em juízo de estrita delibação, que se revela insuscetível de acolhimento a postulação cautelar ora deduzida no presente “writ” constitucional.
Não se desconhece que a delação anônima, enquanto fonte única de informação, não constitui fator que se mostre suficiente para legitimar, de modo autônomo, sem o concurso de outros meios de revelação dos fatos, a instauração de procedimentos estatais.
É por essa razão que o Supremo Tribunal Federal, ao aprovar a Resolução STF nº 290/2004 – que instituiu, nesta Corte, o serviço de Ouvidoria – expressamente vedou a possibilidade de formulação de reclamações, críticas ou denúncias de caráter anônimo (art. 4º, II), sob pena de liminar rejeição.
Mais do que isso, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o MS 24.405/DF, do Rel. Min. CARLOS VELLOSO, declarou, “incidenter tantum”, a inconstitucionalidade da expressão “manter ou não o sigilo quanto ao objeto e à autoria da denúncia” constante do § 1º do art. 55 da Lei Orgânica do Tribunal de Contas da União (Lei nº 8.443/92).
É certo, no entanto, tal como tive o ensejo de decidir nesta Suprema Corte (HC 100.042-MC/RO, Rel. Min. CELSO DE MELLO), que essa diretriz jurisprudencial – para não comprometer a apuração de comportamentos ilícitos e, ao mesmo tempo, para resguardar a exigência constitucional de publicidade - há de ser interpretada em termos que, segundo entendo, assim podem ser resumidos:
(a) o escrito anônimo não justifica, por si só, desde que isoladamente considerado, a imediata instauração da “persecutio criminis”, eis que peças apócrifas não podem ser incorporadas, formalmente, ao processo, salvo quando tais documentos forem produzidos pelo acusado, ou, ainda, quando constituírem, eles próprios, o corpo de delito (como sucede com bilhetes de resgate no delito de extorsão mediante seqüestro, ou como ocorre com cartas que evidenciem a prática de crimes contra a honra, ou que corporifiquem o delito de ameaça ou que materializem o “crimen falsi”, p. ex.);
(b) nada impede, contudo, que o Poder Público, provocado por delação anônima (“disque-denúncia”, p. ex.), adote medidas informais destinadas a apurar, previamente, em averiguação sumária, “com prudência e discrição”, a possível ocorrência de eventual situação de ilicitude penal, desde que o faça com o objetivo de conferir a verossimilhança dos fatos nela denunciados, em ordem a promover, então, em caso positivo, a formal instauração da “persecutio criminis”, mantendo-se, assim, completa desvinculação desse procedimento estatal em relação às peças apócrifas; e
(c) o Ministério Público, de outro lado, independentemente da prévia instauração de inquérito policial, também pode formar a sua “opinio delicti” com apoio em outros elementos de convicção que evidenciem a materialidade do fato delituoso e a existência de indícios suficientes de autoria, desde que os dados informativos que dão suporte à acusação penal não derivem de documentos ou de escritos anônimos nem os tenham como único fundamento causal.
Cumpre referir, no ponto, por extremamente oportuno, o valioso magistério expendido por GIOVANNI LEONE (“Il Codice di Procedura Penale Illustrato Articolo per Articolo”, sob a coordenação de UGO CONTI, vol. I/562-564, itens ns. 154/155, 1937, Società Editrice Libraria, Milano), cujo entendimento, no tema, após reconhecer o desvalor e a ineficácia probante dos escritos anônimos, desde que isoladamente considerados, admite, no entanto, quanto a eles, a possibilidade de a autoridade pública, a partir de tais documentos e mediante atos investigatórios destinados a conferir a verossimilhança de seu conteúdo, promover, então, em caso positivo, a formal instauração da pertinente “persecutio criminis”, mantendo-se, desse modo, completa desvinculação desse procedimento estatal em relação às peças apócrifas que forem encaminhadas aos agentes do Estado, salvo se os escritos anônimos constituírem o próprio corpo de delito ou provierem do acusado.
Impende rememorar, no sentido que venho de expor, a precisa lição de JOSÉ FREDERICO MARQUES (“Elementos de Direito Processual Penal”, vol. I/147, item n. 71, 2ª ed., atualizada por Eduardo Reale Ferrari, 2000, Millennium):
“No direito pátrio, a lei penal considera crime a denunciação caluniosa ou a comunicação falsa de crime (Código Penal, arts. 339 e 340), o que implica a exclusão do anonimato na ‘notitia criminis’, uma vez que é corolário dos preceitos legais citados a perfeita individualização de quem faz a comunicação de crime, a fim de que possa ser punido, no caso de atuar abusiva e ilicitamente.
Parece-nos, porém, que nada impede a prática de atos iniciais de investigação da autoridade policial, quando delação anônima lhe chega às mãos, uma vez que a comunicação apresente informes de certa gravidade e contenha dados capazes de possibilitar diligências específicas para a descoberta de alguma infração ou seu autor. Se, no dizer de G. Leone, não se deve incluir o escrito anônimo entre os atos processuais, não servindo ele de base à ação penal, e tampouco como fonte de conhecimento do juiz, nada impede que, em determinadas hipóteses, a autoridade policial, com prudência e discrição, dele se sirva para pesquisas prévias. Cumpre-lhe, porém, assumir a responsabilidade da abertura das investigações, como se o escrito anônimo não existisse, tudo se passando como se tivesse havido ‘notitia criminis’ inqualificada.” (grifei)
Essa diretriz doutrinária – perfilhada por JORGE ULISSES JACOBY FERNANDES (“Tomada de Contas Especial”, p. 51, item n. 4.1.1.1.2, 2ª ed., 1998, Brasília Jurídica) – é também admitida, em sede de persecução penal, por FERNANDO CAPEZ (“Curso de Processo Penal”, p. 77, item n. 10.13, 7ª ed., 2001, Saraiva):
“A delação anônima (‘notitia criminis inqualificada’) não deve ser repelida de plano, sendo incorreto considerá-la sempre inválida; contudo, requer cautela redobrada, por parte da autoridade policial, a qual deverá, antes de tudo, investigar a verossimilhança das informações.” (grifei)
Idêntica percepção sobre a matéria em exame é revelada por JULIO FABBRINI MIRABETE (“Código de Processo Penal Interpretado”, p.95, item n. 5.4, 7ª ed., 2000, Atlas), que assim se pronuncia:
“(...) Não obstante o art. 5º, IV, da CF, que proíbe o anonimato na manifestação do pensamento, e de opiniões diversas, nada impede a notícia anônima do crime (‘notitia criminis’ inqualificada), mas, nessa hipótese, constitui dever funcional da autoridade pública destinatária, prliminarmente, proceder com a máxima cautela e discrição a investigações preliminares no sentido de apurar a verossimilhança das informações recebidas. Somente com a certeza da existência de indícios da ocorrência do ilícito é que deve instaurar o procedimento regular.” (grifei)
Esse entendimento é também acolhido por NELSON HUNGRIA (“Comentários ao Código Penal”, vol. IX/466, item n. 178, 1958, Forense), cuja análise do tema - realizada sob a égide da Constituição republicana de 1946, que expressamente não permitia o anonimato (art. 141, § 5º), à semelhança do que se registra, presentemente, com a vigente Lei Fundamental (art. 5º, IV, “in fine”) - enfatiza a imprescindibilidade da investigação, ainda que motivada por delação anônima, desde que fundada em fatos verossímeis:
“Segundo o § 1.º do art. 339, ‘A pena é aumentada de sexta parte, se o agente se serve de anonimato ou de nome suposto’. Explica-se: o indivíduo que se resguarda sob o anonimato ou nome suposto é mais perverso do que aquêle que age sem dissimulação. Êle sabe que a autoridade pública não pode deixar de investigar qualquer possível pista (salvo quando evidentemente inverossímil), ainda quando indicada por uma carta anônima ou assinada com pseudônimo; e, por isso mesmo, trata de esconder-se na sombra para dar o bote viperino. Assim, quando descoberto, deve estar sujeito a um plus de pena.” (grifei)
Essa mesma posição – que entende recomendável, nos casos de delação anônima, que a autoridade pública proceda, de maneira discreta, a uma averiguação preliminar em torno da verossimilhança da comunicação (“delatio”) que lhe foi dirigida - é igualmente compartilhada, dentre outros, por GUILHERME DE SOUZA NUCCI (“Código de Processo Penal Comentado”, p. 87/88, item n. 29, 2008, RT), DAMÁSIO E. DE JESUS (“Código de Processo Penal Anotado”, p. 9, 23ª ed., 2009, Saraiva), GIOVANNI LEONE, (“Trattato di Diritto Processuale Penale”, vol. II/12-13, item n. 1, 1961, Casa Editrice Dott. Eugenio Jovene, Napoli), FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO (“Código de Processo Penal Comentado”, vol. 1/34-35, 4ª ed., 1999, Saraiva), RODRIGO IENNACO (“Da validade do procedimento de persecução criminal deflagrado por denúncia anônima no Estado Democrático de Direito”, “in” Revista Brasileira de Ciências Criminais, vol. 62/220-263, 2006, RT), ROMEU DE ALMEIDA SALLES JUNIOR (“Inquérito Policial e Ação Penal”, item n. 17, p. 19/20, 7ª ed., 1998, Saraiva) e CARLOS FREDERICO COELHO NOGUEIRA (“Comentários ao Código de Processo Penal”, vol. 1/210, item n. 70, 2002, EDIPRO), cumprindo rememorar, ainda, por valiosa, a lição de ROGÉRIO LAURIA TUCCI (“Persecução Penal, Prisão e Liberdade”, p. 34/35, item n. 6, 1980, Saraiva):
“Não deve haver qualquer dúvida, de resto, sobre que a notícia do crime possa ser transmitida anonimamente à autoridade pública (...).
(...) constitui dever funcional da autoridade pública destinatária da notícia do crime, especialmente a policial, proceder, com máxima cautela e discrição, a uma investigação preambular no sentido de apurar a verossimilhança da informação, instaurando o inquérito somente em caso de verificação positiva. E isto, como se a sua cognição fosse espontânea, ou seja, como quando se trate de ‘notitia criminis’ direta ou inqualificada (...).” (grifei)
Vale acrescentar que esse entendimento também fundamentou julgamento que proferi, em sede monocrática, a propósito da questão pertinente aos escritos anônimos. Ao assim julgar, proferi decisão que restou consubstanciada na seguinte ementa:
“DELAÇÃO ANÔNIMA. COMUNICAÇÃO DE FATOS GRAVES QUE TERIAM SIDO PRATICADOS NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. SITUAÇÕES QUE SE REVESTEM, EM TESE, DE ILICITUDE (PROCEDIMENTOS LICITATÓRIOS SUPOSTAMENTE DIRECIONADOS E ALEGADO PAGAMENTO DE DIÁRIAS EXORBITANTES). A QUESTÃO DA VEDAÇÃO CONSTITUCIONAL DO ANONIMATO (CF, ART. 5º, IV, ‘IN FINE’), EM FACE DA NECESSIDADE ÉTICO-JURÍDICA DE INVESTIGAÇÃO DE CONDUTAS FUNCIONAIS DESVIANTES. OBRIGAÇÃO ESTATAL, QUE, IMPOSTA PELO DEVER DE OBSERVÂNCIA DOS POSTULADOS DA LEGALIDADE, DA IMPESSOALIDADE E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA (CF, ART. 37, ‘CAPUT’), TORNA INDERROGÁVEL O ENCARGO DE APURAR COMPORTAMENTOS EVENTUALMENTE LESIVOS AO INTERESSE PÚBLICO. RAZÕES DE INTERESSE SOCIAL EM POSSÍVEL CONFLITO COM A EXIGÊNCIA DE PROTEÇÃO À INCOLUMIDADE MORAL DAS PESSOAS (CF, ART. 5º, X). O DIREITO PÚBLICO SUBJETIVO DO CIDADÃO AO FIEL DESEMPENHO, PELOS AGENTES ESTATAIS, DO DEVER DE PROBIDADE CONSTITUIRIA UMA LIMITAÇÃO EXTERNA AOS DIREITOS DA PERSONALIDADE? LIBERDADES EM ANTAGONISMO. SITUAÇÃO DE TENSÃO DIALÉTICA ENTRE PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES DA ORDEM CONSTITUCIONAL. COLISÃO DE DIREITOS QUE SE RESOLVE, EM CADA CASO OCORRENTE, MEDIANTE PONDERAÇÃO DOS VALORES E INTERESSES EM CONFLITO. CONSIDERAÇÕES DOUTRINÁRIAS. LIMINAR INDEFERIDA.”
(MS 24.369-MC/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, “in” Informativo/STF nº 286/2002)
Cabe referir, por oportuno, que o E. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar a questão da delação anônima, analisada em face do art. 5º, IV, “in fine”, da Constituição da República, já se pronunciou no sentido de considerá-la juridicamente possível, desde que o Estado, ao agir em função de comunicações revestidas de caráter apócrifo, atue com cautela, em ordem a evitar a consumação de situações que possam ferir, injustamente, direitos de terceiros:
“CRIMINAL. RHC. ‘NOTITIA CRIMINIS’ ANÔNIMA. INQUÉRITO POLICIAL. VALIDADE.
1. A ‘delatio criminis’ anônima não constitui causa da ação penal que surgirá, em sendo o caso, da investigação policial decorrente. Se colhidos elementos suficientes, haverá, então, ensejo para a denúncia. É bem verdade que a Constituição Federal (art. 5º, IV) veda o anonimato na manifestação do pensamento, nada impedindo, entretanto, mas, pelo contrário, sendo dever da autoridade policial proceder à investigação, cercando-se, naturalmente, de cautela.
2. Recurso ordinário improvido.”
(RHC 7.329/GO, Rel. Min. FERNANDO GONÇALVES - grifei)
“CONSTITUCIONAL, PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. (...). PROCESSO ADMINISTRATIVO DESENCADEADO ATRAVÉS DE ‘DENÚNCIA ANÔNIMA’. VALIDADE. INTELIGÊNCIA DA CLÁUSULA FINAL DO INCISO IV DO ART. 5º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL (VEDAÇÃO DO ANONIMATO). (...). RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.”
(RMS 4.435/MT, Rel. Min. ADHEMAR MACIEL - grifei)
“(...) Carta anônima, sequer referida na denúncia e que, quando muito, propiciou investigações por parte do organismo policial, não se pode reputar de ilícita. É certo que, isoladamente, não terá qualquer valor, mas também não se pode tê-la como prejudicial a todas as outras validamente obtidas.”
(RHC 7.363/RJ, Rel. Min. ANSELMO SANTIAGO - grifei)
Vê-se, portanto, não obstante o caráter apócrifo da delação ora questionada, que, tratando-se de revelação de fatos revestidos de aparente ilicitude penal, existe, “a priori”, a possibilidade de o Estado adotar medidas destinadas a esclarecer, em sumária e prévia apuração, a idoneidade das alegações que lhe foram transmitidas, desde que verossímeis, em atendimento ao dever estatal de fazer prevalecer - consideradas razões de interesse público - a observância do postulado jurídico da legalidade, que impõe, à autoridade pública, a obrigação de apurar a verdade real em torno da materialidade e autoria de eventos supostamente delituosos.
O caso dos autos parece evidenciar que a diretriz jurisprudencial consolidada no âmbito desta Corte teria sido observada na espécie ora em exame.
O E. Superior Tribunal de Justiça, ao denegar a ordem de “habeas corpus”, enfatizou, a partir dos elementos que lhe foram propiciados, que o monitoramento telefônico não teria sido autorizado “com base somente na denúncia anônima”, mas, ao contrário, teria sido também motivado por dados informativos resultantes de prévia apuração realizada por autoridade policial, “que cuidou (...) de proceder a investigações preliminares, a fim de verificar a verossimilhança dos fatos narrados na denúncia anônima”, consoante assinalado nos votos dos eminentes Ministros CELSO LIMONGI, Relator, e OG FERNANDES.
Tudo parece indicar, considerados os fundamentos que dão suporte ao acórdão ora impugnado, que o Departamento de Polícia Federal apenas teria postulado autorização judicial para a questionada interceptação telefônica depois de haver diligenciado a adoção de medidas destinadas a conferir a verossimilhança dos dados que lhe foram transmitidos mediante comunicação anônima.
A efetivação de averiguações prévias que o Departamento de Polícia Federal promoveu em decorrência da denúncia anônima parece resultar do próprio teor da “Representação” na qual as autoridades policiais federais, mencionando diligências por elas executadas em momento que precedeu ao pedido de interceptação telefônica, referiram-se, dentre as providências adotadas, a “levantamento preliminar” ou a “consulta ao site específico do Banco Central” (para constatar a existência, ou não, em favor da agência de propriedade de um dos pacientes, de autorização para efetuar operações de câmbio) ou a “pesquisas junto à Receita Federal” ou, ainda, a outras “investigações realizadas”, tudo em ordem a verificar, como exigido pelo magistério jurisprudencial desta Suprema Corte, a realidade dos fatos anonimamente delatados.
Em suma: analisada a questão sob a perspectiva da delação anônima, e considerados os elementos que venho de mencionar, não vejo como reconhecer, desde logo e ao menos em sede de estrita delibação, ilicitude na instauração, contra os ora pacientes, da “persecutio criminis” em referência.
Todos os elementos que venho de expor levam-me a vislumbrar descaracterizada, ao menos em juízo de sumária cognição, a plausibilidade jurídica da pretensão cautelar deduzida na presente causa.
Sendo assim, em face das razões expostas e sem prejuízo de ulterior reexame da matéria quando do julgamento final desta ação de “habeas corpus”, indefiro o pedido de medida cautelar.
Publique-se.
Brasília, 19 de maio de 2011.
Ministro CELSO DE MELLO
Relator
* decisão publicada no DJe de 23.5.2011

RE N. 289.321-PR RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO

SERVIÇO PÚBLICO – ESTABILIDADE – ARTIGO 19 DO ADCT. A estabilidade prevista no artigo 19 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias requer tempo de serviço, à época da promulgação da Carta de 1988, igual a cinco anos.
RELAÇÃO JURÍDICA – CLT – CESSAÇÃO. A cessação de relação jurídica regida pela Consolidação das Leis do Trabalho, no tocante a servidor público que não detenha a estabilidade, prescinde da formalização de processo administrativo e, portanto, do contraditório.

RE N. 581.113-SC RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI

Concurso público. Criação, por lei federal, de novos cargos durante o prazo de validade do certame. Posterior regulamentação editada pelo Tribunal Superior Eleitoral a determinar o aproveitamento, para o preenchimento daqueles cargos, de aprovados em concurso que estivesse em vigor à data da publicação da Lei. 1. A Administração, é certo, não está obrigada a prorrogar o prazo de validade dos concursos públicos; porém, se novos cargos vêm a ser criados, durante tal prazo de validade, mostra-se de todo recomendável que se proceda a essa prorrogação. 2. Na hipótese de haver novas vagas, prestes a serem preenchidas, e razoável número de aprovados em concurso ainda em vigor quando da edição da Lei que criou essas novas vagas, não são justificativas bastantes para o indeferimento da prorrogação da validade de certame público razões de política administrativa interna do Tribunal Regional Eleitoral que realizou o concurso. 3. Recurso extraordinário provido.

Partido político. Criação. Registro civil. Justiça Eleitoral. Filiação. Prazo. Justa causa.

Após o pedido de registro de nova agremiação exclusivamente no registro civil, não há falar em filiação partidária, isso porque o partido político não está definitivamente constituído.
A filiação partidária somente é possível após o registro do estatuto no TSE e deve ser formalizada pelo interessado junto ao partido, independentemente de manifestação anterior, haja vista que a filiação não pode ser presumida, por constituir ato de vontade.
Com efeito, o ato de filiação partidária é ato processual eleitoral formal e depende de manifestação expressa.
Além disso, a lei prevê – para aqueles que pretendem ser candidatos – um tempo certo para o seu requerimento.
Assim, qualquer ato de subscrição anterior ao registro do estatuto pelo TSE não pode ser considerado como filiação partidária.
A criação de um partido político constitui atividade lícita e não poderia deixar de sê-lo, visto que a CF/1988 assegura a liberdade de criação de partidos, bem como o pluripartidarismo (art. 17, caput).
Desse modo, qualquer filiado a partido político, seja ele ocupante de mandato eletivo ou não, que expresse apoio ou se engaje na criação de outro partido não está sujeito a penalidade.
Somente após o registro do estatuto na Justiça Eleitoral, momento em que o partido adquire capacidade eleitoral, torna-se possível a filiação partidária, a qual constituiria justa causa para a desfiliação do partido de origem.
O registro do estatuto do partido pelo TSE é condição sine qua non para que seja considerada a justa causa.
O envio das listas de filiados à Justiça Eleitoral, previsto no art. 19 da Lei nº 9.096/1995, tem por objetivo comprovar a filiação partidária e o respectivo prazo.
Desse modo, o encaminhamento da listagem de partido cujo estatuto fora registrado no TSE a menos de um ano das eleições não supre a exigência legal do prazo mínimo de filiação – um ano, contado da constituição definitiva do partido.

Assim, caso seja registrado o estatuto do partido no TSE em prazo inferior a um ano das eleições, seus filiados não poderão participar da disputa.
Desse modo, para aqueles que contribuíram para a criação do novo partido, é razoável aplicar analogicamente o prazo de 30 dias, previsto no art. 9º, § 4º, da Lei nº 9.096/1995, a contar da data do registro do estatuto pelo TSE, para a filiação no novo partido.
Nesse entendimento, o Tribunal, por unanimidade, respondeu à consulta.
Consulta nº 755-35/DF, rel. Min. Nancy Andrighi, em 2.6.2011.

Propaganda eleitoral. Irregularidade. Multa. Parcelamento.

O artigo 10 da Lei nº 10.522/2002 prevê que os débitos de qualquer natureza para com a Fazenda Nacional poderão ser parcelados em até sessenta parcelas mensais, a exclusivo critério da autoridade fazendária, na forma e condições nela previstas.
Compete, portanto, à autoridade fazendária e não a juiz eleitoral o parcelamento de multa eleitoral.
Nesse entendimento, o Tribunal, por unanimidade, desproveu o agravo regimental.
Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral nº 36.019/CE, rel. Min. Nancy Andrighi, em 17.5.2011.

Estado deve reajustar todo ano salário de servidores

Por Gabriela Rocha

"O círculo vicioso hoje notado nas três esferas — federal, estadual e municipal — não pode persistir." Segundo o ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, o Estado é desrespeitoso, tem vantagem indevida e dá mau exemplo ao não reajustar anualmente a remuneração de seus servidores pela inflação do período. Assim, ele votou para condenar o estado de São Paulo a indenizar seus servidores por não repor a inflação desde janeiro de 1997. O julgamento foi suspenso pelo pedido de vista da ministra Carmen Lúcia.

O recurso foi apresentado por policiais militares contra acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo que negou o pedido de condenação. O ministro considerou que a relação jurídica entre Estado e servidor público é comutativa e sinalagmática, ou seja, pressupõe direitos e obrigações recíprocos.

Essa característica, diz, é assegurada nos incisos X e XV do artigo 37 que preveem a obrigação de revisão geral e a irredutibilidade dos vencimentos e subsídios dos ocupantes de cargos e empregos públicos. Os incisos foram alterados pela Emenda Constitucional 19, de 1998.

Ele considerou que a EC 19/98 tinha o objetivo de "recuperar o respeito e a imagem do servidor público perante a sociedade; estimular o desenvolvimento profissional dos servidores e; melhorar as condições de trabalho". Nesse sentido, diz que melhorar as condições do servidor é o parâmetro a nortear a interpretação do artigo 37.

Marco Aurélio lembrou que o servidor público não tem o mesmo poder de barganha dos trabalhadores em geral na medida em que a greve no serviço público até hoje não foi regulamentada via legislativa, tendo sido, inclusive, objeto da integração mediante mandado de injunção.

O ministro fez questão de diferenciar aumento e reajuste. No caso deste último, disse não se tratar "de fixação ou aumento de remuneração — estes, sim, a depender de lei, na dicção do inciso X do artigo 37 da Carta da República. Versa-se o reajuste voltado a afastar os nefastos efeitos da inflação. Objetiva-se a necessária manutenção do poder aquisitivo da remuneração, expungindo-se o desequilíbrio do ajuste no que deságua em vantagem indevida para o Poder Público, a aproximar-se, presente a força que lhe é própria, do fascismo. Não se pode adotar entendimento que implique supremacia absoluta do Estado, em conflito com o regime democrático e republicano".

Considerando precedentes do STF sobre a omissão inconstitucional, disse que não tem razão quem nega eficácia ao artigo 37, inciso X, da Constituicao, que prevê o reajuste.

"Não perco de vista o horizonte social quando busco a solução dos problemas jurídicos com que me defronto. Aliás, qualquer interpretação jurídica parte da consideração de elementos fáticos, ainda que seja uma interpretação em abstrato, pois, mesmo em casos tais, o magistrado não deixa de formular a hipótese e alcançar conclusões com base na realidade conhecida", explica.

Desse modo, defende que "o Supremo não deve ser um filtro pragmático quanto a disposições constitucionais cuja eficácia depende de recursos para que seja concretamente observada".

Bom sinal
Na sessão, a Assessoria Jurídica Nacional da Fenajufe realizou sustentação oral juntamente com outros dois amici curiae, a Andesp e o Sinpofesc.

Em sua sustentação oral, o advogado da Fenajufe, Pedro Maurício Pita Machado, afirmou que o fato do direito à revisão não poder ser diretamente assegurado não impede a indenização pleiteada por ser "uma obrigação secundária, decorrente do descumprimento da obrigação original, de revisar os vencimentos". Nesse sentido, ele disse que fica clara a não invasão na esfera do legislativo já que "conceder ou não indenizações é típica função jurisdicional".

Também destacou a necessidade de rever a jurisprudência sobre a matéria, com uma discussão mais aprofundada. Concluiu dizendo que "está em jogo não só o direito a uma indenização, mas a efetividade da Constituição e a autoridade das decisões do Supremo que já decretaram a mora legislativa nessa matéria".

O relator acolheu o recurso dos servidores — todos policiais militares de São Paulo — concedendo uma indenização equivalente aos salários vencidos reajustados pelo INPC, descontados os reajustes eventualmente efetuados no período, com juros e correção monetária.

O advogado avalia que o resultado da sessão foi bastante positivo: "onde havia uma jurisprudência consolidada contra os servidores, houve um brilhante voto favorável e uma decisão coletiva do tribunal de aprofundar o debate, após o pedido de vista, o que pode abrir caminho para uma revisão do posicionamento histórico do tribunal".

RE 579.431
Clique aqui para ler a íntegra do voto do ministro Marco Aurélio

INVENTÁRIO. TAXA JUDICIÁRIA. MEAÇÃO. CÔNJUGE SUPÉRSTITE.

Discute-se, no REsp, a base de cálculo da taxa judiciária em processo de inventário, tendo as instâncias ordinárias entendido que ela deveria incidir sobre o monte mor, incluindo-se aí a meação do cônjuge supérstite. Sustenta a inventariante que, da base de cálculo da taxa judiciária, deve ser excluída a meação do cônjuge sobrevivente. O Min. Relator afirmou que não há motivo para que a taxa judiciária incida sobre a totalidade dos bens do casal, sem a exclusão da meação do cônjuge sobrevivo, visto que, na jurisprudência do STF, taxa judiciária e custas judiciais “são espécies tributárias resultantes da prestação de serviço público específico e divisível e que têm como base de cálculo o valor da atividade estatal referida diretamente ao contribuinte”. Com efeito, no seu dizer, no processo de inventário, a meação do cônjuge supérstite não é abarcada pelo serviço público prestado, destinado essencialmente a partilhar a herança deixada pelo de cujus; tampouco pode ser considerada proveito econômico, porquanto pertencente por direito próprio e não sucessório ao cônjuge viúvo. Logo, no processo de inventário, a taxa judiciária deve ser calculada sobre o valor dos bens deixados pelo de cujus, excluindo-se a meação do cônjuge supérstite. Diante do exposto, a Turma deu provimento ao recurso para afastar a meação do cônjuge sobrevivente da base de cálculo da taxa judiciária. Ressaltou ainda o Min. Relator que, não obstante a existência de precedentes da Primeira Seção deste Tribunal sobre o tema, segundo aresto da Corte Especial, como a controvérsia imediata diz respeito à taxa judiciária devida, de caráter evidentemente tributário, em relação jurídica de direito privado, qual seja, processo de inventário de bens, há a incidência do art. 9º, § 2º, XII, do RISTJ. Precedentes citados do STF: ADI na MC 1.772-MG, DJ 8/9/2000; ADI 2.040-PR, DJ 25/2/2000; do STJ: REsp 343.718-SP, DJ 20/6/2005; REsp 437.525-SP, DJ 9/12/2003, e CC 87.898-MT, DJe 30/10/2008. REsp 898.294-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 2/6/2011.

ACP. TÍTULOS. CAPITALIZAÇÃO. CLÁUSULA. PRAZO. CARÊNCIA.

Em ação civil pública (ACP) promovida pela Associação Nacional de Defesa da Cidadania e do Consumidor (Anadec) contra instituição financeira (banco recorrente), discute-se a legalidade de cláusula dos contratos de capitalização negociados pela recorrente com seus clientes nos quais institui prazo de carência de 12 meses para devolução da importância recolhida pelo aplicador que desiste do plano de capitalização. O tribunal a quo deu provimento ao recurso de apelação, reformando a sentença de improcedência ao argumento de que a cláusula estipula desvantagem excessiva ao consumidor, impondo dupla penalidade ao desistente: a redução do valor a restituir e o prazo para essa finalidade. Para o Min. Relator, com relação à incidência da Súm. n. 5-STJ, embora utilizada para inadmissão do REsp, no caso, não se discute a simples interpretação de cláusula contratual, circunstância que atrairia a incidência daquele enunciado, mas como há vinte anos, de igual modo, já decidira o Min. Eduardo Ribeiro: a questão não está em saber o alcance do que as partes pactuaram, mas de sua validade em face da lei. Assim, registra o Min. Relator que, se há norma jurídica permitindo a celebração de cláusula de carência de até 24 meses para devolução dos valores investidos, não se pode anular por abusiva aquela que prevê prazo inferior, de 12 meses, para a devolução de valores aplicados, sem que haja a evidência de que o investidor tivesse sido levado a erro quanto a essa circunstância. Considera perfeitamente possível, sem desrespeitar os princípios do CDC, harmonizá-los com outras normas legais que reconhecem a validade da cláusula nos contratos de capitalização por meio da qual se estipula prazo de carência para devolução dos valores investidos a quem desiste do plano a que aderiu. Deve, a seu ver, ser utilizada a técnica do "diálogo das fontes" para harmonizar a aplicação concomitante de dois diplomas legais ao mesmo negócio jurídico, tal como na hipótese: as normas específicas que regulam os títulos de capitalização (DL n. 261/1967) e o CDC, o qual assegura aos investidores a transparência e as informações necessárias ao perfeito conhecimento do produto. Logo, assevera que não se pode, em ACP, buscar, de forma genérica e preventivamente, impedir a livre estipulação de cláusulas contratuais expressamente admitidas pelo ordenamento jurídico pátrio sob o pretexto de proteção da sociedade, visto que, numa democracia, as pessoas devem ter liberdade de escolha e assumir as consequências daí advindas. Com esse entendimento, a Turma deu provimento ao recurso para julgar improcedente a ACP proposta pela Anadec, isenta do pagamento dos ônus de sucumbência nos termos do art. 18 da Lei n. 7.347/1985. Precedente citado: REsp 4.930-SP, DJ 4/3/1991. REsp 1.216.673-SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 2/6/2011.

RESPONSABILIDADE. DESPESAS CONDOMINIAIS. PROMESSA. COMPRA E VENDA.

A Turma deu provimento ao recurso especial a fim de reconhecer a ilegitimidade passiva da recorrente para figurar na ação de cobrança de despesas condominiais (relativas a meses de 2004 e 2005) proposta, na origem, pelo condomínio no qual é proprietária de uma sala. Na espécie, ela havia vendido o imóvel em 1999 por meio de contrato de promessa de compra e venda, tendo o promissário comprador se imitido na posse precária do bem. De acordo com o Min. Relator, a responsabilidade pelos encargos condominiais, quando há contrato de promessa de compra e venda, pode recair tanto sobre o promissário comprador quanto sobre o promitente vendedor. Entretanto, salientou que não cabe ao autor da ação escolher um dos dois aleatoriamente, sendo necessário aferir com quem a relação jurídica material foi estabelecida no caso concreto. Assim, asseverou que, nessas hipóteses, o promissário comprador que se imitiu na posse do imóvel, ainda que em caráter precário, e de cuja imissão o condomínio teve conhecimento, deve responder pelas despesas condominiais no período em que exerceu essa posse, mostrando-se irrelevante o fato de o contrato ter sido ou não registrado. Precedentes citados: EREsp 136.389-MG, DJ 13/9/1999; REsp 470.487-SP, DJ 30/6/2003; REsp 200.914-SP, DJ 13/12/1999; AgRg no REsp 573.801-SP, DJe 27/10/2010; REsp 579.943-RS, DJ 16/11/2004; REsp 813.161-SP, DJ 8/5/2006, e REsp 172.859-PR, DJ 1º/10/2001. REsp 1.079.177-MG, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 2/6/2011.

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. EOAB.

In casu, o STF (em 27/9/1985) extinguiu o processo relativo à ação de execução ajuizada pela cooperativa ora embargante contra a sociedade empresária executada, condenando a embargante ao pagamento dos honorários advocatícios. Os causídicos ora embargados, que foram representantes da executada, após a homologação da liquidação (em 23/10/1986), requereram a execução da sentença (em 27/12/2004) em nome próprio, porém encontraram oposição da embargante, que agora busca saber a quem deve efetivar o pagamento dos honorários: se à parte contra quem travava a contenda ou aos seus advogados, os embargados. A embargante afirma ser credora da executada, mas tem interesse em realizar a compensação de crédito de R$ 299 milhões com dívida de honorários. No acórdão embargado, ficou definido que os advogados têm direito autônomo aos honorários mesmo antes do novo Estatuto da Ordem dos Advogados (EOAB – Lei n. 8.906/1994). Entretanto, a embargante aponta dissidência jurisprudencial com paradigmas da Primeira, Segunda e Quarta Turmas deste Superior Tribunal. Assim, a controvérsia consiste em definir a quem pertencem os honorários advocatícios fixados judicialmente antes do advento do novo EOAB. Para o Min. Relator, embora, nessa situação, os honorários sejam da parte, o advogado poderia executá-los diretamente, salvo se houvesse disposição contratual em sentido contrário, contudo essa tese ficou vencida. Para o condutor da tese vencedora, Min. Humberto Martins, sob a égide do antigo estatuto e após o CPC/1973, o direito é da parte, e o advogado somente pode executá-lo diretamente por disposição contratual. Explica que, antes da vigência do CPC/1973, o antigo estatuto da OAB (Lei n. 4.215/1963) atribuía um direito subjetivo aos causídicos, com poucas restrições, mas, após 1973, quando o Código passou a viger, aquele direito autônomo à execução dos honorários teria sofrido a influência da nova regra do CPC. Assevera que, na realidade, o direito do representante judicial foi subsumido ao direito subjetivo da parte, podendo-se dizer, a seu ver, que a autonomia do advogado foi restringida, porquanto condicionada à existência de uma avença. No caso, reconhece que inexiste nos autos a demonstração de que houve avença entre a parte vencedora e seus advogados para atribuição do direito subjetivo autônomo às verbas sucumbenciais. Ressalta, ainda, que a maioria das Turmas tem admitido que, antes do advento da Lei n. 8.906/1994, a titularidade das verbas de honorários de sucumbência é da parte vencedora e não do respectivo advogado, embora aponte que existem decisões divergentes. O Min. Mauro Campbell Marques, que também aderiu à tese vencedora, acrescentou outros fundamentos, entre eles, o de que não há como equiparar a disciplina disposta no EOAB/1963 à do atual de 1994, porquanto o estatuto anterior dispunha sobre o direito do advogado apenas quanto aos honorários contratados e, quando não existia contrato dispondo sobre os honorários, eles eram fixados em percentual sobre o valor da causa, devendo ser arbitrados judicialmente. Assim, a existência do "direito autônomo" mencionado no § 1º do art. 99 do estatuto anterior deve ser entendida somente nesse contexto. Aponta que o estatuto atual, ao contrário do anterior, dispôs expressamente que é assegurado ao advogado inscrito na OAB o direito não só aos honorários convencionados, mas também aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência e, com a edição do CPC em 1973, estipulou-se que o vencido deveria pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios. Destaca também que outra diferença a ser observada, para reforçar a separação dos regimes, é que, diferentemente do estatuto antigo, o atual, ao dispor sobre o direito autônomo à execução, faz isso com uma cláusula que antes não existia: ressalta expressamente que os honorários por arbitramento ou sucumbenciais pertencem ao advogado. Esclarece que antes não se admitia, em regra, o direito do advogado à sucumbência, porquanto já remunerado pela via contratual, até porque a sucumbência tinha, naquela época, natureza de ressarcimento para afastar o prejuízo da parte vencedora, que teve de contratar seu causídico. Assim, a lei processual, a partir de 1973, por sua vez dispôs que os honorários deveriam ser arbitrados em favor da parte vencedora de modo a corroborar a ideia de que a regra era a remuneração do advogado pelos honorários contratuais e a sua exceção, a remuneração pela sucumbência. Logo, a harmonização mais adequada a partir do CPC/1973 e antes do advento do estatuto de 1994 é que o pagamento dos honorários sucumbenciais à parte estabelecido no art. 20 do CPC está em sintonia com o direito do advogado aos honorários contratados, como regra, conforme previsão dos arts. 96 e 97 do EOAB/1963. Conclui que a violação da jurisprudência do STJ deu-se quando admitida a execução pelo advogado sem saber se houve o pagamento antecipado dos honorários ou autorização em contrato e, assim, por via transversa, houve eficácia retroativa ao estatuto antigo, o que jamais este Superior Tribunal admitiu. Diante do exposto, a Corte Especial, por maioria, após o voto de desempate do Min. Felix Fischer, deu provimento aos embargos de divergência. Precedentes citados: REsp 188.768-SP, DJ 20/3/2006; REsp 541.189-RS, DJ 9/2/2005; REsp 115.156-RS, DJ 8/3/2000; REsp 160.797-MG, DJ 1º/8/2000; REsp 2.165-RS, DJ 28/9/1992; REsp 184.561-PR, DJ 24/4/2006; REsp 859.944-SC, DJe 19/8/2009; REsp 16.489-PR, DJ 8/6/1992; AgRg no Ag 249.734-RS, DJ 25/9/2000, e REsp 90.118-DF, DJ 11/11/1996. EAg 884.487-SP, Rel. originário Min. Luiz Fux, Rel. para acórdão Min. Humberto Martins, julgados em 1º/6/2011.

Marcha da Maconha entra na pauta do Supremo

POR RODRIGO HAIDAR

O Supremo Tribunal Federal deve decidir, na quarta-feira (15/6), se os cidadãos podem organizar marchas com o objetivo de chamar a atenção para o debate em torno da descriminalização do uso de drogas. Foi colocada na pauta de julgamentos da Corte a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 187) ajuizada pela vice-procuradora-geral da República, Deborah Duprat.

A ação foi ajuizada em julho de 2009, quando Deborah ocupava interinamente o cargo de procuradora-geral da República. Na prática, o Supremo irá decidir se organizar as chamadas marchas da maconha, que vêm ganhando cada vez mais espaço no país, é o mesmo que fazer apologia ao uso de drogas. O relator da ação é o decano do tribunal, ministro Celso de Mello.

O debate deve girar em torno de três princípios constitucionais caros à sociedade: o direito de liberdade de reunião, proteção das minorias e a garantia de exercer a livre manifestação do pensamento. O ministro Celso de Mello admitiu dois amici curiae no processo. A Associação Brasileira de Estudos Sociais do Uso de Psicoativos (Abesup) e o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), que se manifestarão no julgamento.

A vice-procuradora pediu que o Supremo dê interpretação conforme à Constituição ao artigo 287 do Código Penal. A norma prevê pena de detenção de três a seis meses ou multa para quem fizer, “publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime”. Deborah Duprat pede que a interpretação seja feita “de forma a excluir qualquer exegese que possa ensejar a criminalização da defesa da legalização das drogas, ou de qualquer substância entorpecente específica, inclusive através de manifestações e eventos públicos”.

Como amicus curiae, a Abesup pede a ampliação da ação. A associação requer que o Supremo conceda Habeas Corpus de ofício para que seja permitido o cultivo doméstico da maconha e seu uso para fins medicinais e religiosos.

Em seu relatório, o ministro Celso de Mello destaca um dos argumentos de Deborah Duprat para justificar a necessidade da atuação do Supremo: “Nos últimos tempos, diversas decisões judiciais vêm proibindo atos públicos em favor da legalização das drogas, empregando o equivocado argumento de que a defesa desta idéia constituiria apologia de crime”.

O ministro Celso de Mello liberou seu voto para inclusão na pauta do Supremo no dia 12 de maio, nove dias antes de a Polícia Militar de São Paulo ter reprimido com violência a Marcha da Maconha organizada em São Paulo. A manifestação havia sido proibida por decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo a pedido do Ministério Público. Os desembargadores consideraram que o evento se destina a fazer apologia ao uso de drogas.

Com a decisão do Supremo, as controvérsias em torno da marcha serão pacificadas. O STF já decidiu, em ocasiões anteriores, que o direito à manifestação deve ser livre. Em junho de 2007, o tribunal derrubou decreto baixado pelo então governador Joaquim Roriz, que proibia manifestações com a utilização de carros sonoros na Praça dos Três Poderes, na Esplanada dos Ministérios, na Praça do Buriti e nas vias adjacentes.

RODRIGO HAIDAR é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.