domingo, 27 de março de 2011

ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE IMPROBIDADE. LEI 8.429/92. AÇÃO FUNDADA NA ILEGALIDADE DA DISPENSA DE LICITAÇÃO. ELEMENTO SUBJETIVO DA CONDUTA. IMPRESCINDIBILIDADE. JURISPRUDÊNCIA DA SEÇÃO.

1. A ação de improbidade administrativa, de matriz constitucional
(art.37, § 4º e disciplinada na Lei 8.429/92), tem natureza especialíssima, qualificada pela singularidade do seu objeto, que é o de aplicar penalidades a administradores ímprobos e a outras pessoas - físicas ou jurídicas - que com eles se acumpliciam para atuar contra a Administração ou que se beneficiam com o ato de improbidade (REsp 1.163.643, 1ª Seção, DJe 30/03/10).
2. Não se pode confundir ilegalidade com improbidade. A improbidade é ilegalidade tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo da conduta do agente. Para que se caracterize a improbidade administrativa, é indispensável que o agente tenha atuado com dolo, nas condutas descritas nos artigos 9º e 11 da Lei 8.429/92, ou, pelo menos, com culpa grave, nas do seu artigo 10 (STJ, 1ª Seção, EResp 875.163, DJe de 23/06/10; EResp 654.721, DJe de 01/09/10; e EResp 827.445, DJe 27/09/10).
3. No caso, a demanda tem como causa de pedir a ilegalidade da dispensa de licitação, sem que a inicial afirme ou demonstre que os demandados tenham agido dolosamente ou com culpa grave. E a própria ilegalidade da dispensa de licitação foi afastada pelas instâncias ordinárias, de modo uníssono, entendimento que o recurso especial não consegue desfazer.
4. Recurso especial improvido.

(STJ, REsp 1.150.743, rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJe 26/11/2010)

Embargos de declaração e modulação dos efeitos em RE

O Plenário, por maioria, acolheu embargos de declaração para atribuir eficácia ex nunc a decisão proferida em sede de recurso extraordinário, em que declarada a inconstitucionalidade da cobrança de taxas de matrícula em universidades públicas e editada a Súmula Vinculante 12 — v. Informativo 515. Aduziu-se que, muito embora o recorrente não houvesse pleiteado a modulação dos efeitos da decisão quando da interposição do referido recurso extraordinário, quer nos autos, quer na sustentação oral, seria necessário superar as dificuldades formais para o conhecimento dos embargos. Ponderou-se que, além de a decisão ser revestida de vasta abrangência e excepcional interesse social, haveria uma relevante questão de ordem prática a ser solucionada, tendo em vista a possibilidade de as instituições de ensino serem obrigadas a ressarcir todos os estudantes que eventualmente pagaram as citadas taxas no passado. Nesse sentido, o Min. Gilmar Mendes destacou a delicada situação financeira das universidades, bem como o fato de que tais recursos seriam, inclusive, destinados a fornecer bolsas aos próprios estudantes, atingindo, portanto, finalidade pública. Por fim, garantiu-se o direito de eventual ressarcimento aos que já houvessem ingressado, individualmente, com o respectivo pleito. Vencido o Min. Marco Aurélio que desprovia o recurso por entender inexistir omissão a ser sanada na via de embargos, cujo acolhimento implicaria mudança de manifestação da Corte, em contrariedade ao princípio da segurança jurídica.
RE 500171 ED/GO, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 16.3.2011. (RE-500171)

SERVIDORES PÚBLICOS. JORNADA. TRABALHO.

In casu, discute-se o direito líquido e certo dos recorrentes, servidores públicos com diferentes funções na Administração estadual, entre as quais a de técnico de radiologia, à jornada de trabalho de 30 e 24 horas semanais. Os recorrentes, exceto os técnicos em radiologia, entendem que a Lei estadual n. 13.666/2002 garantiu-lhes carga horária de 30 horas semanais, que só pode ser modificada após nova avaliação do local de trabalho para constatar as condições do ambiente em que exercem suas atividades fins. Contudo, para a Min. Relatora, a referida lei estadual determina que, em regra, a jornada de trabalho é de 40 horas semanais, podendo ser reduzida para 30 horas semanais quando a atividade for desenvolvida em locais insalubres, penosos ou perigosos, devidamente constatados por perícia, e, na hipótese, conforme o aresto recorrido, inexiste laudo a garantir a jornada reduzida. Assim, entendeu que o Dec. estadual n. 4.345/2005 não extrapola os limites da lei ao fixar a carga horária de 40 horas semanais para os servidores públicos, previsão já existente na mencionada lei, que, no entanto, poderá ser alterada desde que haja perícia comprovando o exercício de atividades prejudiciais à saúde, sendo certo, ainda, que a fixação da jornada de trabalho é tema sujeito aos critérios de oportunidade e conveniência do Poder Público. Quanto aos técnicos de radiologia, consignou que a legislação federal estabeleceu como jornada de trabalho para esses profissionais 24 horas semanais, tal como o referido decreto estadual, tendo em conta o fato de ser uma atividade prejudicial à saúde. Todavia, isso não significa que o servidor que exerce essa função não possa, nas 16 horas restantes para complementar a jornada de 40 horas semanais, desenvolver tarefas correlatas. Diante desses argumentos, entre outros, a Turma conheceu parcialmente do recurso e, na parte conhecida, negou-lhe provimento. Precedentes citados: REsp 812.811-MG, DJ 7/2/2008, e RMS 14.078-SP, DJ 6/8/2007. RMS 23.475-PR, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 17/3/2011.

SERVIDORES TEMPORÁRIOS. INSALUBRIDADE. PERICULOSIDADE.

Trata-se de recurso em mandado de segurança em que a questão reside em saber se os recorrentes, servidores contratados em caráter temporário, têm direito à gratificação de insalubridade/periculosidade percebida somente pelos servidores ocupantes de cargo efetivo, sendo que desenvolvem suas atividades no mesmo setor considerado insalubre, motivo pelo qual foi concedida por lei a referida gratificação. Inicialmente, ressaltou a Min. Relatora não se tratar, no caso, de assegurar o pagamento de verba não prevista em lei a pretexto de aplicação do princípio da isonomia, conforme veda a Súm. n. 339-STF. Assim, consignou que, na hipótese, há uma lei disciplinando a gratificação, a qual não distingue as categorias de servidor, se efetivo ou temporário. Desse modo, se a gratificação pleiteada visa recompensar riscos decorrentes do trabalho, sendo certo que a lei considerou como atividade insalubre/penosa o labor na instituição onde os recorrentes trabalham, e aí sim considerando-se o princípio da isonomia, não há motivo para somente concedê-la aos servidores efetivos, se os temporários estão expostos aos mesmos riscos. Diante desses fundamentos, entre outros, a Turma deu provimento ao recurso para conceder a segurança. RMS 24.495-SC, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 17/3/2011.

INDENIZAÇÃO. CONEXÃO. ACIDENTE. TRÂNSITO.

Discute-se, no REsp, a possibilidade de conexão de ações indenizatórias ajuizadas pelo condutor e passageiro de motocicleta vitimados em acidente de trânsito, sendo que um faleceu e o outro ficou lesionado. Assim, é presumível que a vítima lesionada necessite de apuração da extensão dos seus danos, o que demanda prova específica. Entretanto, para a Min. Relatora, existe um liame causal entre os processos, considerando que há identidade entre as causas de pedir; assim as ações devem ser declaradas conexas, evitando-se decisões conflitantes. Destaca que, apesar de o art. 103 do CPC suscitar várias divergências acerca de sua interpretação, a jurisprudência deste Superior Tribunal afirma que, para caracterizar a conexão na forma definida na lei, não é necessário que se cuide de causas idênticas quanto aos fundamentos e objetos, mas basta que elas sejam análogas, semelhantes, porquanto a junção das demandas seria para evitar a superveniência de julgamentos díspares com prejuízos ao próprio Judiciário como instituição. Também observa que a Segunda Seção posicionou-se no sentido de que se cuida de discricionariedade relativa, condicionada à fundamentação que a justifique. Ressalta ainda que, em precedente de sua relatoria na Segunda Seção, afirmou que o citado artigo limita-se a instituir os requisitos mínimos de conexão, cabendo ao juiz, em cada caso, aquilatar se a adoção da medida mostra-se criteriosa, consentânea com a efetividade da Justiça e a pacificação social. Precedentes citados: CC 113.130-SP, DJe 3/12/2010, e REsp 605.120-SP, DJ 15/6/2006. REsp 1.226.016-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 15/3/2011.

DIREITOS AUTORAIS. EVENTO RELIGIOSO.

In casu, trata-se da possibilidade de cobrança de direitos autorais por ter a recorrente realizado execuções musicais e sonorizações ambientais quando da celebração da abertura do ano vocacional em escola, evento religioso, sem fins lucrativos e com entrada gratuita. A Turma proveu parcialmente o recurso e, entre outros fundamentos, assentou que o evento sem fins lucrativos, com entrada gratuita e finalidade exclusivamente religiosa não conflita com a exploração comercial normal da obra (música ou sonorização ambiental), assim como, tendo em vista não constituir evento de grandes proporções, não prejudica injustificadamente os legítimos interesses dos autores. Prepondera, pois, neste específico caso, o direito fundamental à liberdade de culto e de religião frente ao direito de autor. REsp 964.404-ES, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 15/3/2011.

PENHORA. CARTA. FIANÇA.

Cuida-se de REsp em que a questão centra-se em saber se é possível o credor recusar o oferecimento de fiança bancária pelo devedor em garantia a débito objeto de execução judicial. Na espécie, o devedor ofereceu, antes de qualquer iniciativa do credor, uma carta de fiança à penhora. Assim, ressaltou a Min. Relatora que, em tal situação, não se pode aplicar, de maneira direta, o entendimento de que a penhora de dinheiro mediante bloqueio de valores em conta-corrente tem prioridade absoluta sobre o oferecimento de qualquer outro bem. Trata-se de uma hipótese em que é necessário o juízo, ponderando os elementos da causa, apreciar o bem oferecido pelo devedor e checar a conveniência de acolhê-lo ou rejeitá-lo. Observou não se poder engessar a interpretação do CPC de modo a não permitir que, mesmo em hipóteses excepcionais, seja possível ao devedor evitar a imobilização de vultoso capital em espécie. Desse modo, entendeu que, embora a fiança bancária discutida não apresentasse condições de ser aceita na medida em que o devedor se dispôs apenas a cobrir o crédito executado, dever-se-ia ter facultado a ele o oferecimento da garantia nos moldes do art. 656, § 2º, do CPC, ou seja, no valor do débito acrescido de 30%. Dessarte, a recusa da referida fiança somente poderia ser justificada por sólidos argumentos que indicassem precisamente o prejuízo que seria causado ao credor e a ausência de significativos prejuízos ao devedor pela imobilização do capital, o que não ocorreu na espécie. Diante disso, a Turma conheceu parcialmente do recurso e, na parte conhecida, deu-lhe provimento para autorizar a penhora sobre a carta de fiança oferecida pelo devedor nos termos do art. 656, § 2º, do CPC. REsp 1.116.647-ES, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 15/3/2011.

TEORIA. PERDA. CHANCE. CONCURSO. EXCLUSÃO.

A Turma decidiu não ser aplicável a teoria da perda de uma chance ao candidato que pleiteia indenização por ter sido excluído do concurso público após reprovação no exame psicotécnico. De acordo com o Min. Relator, tal teoria exige que o ato ilícito implique perda da oportunidade de o lesado obter situação futura melhor, desde que a chance seja real, séria e lhe proporcione efetiva condição pessoal de concorrer a essa situação. No entanto, salientou que, in casu, o candidato recorrente foi aprovado apenas na primeira fase da primeira etapa do certame, não sendo possível estimar sua probabilidade em ser, além de aprovado ao final do processo, também classificado dentro da quantidade de vagas estabelecidas no edital. AgRg no REsp 1.220.911-RS, Rel. Min. Castro Meira, julgado em 17/3/2011.

ACP. IMPROBIDADE. DEMORA. INFORMAÇÕES. MPF.

O MPF (recorrente) ajuizou ação civil pública por improbidade administrativa (ACP) contra a diretora geral de órgão ambiental estadual (recorrida) em razão de ela não ter atendido, com a devida presteza, à requisição de informações a respeito de determinada sociedade empresária feita pelo Parquet em oito ofícios consecutivos a fim de instruir outra ACP de cunho ambiental. O tribunal a quo, por sua vez, logo determinou o trancamento da ACP ao fundamento de que, mesmo diante da evidência de ser desarrazoada a demora na resposta (três anos), não se poderia imputar dolo ou má-fé à recorrida, mas sim apenas culpa (desídia), diante da justificação de que o órgão ambiental e a sociedade empresária localizavam-se distantes da sede do MPF oficiante, além da depreciação das estruturas públicas, o que, a seu ver, causou a demora. Sucede que, nesta instância especial, a Turma, ao prosseguir o julgamento, determinou o prosseguimento da ACP, visto que, apesar de relevantes, os fundamentos utilizados na origem para o trancamento não são suficientes para, de pronto, afastar o elemento subjetivo doloso, diante das peculiaridades da hipótese, quanto mais se, na seara ambiental, o aspecto temporal é de grande relevância, mostrando-se o tempo não como aliado, mas como inimigo da restauração e da recuperação ambiental (vide os princípios da prevenção e da precaução incorporados implicitamente nos arts. 225 da CF, 4º e 9º da Lei n. 6.938/1981 e no princípio da legalidade ambiental). O Min. Relator externou seu entendimento de que a Súm. n. 7-STJ não deve ser aplicada em casos de improbidade administrativa quando o acórdão recorrido deixa claro os fatos que subjazem à demanda, pois a prestação jurisdicional do STJ no que tange à caracterização do elemento subjetivo seria de mera qualificação jurídica. REsp 1.116.964-PI, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 15/3/2011.

sexta-feira, 25 de março de 2011

Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral nº 7875839-60/DF Relator: Ministro Marcelo Ribeiro Ementa: AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. DOAÇÃO DE RECURSOS DE CAMPANHA. QUEBRA DE SIGILO FISCAL. CONVÊNIO FIRMADO ENTRE O TSE E A SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL. PRESERVAÇÃO DO DIREITO À PRIVACIDADE. FUNDAMENTO INATACADO. SÚMULA Nº 182/STJ. DESPROVIMENTO.

1. Constitui prova ilícita aquela colhida mediante a quebra do sigilo fiscal do doador, sem autorização judicial. Precedente: AgR-REspe nº 82.404/RJ, rel. Min. Arnaldo Versiani, Sessão de 4.11.2010.
2. Ao Ministério Público ressalva-se a possibilidade de requisitar à Secretaria da Receita Federal apenas a confirmação de que as doações feitas pela pessoa física ou jurídica à campanha eleitoral obedecem ou não aos limites estabelecidos na lei.
3. Havendo a informação de que o montante doado ultrapassou o limite legalmente permitido, poderá o Parquet ajuizar a representação prevista no art. 96 da Lei n° 9.504/97, por descumprimento aos arts. 23 e 81 da mesma lei, e pedir ao juiz eleitoral que requisite à Receita Federal os dados relativos aos rendimentos do doador.
4. Mesmo com supedâneo na Portaria Conjunta SRF/TSE nº 74/2006, o direito à privacidade, nele se incluindo os sigilos fiscal e bancário, previsto no art. 5º, X, da Constituição Federal, deve ser preservado, mediante a observância do procedimento acima descrito.
5. Agravo regimental desprovido.
DJE de 14.3.2011.
Noticiado no informativo nº 1/2011.

Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 3142-57/BA Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior Ementa: AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ELEIÇÕES 2010. PROPAGANDA E L E I TO R A L E X T EMP O R Â N E A . R E Q U I S I TO S. AUSÊNCIA.

1. A publicidade institucional que se mantém nos limites do art. 37, § 1º, da Constituição Federal não pode ser considerada propaganda eleitoral extemporânea.
2. No caso, não havia, no material impugnado, qualquer referência ao candidato, à eleição vindoura, pedido de votos ou outro elemento que induzisse o eleitor a concluir que o agravado era o mais apto a exercer mandato eletivo.
3. Agravo regimental desprovido.
DJE de 17.3.2011.

Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 2612-53/BA Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior Ementa: AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ELEIÇÕES 2010. PROPAGANDA PARTIDÁRIA. DESVIO DE FINALIDADE. PROMOÇÃO PESSOAL. CARÁTER SUBLIMINAR. CARACTERIZAÇÃO. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. AUSÊNCIA DE COTEJO ANALÍTICO. NÃO PROVIMENTO.

1. É vedada a realização de propaganda partidária que se destine à promoção pessoal de filiado, eximindo-se da discussão de temas de interesse político-comunitário. Precedentes.
2. Na espécie, a exaltação das realizações pessoais do representado se confunde com a ação política a ser desenvolvida, traduzindo a ideia de que seja ele a pessoa mais apta para o exercício da função pública, circunstância que configura a prática de propaganda eleitoral antecipada. Precedentes.
3. Agravo regimental não provido.
DJE de 16.3.2011.

Ação cautelar. Plausibilidade. Captação ilícita de sufrágio. Conduta. Prática. Anuência. Necessidade.

A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral é no sentido de que, para imposição das sanções do art. 41-A da Lei nº 9.504/1997, é indispensável a prova de que o candidato tenha praticado a conduta ilícita ou a ela anuído.
Afigura-se relevante a questão suscitada pelos autores da cautelar – a justificar a concessão de efeito suspensivo a recurso especial – de que a decisão condenatória não assinalou participação ou anuência deles em face do ilícito reconhecido pelo Tribunal Regional Eleitoral.
Nesse entendimento, o Tribunal, por maioria, negou provimento ao agravo regimental.
Agravo Regimental na Ação Cautelar nº 4018-12/CE, rel. Min. Arnaldo Versiani, em 15/3/2011.

Delegação de poder a banca gera ação de improbidade

Por Alessandro Cristo

A contratação, por escritórios de advocacia de grande porte, de correspondentes para tarefas burocráticas em locais afastados sempre foi uma maneira de concentrar esforços no que realmente gera retorno. Elaboração de estratégias e peças ficam por conta da banca de renome, enquanto a protocolização de pedidos, a obtenção de cópias de processos e o comparecimento a audiências em varas distantes são feitos pela banca local. O costume, porém, pode causar dor de cabeça quando o cliente é o poder público.

A prática chegou a levar o escritório Siqueira Castro Advogados a responder a uma Ação Civil de Improbidade Administrativa movida pelo Ministério Público do Rio de Janeiro. Contratada em 2003 pela Companhia Estadual de Águas e Esgotos para serviços jurídicos, a banca foi processada por contar com ajuda para fazer o trabalho — o que põe em xeque a prática, usual em relações privadas. 

O Ministério Público levantou a hipótese de enriquecimento ilícito e subcontratação irregular depois de um erro do escritório Eliel de Mello & Vasconcelos, correspondente do Siqueira Castro. A banca perdeu demandas trabalhistas da Cedae por não recolher custas judiciais dos processos, o chamado “preparo”. O deslize foi comunicado pelo Tribunal Regional do Trabalho do Rio à Promotoria, que viu a transferência da tarefa como indevida. Contratado em 2003 sem licitação — devido a inexigibilidade por notória especialização — para representar a Cedae em causas trabalhistas e nos Juizados Especiais, o Siqueira Castro assinou um aditivo ao contrato inicial com a empresa pública para permitir a prestação de parte dos serviços na área trabalhista pelo correspondente Eliel de Mello & Vasconcelos. Segundo o escritório, o reforço foi pedido pela Cedae, e admitido pelo Tribunal de Contas estadual.

Porém, para o MP, ao delegar trabalho e receber o dinheiro correspondente, o Siqueira Castro enriqueceu ilicitamente às custas do poder público. A Cedae, por sua vez, foi acusada de admitir sem licitação a contratação do segundo escritório.

Ao receber a ação, a juíza Margaret de Olivaes Valle dos Santos, da 6ª Vara de Fazenda Pública da Capital, afirmou que só a abertura do processo esclareceria os indícios de “burla ao artigo 25, inciso II, da Lei 8.666/1993 com a suposta terceirização dos serviços contratados”, como alegou a Promotoria. A decisão saiu em março do ano passado sem, porém, qualquer menção a favor ou contra as acusações. Em maio, o Tribunal de Justiça do Rio rejeitou recurso do Siqueira Castro contra o início da ação, primeiro monocraticamente pelo desembargador Rogério de Oliveira Souza, relator, e depois em decisão da 9ª Câmara Cível.

Embora o processo ainda sequer tenha começado a reunir informações para a fase probatória, uma questão já emerge: escritórios de advocacia contratados pelo Estado podem prestar serviços usando correspondentes?

Trabalho em excesso
Envolvidos no processo já apresentaram seus argumentos. À Justiça, o contador e perito judicial Sidney Roberto Szabo, e o engenheiro Aluizio Meyer de Gouvêa Costa — acusado de aceitar, em nome da Cedae, a subcontratação do Eliel de Mello —, afirmaram não ter havido terceirização, mas apenas “substabelecimento de poderes”. Segundo as declarações, a prestação dos serviços exigia maior mobilidade dos advogados, o que admitiria a ajuda de outro escritório. Costa pediu demissão da Cedae em 2005. A ConJur tentou contato com o escritório Eliel de Mello e com a Procuradoria-Geral do Estado, mas não obteve retorno.

Em sua defesa, o Siqueira Castro garantiu que ficou com o maior volume dos processos da empresa — 78% das ações trabalhistas —, e que apenas parte do acervo foi repassada ao escritório menor: 1.123 casos. No processo, a Cedae complementou que todo o trabalho intelectual era de responsabilidade do Siqueira Castro, e que apenas o comparecimento às centenas de audiências marcadas pela Justiça do Trabalho tinham a participação do Eliel de Mello. Ainda de acordo com o Siqueira Castro, o Tribunal de Contas do Estado aprovou a decisão de contratar o correspondente, formalizada por meio de um termo aditivo ao contrato.

“Fomos o primeiro escritório do Rio de Janeiro a ter estrutura montada para atender causas nos Juizados Especiais, e somos o maior escritório do Brasil na área trabalhista, em número de advogados, estagiários, assistentes administrativos e computadores”, afirma o advogado Fabio Kurtz, sócio do Siqueira Castro. “Esse arcabouço técnico e profissional permite a contratação por inexigibilidade de licitação.”

O acordo entre o Siqueira Castro e a Cedae previa representação judicial remunerada em R$ 65 por ação. A quantidade variou, de acordo com a banca, de 4 mil, em 2003, para 6,9 mil, em 2010. Segundo o Ministério Público, o contrato original vedava o substabelecimento de poderes, a não ser para subcontratação de correspondentes em Brasília, para representação perante o Tribunal Superior do Trabalho e o Supremo Tribunal Federal. Foi o aditivo firmado no ano seguinte — a pedido da Cedae, segundo o Siqueira Castro — que suspendeu a vedação e permitiu a subcontratação. Escolhido também sem processo licitatório, o Eliel de Mello recebeu R$ 50 por processo ao representar o Siqueira Castro nos fóruns em algumas demandas, entre 2004 e 2007.

“O que ocorreu foi apenas a outorga de substabelecimentos, com vistas a contar com a colaboração do escritório na realização de diversas diligências e audiências que eram marcadas diariamente no âmbito da Justiça do Trabalho”, explicaram os advogados Carlos Roberto de Siqueira Castro, Adriana Conrado Zamponi e Daniela Soares Domingues, em defesa entregue à Justiça. Segundo eles, a elaboração de teses e estratégias de defesa e as sustentações orais eram de exclusiva competência da banca principal. “A atuação do Eliel de Mello se limitava à contribuição na presença física nas audiências e alguns atos processuais, sem retirar do Siqueira Castro sua supervisão geral do patrocínio judicial.”

Para a banca, o contrato de prestação de serviços, firmado com a Cedae, não se confunde com o contrato de mandato, celebrado com o segundo escritório. “O primeiro é celebrado intuitu personae”, explicam os advogados. Ou seja, a contratação pelo poder público é personalíssima, enquanto que a subcontratação do correspondente é meramente mandamental, para atuar como procurador ou representante. “Mandatos são outorgados aos advogados sócios, associados ou prestadores de serviço.”

A Promotoria responsável pela tutela coletiva no Rio contesta. O argumento é o de que, como o motivo que levou o Siqueira Castro a ser escolhido sem licitação foi sua notória especialização, ele não poderia incumbir outro escritório de tarefas como o comparecimento a audiências. O órgão também ajuizou inquérito contra o método de escolha da Cedae, alegando que causas trabalhistas e de Juizados não exigem conhecimento técnico específico que justifique a dispensa de licitação.

Atividade intelectual
O uso de correspondentes na execução de contratos com o poder público depende de fatores como o objeto contratado, de acordo com a especialista em Direito Administrativo Márcia Buccolo, sócia do escritório Edgard Leite Advogados. Ela comentou a questão em tese. “Retirar uma certidão é atividade mecânica, despersonalizada, e não um trabalho intelectual. Não precisa de um advogado”, afirma. No entanto, segundo ela, comparecer em audiências demanda a presença do profissional. “Se o contrato for com a administração pública, não pode haver substituição, mesmo que supervisionada, salvo com previsão expressa.”

Já para Fernando Menezes, professor de Direito Administrativo na Universidade de São Paulo, o uso de correspondentes por escritórios faz parte da rotina de trabalho, e a praxe não é desconhecida de quem solicita os serviços. “Mas o contrato tem que prever essa possibilidade”, lembra, sem se referir ao caso concreto. “Se o escritório precisa cobrir as comarcas de todo o interior, será muito mais caro ao Estado se ele não puder contar com um correspondente.”

Contratar, sem licitação, uma banca para acompanhar demandas trabalhistas ou em Juizados pode trazer dor de cabeça. Isso porque, segundo especialistas, é questionável que a tarefa admita escritórios tão experts que dispensem uma seleção. “Até que ponto é singular defender causas na Justiça do Trabalho ou em Juizados Especiais?”, questiona o também professor de Direito Administrativo da USP Gustavo de Oliveira, consultor em Direito Público, que não mencionou a situação específica. “Não teria cabimento contratar o melhor escritório do mundo para, por exemplo, cobrar títulos extrajudiciais”, concorda Fernando Menezes.

Se a contratação causa dúvidas, a subcontratação ainda mais. “O poder público às vezes não planeja a licitação, e pede mais durante a prestação. Mas a subcontratação precisa ter previsão no contrato original”, afirma Oliveira. O que favorece as subcontratações, no entanto, é a jurisprudência. “O Superior Tribunal de Justiça vinha exigindo que só fossem contratados escritórios com sede no local onde o serviço seria prestado, mas isso vem mudando”, afirma ele. Segundo Oliveira, serviços pedidos pela União, por exemplo, têm âmbito nacional, o que torna complicado aplicar o antigo entendimento do STJ.

Ação Civil de Improbidade Administrativa 2008.001.213681-0

Clique aqui para ler o acórdão da 9ª Câmara Cível.
Clique aqui para ler a decisão monocrática que rejeitou o recurso.

Leia a decisão pelo recebimento da ação:

Cuida-se de ação civil pública por ato de improbidade administrativa proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO em face de ALUIZIO MEYER DE GOUVÊA COSTA, SIDNEY ROBERTO SZABO, SIQUEIRA CASTRO ADVOGADOS, ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA ELIEL DE MELLO & VASCONCELOS E CEDAE - COMPANHIA ESTADUAL DE ÁGUAS E ESGOTOS.

Segundo alega, o inquérito civil que instrui a exordial foi instaurado a partir da extração de peças de Reclamação Trabalhistas onde o Escritório de Advocacia Eliel de Mello & Vasconcelos, que patrocinava a demanda, teve um recurso julgado deserto, por falta de preparo. A partir de então, teria o Parquet constatado graves irregularidades na contratação e execução do contrato de prestação de serviços advocatícios firmado entre a CEDAE e o Siqueira Castro Advogados, que caracterizariam ato de improbidade administrativa.

Sustenta que, em 2003 foi celebrado o referido contrato sob nº 099-B/03, sem prévia licitação, com base em sua inexigibilidade, enquadrada no artigo 22, II c/c artigo 13 da Lei 8666/93. Que, não obstante o caráter pessoal da contratação, com a autorização dos primeiro e segundo réus, foi celebrado posterior Termo Aditivo, autorizando o terceiro réu a terceirizar os serviços ao quarto réu, em verdadeira burla ao procedimento licitatório - já que inexistente o fundamento de fato que tornado inexigível a disputa - , fazendo, ainda, com que aquele escritório fosse remunerado pelos serviços contratados sem a respectiva contraprestação, o que caracterizaria o seu enriquecimento sem causa. Que a alteração do contrato se deu a partir de solicitação verbal, havendo verdadeira terceirização dos serviços, de forma ilegítima, tendo tal situação ilícita cessado somente em 2007, na atual gestão administrativa.

Notificados a apresentarem manifestação prévia, apresentou-se às fls. 31/34, ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA ELIEL DE MELLO & VASCONCELOS S/C, na qual sustenta que o próprio Tribunal de Contas do Estado recomendou a nomeação sem licitação, por fim, sustenta a ausência de ato de improbidade a autorizar a deflagração da demanda. Junta documentos às fls. 35/41.

ALUIZIO MEYER DE GOUVÊA COSTA se manifestou às fls. 44/66, na qual assevera que a decisão de se celebrar o termo aditivo em questão foi uma deliberação colegiada e não pessoal de determinado agente público e que as constatações colhidas no curso da execução do contrato indicaram que determinadas funções necessárias para o bom desempenho do contrato careciam de maior mobilização de advogados para a sua execução. Discorre sobre a distinção entre contrato de mandato e contrato de prestação de serviços, sustentando inexistir terceirização de serviços no caso mas, tão somente, substabelecimento de poderes. Destaca a inexistência de ato de improbidade, a inexistência de enriquecimento ilícito e ausência de conduta dolosa. Documentos às fls. 61.

SIDNEY ROBERTO SZABO se manifestou nos autos às fls. 91/107, na qual assevera que a decisão de se celebrar o termo aditivo em questão foi uma deliberação colegiada e não pessoal de determinado agente público e que as constatações colhidas no curso da execução do contrato indicaram que determinadas funções necessárias para o bom desempenho do contrato careciam de maior mobilização de advogados para a sua execução. Discorre sobre a distinção entre contrato de mandato e contrato de prestação de serviços, sustentando inexistir terceirização de serviços no caso mas, tão somente, substabelecimento de poderes. Destaca a inexistência de ato de improbidade, a inexistência de enriquecimento ilícito e ausência de conduta dolosa. Junta procuração às fls. 108.

Às fls. 125/137 apresentou defesa prévia SIQUEIRA CASTROS ADVOGADOS, na qual sustenta que apenas parte do acervo de processos a si repassados foi assumido pelo Escritório de Advocacia Eliel de Mello & Vasconcelos, tendo permanecido com a maior parte do acervo. Que tal decisão contou com a aprovação do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro. Discorre sobre a inexistência de enriquecimento sem causa, pugnando pelo não recebimento da inicial. Documentos às fls. 138/457.

A CEDAE se manifestou às fls. 457/466. Aduz não ter havido terceirização de serviço mas, tão somente, outorga de substabelecimento como forma a contar com a colaboração do quarto réu na realização das centenas de audiências que eram marcadas diariamente no âmbito da Justiça do Trabalho. Acrescenta que o trabalho intelectual em defesa dos interesses da CEDAE era todo planejado pela Siqueira Castro Advogados. Pugna pelo não recebimento da demanda.

Após, vieram-me os autos conclusos. É o relato do necessário. Decido.

Resta consignar, inicialmente, a adequação da utilização da ação civil pública para se buscar a reparação por ato de improbidade administrativa, questão já pacificada nos Tribunais Superiores, como se vê do aresto abaixo: ´AgRg no Ag 969454 / RJ AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 2007/0243568-7 Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI (1124) T1 - PRIMEIRA TURMA 12/08/2008 DJe 21/08/2008 PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. LITISCONSÓRCIO PASSIVONECESSÁRIO. CONFIGURAÇÃO DO ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 07/STJ. JULGAMENTO DA ADIN 2797. FORO PRIVILEGIADO DE EX-AGENTES PÚBLICOS. INEXISTÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.´ Resta pacificada na doutrina e na jurisprudência a legitimidade do Ministério Público para propor a presente demanda, ainda que para pleitear o ressarcimento ao erário, diante do que dispõe o artigo 129, III da Constituição da República, dispositivo que não comporta interpretação restritiva.

Quanto à instauração da relação processual, há justa causa a tanto, havendo indícios de que tenha havido burla ao artigo 25, II, da Lei 8666/93 com a suposta terceirização dos serviços contratados, fato que somente será elucidado com a instauração da relação processual e conseqüente instrução da causa, daí por que recebo a petição inicial em relação a todos os réus, medida absolutamente necessária para se delimitar a natureza do ato praticado e a responsabilidade de cada agente. Assim, somente após a instauração da relação processual, com o recebimento da exordial e mediante o devido contraditório, será delimitada e fixada a existência de ato de improbidade e, se for o caso, de responsabilidade individual de cada um dos réus em razão dos atos aqui impugnados.

Citem-se os réus, na forma do artigo 17, §9º, da Lei nº 8.429/92, nos mesmos endereços onde foram notificados. Dê-se ciência ao Ministério Público. P.I.

Ignorar requisições do MP caracteriza improbidade

Por Rodrigo Haidar

O agente público que deixa de responder sem justificativa e em tempo hábil a pedidos de informações feitos pelo Ministério Público comete ato de improbidade administrativa e deve ser processado por isso. A decisão unânime da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça autorizou o andamento de ação de improbidade contra a ex-diretora do Conselho de Recursos Ambientais (CRA) da Bahia, Maria Lúcia Cardoso de Souza.

De acordo com o relator do recurso, ministro Mauro Campbell Marques, o fato de a diretora ter deixado de responder a oito ofícios enviados pelo MP para instruir Ação Civil Pública, ao longo de três anos, "manifesta uma falta de razoabilidade sem tamanho", mesmo levando em consideração eventual falta de aparelhamento adequado das unidades administrativas naquele estado.

Consta do processo que o Ministério Público Federal requisitou informações da então diretora do CRA baiano, em julho de 2003, sobre o cumprimento de Plano de Recuperação da Área Degradada por parte da empresa Impacto-Indústria de Pedras e Artefatos de Cimento. A resposta foi dada mais de três anos depois do primeiro pedido de informações e somente após o Ministério Público Federal ter expedido outros sete ofícios reforçando o pedido.

Por conta da demora para obter a resposta, o MP entrou com ação de improbidade administrativa contra diretora. A defesa de Maria Lúcia alegou que não houve desídia de sua parte. De acordo com seus advogados, a demora deveu-se ao fato de a empresa sobre a qual foram solicitadas informações ficar a 350 quilômetros de Salvador, onde está sediado o Conselho de Recursos Ambientais. A defesa atribuiu a demora a essa circunstância e ao fato de o CRA ter uma estrutura aquém de suas necessidades.

Os argumentos da defesa foram acolhidos pelo Tribunal Regional da 1ª Região. Para o tribunal, a lentidão foi causada "mais por incompetência e por falta de estrutura funcional e menos por má-fé". Assim, não teria ficado caracterizado o dolo necessário para a configuração do ato de improbidade.

A decisão do TRF-1 que livrou a ex-diretora da ação, contudo, foi derrubada no recurso apresentado pelo Ministério Público ao Superior Tribunal de Justiça. Para o relator do recurso no STJ, ministro Mauro Campbell Marques, "o dolo é abstratamente caracterizável, uma vez que, pelo menos a partir do primeiro ofício de reiteração, a parte recorrida [a ex-diretora] já sabia estar em mora, e, além disto, já sabia que sua conduta omissiva estava impedindo a instrução de inquérito civil e a posterior propositura da Ação Civil Pública de contenção de lesão ambiental".

Em seu voto, o ministro ressaltou que os argumentos da defesa em relação à distância entre a empresa e o CRA e a falta de estrutura do órgão público são relevantes. Mas, para o relator, "em razão das peculiaridades do caso concreto, nenhum deles é suficiente para afastar o elemento subjetivo doloso presente nas condutas externadas".

De acordo com Mauro Campbell, não há o que justifique uma demora de mais de três anos para responder aos pedidos de informações do Ministério Público. "Não custa pontuar que, na seara ambiental, o aspecto temporal ganha contornos de maior importância, pois, como se sabe, a potencialidade das condutas lesivas aumenta com a submissão do meio ambiente aos agentes degradadores", registrou o ministro.

Na mesma decisão, os ministros da 2ª Turma fixaram que não se aplica a Súmula 7 do tribunal, que veda o reexame de provas, em questões de improbidade administrativa quando o acórdão do tribunal de segunda instância traz com detalhes suficientes os fatos do processo. "A prestação jurisdicional pelo Superior Tribunal de Justiça no que tange à caracterização do elemento subjetivo não é matéria que envolva a reapreciação do conjunto probatória e muito menos incursão na seara fática, tratando-se de mera qualificação jurídica dos mesmos — o que não encontra óbice na referida súmula", esclareceu o relator do processo.

Com a decisão, a ex-diretora do CRA da Bahia responderá, em primeira instância, a ação por improbidade administrativa.

Resp 1.116.964

Servidor aprovado em novo concurso não aproveita vantagens do cargo anterior

Aprovado em novo concurso para assumir o cargo de oficial de justiça, o servidor queria ser empossado no final da carreira, padrão no qual se encontrava no cargo anterior. Ele argumentou que teria direito a esse benefício porque as carreiras eram idênticas.

O relator do recurso em mandado de segurança, ministro Mauro Campbell Marques, ressaltou que a Lei n. 9.421/1996, vigente na época dos fatos, criou três carreiras distintas, cada uma com cargos sistematicamente separados e regulamentados de acordo com as especificidades de funções e atribuições.

A referida lei determinou que o ingresso nas carreiras judiciárias, conforme a área de atividade ou a especialidade, ocorre por concurso público, no primeiro padrão de classe “A” do respectivo cargo. “Concurso público é forma de provimento originário, não aproveitando ao aprovado, via de regra, quaisquer status ou vantagens relativas a outro cargo eventualmente ocupado”, afirmou o relator.

Todos os ministros da Turma seguiram o voto do relator e negaram provimento ao recurso do servidor.

Para combater a dengue, agentes de saúde do DF podem entrar em residência sem autorização do proprietário

Nos imóveis abandonados, desocupados ou fechados, os agentes públicos deverão ingressar com duas testemunhas, que assinarão um termo atestando a ausência do morador.

De acordo com a decisão da 7ª Vara da Fazenda Pública do Distrito Federal, a Constituição garante o direito à saúde e obriga o Estado a cumpri-lo por meio de políticas públicas de combate a doenças endêmicas, como a dengue.

O último balanço da Secretaria de Saúde do Distrito Federal aponta que, no período de 1º de janeiro a 16 de março deste ano, foram notificados 1.336 casos suspeitos de dengue. Do total, 248 foram confirmados, 340 descartados e 748 permanecem em investigação. A primeira morte por dengue no DF foi confirmada ontem (21).

No Brasil, nos dois primeiros meses do ano, foram confirmadas 51 mortes em decorrência da doença. As mortes confirmadas ocorreram no Acre, Amazonas, Pará, Maranhão, Ceará, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Paraná, em Pernambuco, Alagoas, Minas Gerais, São Paulo, Mato Grosso, Goiás e na Bahia.

Agência Brasil

UFRJ responde por não pagamento de terceirizados

Por não fiscalizar o cumprimento das obrigações trabalhistas do contrato de terceirização com a Cooperativa Kem Te Serve, a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) foi responsabilizada subsidiariamente pela Justiça do Trabalho pelas dívidas trabalhistas não pagas pela cooperativa. A 1ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho negou provimento a agravo regimental da UFRJ e manteve decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) nesse sentido.

O ministro Vieira de Mello Filho, relator do recurso da UFRJ na 1ª Turma, observou que o STF, ao analisar a constitucionalidade do artigo 71 da Lei 8.666/93 (Lei das Licitações), que trata da responsabilidade do contratado pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato, decidiu pela responsabilidade da Administração Pública pelos encargos trabalhistas devidos quando da prestação de serviço terceirizado. Mas o Supremo ressaltou que, nos casos em que ficar demonstrada a culpa in vigilando da entidade, ou seja, quando ela deixa de fiscalizar uma atividade própria ou de terceiro com a cautela necessária, torna-se viável a sua responsabilização pelos encargos devidos ao trabalhador.

Vieira de Melo ressaltou que a culpa in vigilando se refere à postura passiva da Administração Pública, que deixa de exigir do prestador dos serviços o cumprimento das obrigações trabalhistas e não aplica, em caso de renitência, as sanções previstas na Lei de Licitações — entre elas a rescisão contratual.

Para o TRT-RJ, o reconhecimento da responsabilidade subsidiária da Universidade está de acordo com o inciso IV da Súmula nº 331 do TST, que trata da responsabilidade subsidiária do tomador de serviço terceirizado. Com o contrato, a Universidade estaria obrigada a fiscalizar a prestação de serviços da cooperativa. E, quando esta deixa de cumprir suas obrigações trabalhistas, fica evidenciado que a falta de fiscalização causou prejuízo a terceiros.

A UFRJ, no Recurso de Revista ao TST, argumentou não haver suporte legal para a responsabilidade subsidiária no caso, pois não poderia arcar com o ônus do não pagamento das obrigações trabalhistas dos empregados. Apontou violação de vários artigos da Constituição, inclusive o que determina a necessidade de concurso público para a contratação no Serviço Público. Com informações da Assessoria de Imprensa do TST.

AIRR - 1233-34.2010.5.01.0000

Aprovação de contas de campanha não é condição para quitação eleitoral

O Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) conservou, por maioria dos votos (4x3), jurisprudência da Corte no sentido de que a mera apresentação de contas, ainda que desaprovada, é suficiente para quitação eleitoral. A manutenção desse entendimento ocorreu no julgamento de recurso especial eleitoral interposto pela Coligação Mato Grosso Para Todos (PCdoB/PRB/PTN/PSC/PTC/PHS/PRP) contra a Coligação Mato Grosso Melhor Para Você (PSB/PPS/PDT/PV).
A autora questionava o registro de candidatura de Mauro Mendes Ferreira ao governo do estado do Mato Grosso nas eleições de 2010, ao argumento de ausência de quitação eleitoral por desaprovação das contas eleitorais da campanha dele para prefeito do município de Cuiabá (MT), no ano de 2008. 
O relator do processo, ministro Marco Aurélio, votou no sentido de prover o recurso e indeferir o registro questionado. Para ele, é necessário que as contas de campanha sejam aprovadas e não apenas haja uma simples apresentação para que ocorra a quitação eleitoral. Ele foi seguido pelos ministros Nancy Andrighi e Ricardo Lewandowski, os quais ficaram vencidos.
Abriu divergência desse entendimento o ministro Dias Toffoli. Ele negou provimento ao recurso na linha do precedente da Corte (Respe 442363) que recentemente, no dia 28 de setembro de 2010, assentou que a desaprovação das contas não gera óbice a quitação eleitoral, mas sim a ausência da prestação de contas. Dessa forma, mesmo que a conta seja apresentada, porém rejeitada, não há impedimento ao registro de candidatura.
Acompanharam o voto divergente, formando a maioria, os ministros Aldir Passarinho Júnior, Marcelo Ribeiro e Arnaldo Versiani.
EC/LF
Processo relacionado: Respe 153163

Suspensa análise de consulta sobre norma aplicável à propaganda eleitoral nos municípios

O ministro Marcelo Ribeiro, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), pediu vista de consulta formulada pelo deputado federal Gilmar Machado (PT-MG) sobre leis que regem as eleições federais e estaduais, sobretudo no que se refere à propaganda eleitoral.
O deputado quer saber se “em se tratando de eleições federais e estaduais prevalece legislação municipal mais restrita, no que pertine a veiculação de propaganda eleitoral, sobre legislação federal? Em caso negativo, os candidatos serão regidos exclusivamente pelas leis federais vigente, bem como pelas resoluções deste douto tribunal?”
O relator, ministro Marco Aurélio, respondeu no sentido de que a legislação federal prevalece sobre a legislação municipal. “Se de um lado há a legislação municipal, de outro há a regência federal das eleições. Revelado o conflito, prevalece a legislação federal no que regula a propaganda eleitoral. Esse enfoque é o que mais coaduna com a necessidade de se compatibilizar as legislações”, afirmou.
O ministro Dias Toffoli concordou com o relator e afirmou que, de início, prevalece a legislação federal, e a legislação municipal deverá ser examinada em processo próprio. No entanto, o ministro Marcelo Ribeiro declarou haver divergências na matéria. Salientou que, no caso, o TSE “já avançou e recuou no tempo”, e pediu vista.
Base legal

De acordo com o artigo 23, inciso XII, do Código Eleitoral, cabe ao TSE responder às consultas sobre matéria eleitoral, feitas em tese por autoridade com jurisdição federal ou órgão nacional de partido político. A consulta não tem caráter vinculante, mas pode servir de suporte para as razões do julgador.
BB/LF
Processo relacionado: Cta 148580

STF deve julgar se ISS deve ser pago seguindo lei municipal ou lei federal

Compete ao Supremo Tribunal Federal (STF) julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida julgar válida lei local contestada em face de lei federal. Foi o que decidiu a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O recurso discute se uma sociedade de médicos deve pagar o Imposto sobre Serviços (ISS) seguindo lei do município de Assis (SP) ou lei federal.
A Unidade de Nefrologia de Assis S/C alega que o recolhimento do ISS, referente aos exercícios de 2001 a 2004, deve ser como previsto artigo 9º, parágrafo 1º, do Decreto-Lei n. 406/1968. Segundo a norma, a base de cálculo do imposto é o preço do serviço. “Quando se tratar de prestação de serviços sob a forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, o imposto será calculado, por meio de alíquotas fixas ou variáveis, em função da natureza do serviço ou de outros fatores pertinentes, nestes não compreendida a importância paga a título de remuneração do próprio trabalho".
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) entendeu que, a partir de 2004, as sociedades prestadoras de serviços de saúde, assistência médica ou similares só podem ser tributadas por meio da alíquota de 3,5% sobre seu faturamento, tendo em vista que tal regra é estabelecida na Lei municipal n. 2/2003, não havendo em tal legislação autorização para que o ISS incida sobre "valor fixo e periódico", não sendo possível a aplicação do artigo referido do Decreto-Lei n. 406/68.
O relator, ministro Mauro Campbell Marques, destacou que o principal pedido do recurso é a repetição dos valores pagos a mais do ISS no período compreendido entre os meses de janeiro de 2001 e maio de 2004, dado o suposto direito de a recorrente, por ser sociedade simples uniprofissional, recolher o tributo por quota fixa anual.
O ministro reiterou que a alíquota fixa do ISS somente é devida às sociedades unipessoais integradas por profissionais que atuam com responsabilidade pessoal, não alcançando as sociedades empresariais, como as sociedades por quotas, cuja responsabilidade é limitada ao capital social.
E, apesar de o assunto ser da competência do STF, em seu voto, o relator concluiu que é necessária a comprovação de que não houve repasse do referido encargo e que, o exame dos autos, ainda que superficial, evidencia que não houve tal comprovação, de modo que a repetição pleiteada não é possível. Por unanimidade, os ministros não conheceram o recurso especial.

Resp 1221027

Vale-transporte pago em dinheiro é isento de contribuição previdenciária

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que não incide contribuição previdenciária sobre vale-transporte pago em dinheiro. A decisão unifica a jurisprudência da Corte e segue orientação do Supremo Tribunal Federal (STF).
A nova posição foi firmada no julgamento de embargos de divergência de autoria do Banco Bradesco S/A contra acórdão da Primeira Turma do STJ, favorável ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Até então, havia decisões no Tribunal que reconheciam a incidência da contribuição previdenciária sobre o benefício do vale-transporte quando pago em dinheiro.
O fundamento estava no Decreto n. 95.247/1987, que proibiu expressamente o empregador de efetuar esse pagamento em pecúnia. Quando isso ocorria, os ministros do STJ entendiam que a verba deixava de ter o caráter indenizatória e passava a incluir o salário de contrubuição.
Contudo, no julgamento de um caso análogo, o STF reconheceu a inconstitucionalidade da contribuição previdenciária sobre o vale-transporte pago em dinheiro por entender que independentemente da forma de pagamento, o benefício tem natureza indenizatória.
A orientação do STF já vinha sendo aplicada pelos ministros do STJ e a decisão proferida pela Primeira Seção atualiza e unifica a jurisprudência.

Eresp 816829

Verba indenizatória não é incorporada ao salário

Um ex-empregado da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), cujo salário era composto por mais de 50% de diárias de viagens, não conseguiu integrar os valores ao salário. A 6ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (Paraná) por entender que, no caso, a verba não tinha natureza salarial, mas sim indenizatória.

Apesar de a Súmula 101 do TST, dispor em contrário, o TRT-PR lembra que os valores recebidos a títulos de diárias eram para pagamento de despesas com hospedagem e alimentação em suas viagens a serviço, como revelou o depoimento do trabalhador.

O relator do caso, ministro Mauricio Godinho Delgado, rejeitou o recurso do trabalhador de que a decisão violaria o artigo 457, parágrafos 1º e 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho. O dispositivo define como salário as diárias superiores a 50%, como apresentado no caso.

“Na hipótese, a partir do depoimento do empregado, está evidenciado que tais diárias, apesar de elevadas, correspondem a efetivas despesas de viagens, sem caráter retributivo“, afirmou. Uma decisão diversa só poderia ser possível como reexame dos fatos e das provas, mas a prática é vedada pela Súmula 126 do TST. Com informações da Assessoria de Comunicação do TST.

RR: 1060900-42.2006.5.09.0002

quinta-feira, 24 de março de 2011

Lei sobre tráfego urbano paulistana é declarada inconstitucional

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) declarou na tarde de hoje (17) a inconstitucionalidade da Lei 10.884, de 2001, do Estado de São Paulo. A lei estabelecia a obrigatoriedade de reserva de espaço para o tráfego de motocicletas nas vias públicas de grande circulação da região metropolitana de São Paulo e impunha ao Poder Executivo a regulamentação da medida. No julgamento, os ministros entenderam que a lei questionada invade a competência da União para legislar sobre trânsito e transporte.

A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3121) foi proposta pelo governador do Estado de São Paulo com o argumento de que a organização do tráfego urbano é assunto de interesse local e, por isso, se o poder Executivo estadual cumprisse a lei questionada, estaria violando a autonomia dos municípios. Cita que, de acordo com o artigo 30, inciso I, da Constituição Federal, os municípios têm competência para “legislar sobre assuntos de interesse local”.

Segundo o relator, ministro Joaquim Barbosa, a lei trata da reserva de espaço para motocicletas em vias públicas de grande circulação “tema, evidentemente, afeto a trânsito”. O ministro ressaltou em seu voto que é firme a jurisprudência do STF no sentido de “reconhecer a inconstitucionalidade formal de normas estaduais que tratam sobre trânsito e transporte”. O ministro foi acompanhado, por unanimidade, no sentido de declarar a inconstitucionalidade da lei e julgar procedente a ação movida pelo governo do estado de São Paulo.

Liminar concedida à Eletropaulo suspende decisão que determinou redução de campos eletromagnéticos

A Eletropaulo obteve, no Supremo Tribunal Federal (STF), concessão de liminar na Ação Cautelar (AC) 2733 e, com isso, fica suspensa decisão da Justiça paulista que determinou a redução do campo eletromagnético em linhas de transmissão de energia elétrica em bairros da capital. Por considerar que a implementação do que decidido traria elevadíssimos custos econômico-financeiros, o relator do caso, ministro Dias Toffoli, atribuiu efeito suspensivo a um Recurso Extraordinário (RE 627189) até que o Supremo analise o mérito da questão.

Na instância de origem, foram duas ações contra a Eletropaulo, movidas pelas Sociedades Amigos do Bairro City Boaçava e Amigos do Alto de Pinheiros, para obrigar a empresa a aplicar o limite adotado pela legislação suíça para as cargas dos campos eletromagnéticos na linha de transmissão Pirituba-Bandeirantes, instalada em 1931 na Região Oeste da capital paulista.

A decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo obrigou a Eletropaulo a reduzir, em até seis meses, o campo magnético em toda a região mencionada a um micro tesla, a uma altura de 1,5 m do solo. A sentença fixou, ainda, multa diária de R$ 500 mil em caso de descumprimento da determinação.

Deferimento

Para o relator, há evidente perigo na demora, na medida em que a obra a ser realizada é orçada em milhões de reais. “Sendo certo que os requeridos não possuem patrimônio ou fontes de recursos próprios capazes de caucionarem eventual prejuízo advindo da implementação dessas obras, com ulterior reversão judicial do acórdão prolatado na origem”, completou.

O ministro Dias Toffoli preferiu não se pronunciar em outros aspectos para não antecipar o debate do próprio mérito do RE, oportunidade em que, conforme o relator, o Plenário poderá apreciar teses relevantes das partes. Para ele, “o que importa é a relevância de imprimir a ação paralisante da tutela cautelar como gostava de referir Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, às situações jurídicas envolvidas”. Isto porque, segundo Toffoli, não se espera demora no julgamento do RE, o que já elimina “qualquer preocupação com a extensão ad infinitum de uma controvérsia que possui importantes externalidades no campo ambiental”.

De acordo com o ministro, em situações excepcionais como o presente caso parece ser, “o STF tem conferido eficácia suspensiva ao RE admitido ou cuja admissibilidade foi objeto de apreciação reflexa no agravo de instrumento e, por assim, haja sido instaurada a jurisdição da Corte”. “Assim, em certos casos a dotação de eficácia suspensiva ao recurso é medida de boa prudência e que se coaduna com a instrumentalidade do processo”, afirmou o relator, ao citar as Ações Cautelares nº 1890, 2181 e 2070.

O ministro Dias Toffoli salientou que sua decisão de conceder a liminar busca “conferir primazia à essência da medida cautelar”, que é a preservação de situações jurídicas enquanto não se forma uma definição sobre a titularidade dos direitos sustentados. “O indeferimento da medida levaria à eventual inutilidade do recurso. Convém conservá-lo útil até que seja apreciado por este Pretório, a tempo e modo”, concluiu.

Decisão judicial que ignora regra expressa em edital de concurso afronta a ordem administrativa

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve suspensa decisão judicial que determinou a integração na carreira militar de candidatos reprovados no curso de formação. A aprovação no curso era exigência prevista no edital – a lei do concurso público. Para os ministros, decisão que ignora regra expressa em edital afronta a ordem administrativa.
Os ministros da Corte Especial negaram agravo regimental (recurso) contra decisão do ministro Ari Pargendler, presidente do STJ, que suspendeu parcialmente a segurança concedida aos candidatos. Pargendler cassou a segurança que beneficiava 23 candidatos não aprovados no curso de formação, mas manteve a ordem a favor de dois recorrentes que foram aprovados.
O concurso era para Policial Militar do Estado do Ceará, composto por três fases. A última delas era o curso de formação, de caráter classificatório e eliminatório, do qual só poderiam participar os aprovados nas duas fases anteriores e classificados dentro do número de vagas ofertadas. Esse curso previa provas de aptidão física, avaliação psicológica, investigação social e prova objetiva.
Segundo o argumento do Estado do Ceará, ainda que os candidatos tenham ingressado no curso de formação por força de decisão judicial, a investidura no cargo depende de aprovação no curso, o que não ocorreu com todos os beneficiados pela segurança contestada.
O ministro Pargendler suspendeu em parte a segurança por entender que estavam presentes os riscos de grave lesão à ordem, à segurança e à economia públicas. Quanto aos dois candidatos aprovados, o ministro explicou que a eventual posse de candidato aprovado no curso de formação por força de medida liminar – decisão precária e provisória – não causa lesão à ordem pública.
SS 2439

Lei da Ficha Limpa só pode ser aplicada em 2012

Por Rodrigo Haidar

Em uma sessão bem mais breve e sem a exaltação demonstrada pelos ministros nas sessões anteriores, o Supremo Tribunal Federal decidiu nesta quarta-feira (23/3), por seis votos a cinco, que a Lei Complementar 135/10, conhecida como Lei da Ficha Limpa, não poderia ter sido aplicada em 2010 como decidiu o Tribunal Superior Eleitoral no ano passado.

A discussão se restringiu à proibição constitucional de uma lei que altere o processo eleitoral ser aplicada antes de um ano de entrar em vigor. A maioria dos ministros decidiu que ao estabelecer novos critérios de inelegibilidades a lei interferiu claramente no processo eleitoral e, assim, feriu o artigo 16 da Constituição Federal. De acordo com a norma, “a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência”.

Os ministros não chegaram a discutir se candidatos condenados por órgãos colegiados da Justiça antes da lei entrar em vigor podem ser atingidos por ela. Essa discussão ainda renderá bons debates, mas só às portas das eleições de 2012, quando a lei, então, estará em pleno vigor.

Como foi reconhecida a repercussão geral do recurso julgado nesta quarta, os efeitos da decisão serão estendidos para todos os candidatos que tiveram o registro indeferido pela Justiça com base nas regras da Lei da Ficha Limpa. Só no STF, há 30 recursos contra decisões do TSE que barraram candidatos chamados “ficha-suja”. Para se beneficiar da decisão, basta que os candidatos peçam a extensão dos efeitos da decisão. O plenário autorizou os ministros a decidir monocraticamente os pedidos.

O caso em julgamento foi o do candidato Leonídio Bouças (PMDB), que, no ano passado, disputou uma vaga de deputado estadual para a Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Bouças foi barrado por ter sido condenado por improbidade administrativa, sob acusação de usar a máquina pública em favor de sua candidatura ao Legislativo mineiro nas eleições de 2002, quando era secretário municipal de Uberlândia. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais suspendeu seus direitos políticos por seis anos e oito meses. Com a decisão, ele será empossado porque obteve votos suficientes.

Na sessão, chegaram a se ensaiar alguns debates, mas nada parecido com os julgamentos do ano passado. A certa altura, o ministro Ayres Britto disse que Bouças havia sido condenado em todas as instâncias anteriores ao Supremo. Ao que Gilmar Mendes respondeu: “É isso que chamo de teoria futebolística. Somam-se três ou quatro decisões e aí a Corte Suprema não atua”. Mas as discussões não seguiram em frente.

O voto decisivo para definir a questão foi o do ministro Luiz Fux, 20 dias depois de sua posse no Supremo. “Não resta a menor dúvida que a criação de novas inelegibilidades em ano da eleição inaugura regra nova no processo eleitoral”, afirmou o ministro.

Fux começou o voto afirmando que a Lei da Ficha Limpa “é um dos mais belos espetáculos democráticos” que já assistiu. “Dos políticos espera-se moralidade no pensar e no atuar. Isso gerou um grito popular pela Lei da Ficha Limpa”. Como os advogados bem sabem, quando suas sustentações orais são muito elogiadas pelo juiz, geralmente é porque ele votará contra seu processo. Foi exatamente o que aconteceu.

O ministro ressaltou que o intuito de estabelecer a moralidade que vem com a lei é de todo louvável. “Mas estamos diante de uma questão técnica e jurídica, que é saber se a criação de critérios de inelegibilidade em ano de eleições viola o artigo 16 da Constituição Federal”. Para Fux, não há dúvidas que a nova lei alterou o processo eleitoral, quando a Constituição proíbe isso.

Luiz Fux afirmou que o princípio da anterioridade eleitoral representa a garantia do devido processo legal e a igualdade de chances. E, citando o voto do ministro Gilmar Mendes, o que fez em diversas passagens, disse que a carência de um ano para a aplicação de lei que altera o processo eleitoral é uma garantia constitucional das minorias, que não podem ser surpreendidas com mudanças feitas pela maioria. “Tem como escopo evitar surpresas no ano da eleição”, disse.

Para o ministro Luiz Fux, o processo eleitoral a que se refere a Constituição é a dinâmica das eleições, desde a escolha dos candidatos: “Processo eleitoral é tudo quanto se passa em ano de eleição”. Fux ainda disse que a iniciativa popular é sempre salutar, mas tem de ter consonância com a Constituição. “Surpresa e segurança jurídica não combinam”, afirmou. E, neste caso, de acordo com o ministro, deve prevalecer sempre a segurança jurídica para que as pessoas possam “fixar suas metas e objetivos e de formular um plano individual de vida”.

De acordo com o ministro, os candidatos foram surpreendidos por regras que não poderiam ter sido aplicadas no mesmo ano da eleição porque implica em desigualdade nas regras do jogo. “A Lei da Ficha Limpa é a lei do futuro”, disse. E completou: “É aspiração legítima da nação brasileira, mas não pode ser um desejo saciado no presente” porque isso fere a Constituição Federal.

Tribunal contramajoritário

Antes do ministro Luiz Fux, Gilmar Mendes, relator do recurso em discussão, também votou contra a aplicação imediata da Lei da Ficha Limpa. O ministro disse que a missão do STF é aplicar a Constituição Federal, ainda que seja contra a opinião da maioria.

Gilmar Mendes fez um estudo da jurisprudência do Supremo. O ministro lembrou que quando o STF decidiu pela aplicação imediata da Lei Complementar 64/90, que instituiu um sistema de inelegibilidades novo, o quadro institucional do país era diferente. A recém-promulgada Constituição de 1988 requeria um sistema de inelegibilidades que não existia, por isso não se enquadrou no princípio do artigo 16 da Constituição.

No caso da Lei da Ficha Limpa, de acordo com Gilmar Mendes, ela alterou regras que já existiam. Logo, deveria se submeter ao prazo de carência de um ano. Como foi publicada em 7 de junho de 2010, só poderia valer de fato a partir de 7 de junho de 2011. Na prática, só se aplicaria aos candidatos a partir das eleições municipais de 2012.

“A tentativa de aplicar o precedente ao tema atual levaria a conclusão diametralmente oposta”, afirmou Gilmar Mendes. O ministro fez uma analogia com o princípio da anterioridade tributária. O contribuinte não pode ser cobrado no futuro por um imposto que não existia no passado. Da mesma forma, o candidato não pode ser penalizado por regras que não existiam quando decidiu se candidatar.

O ministro voltou a classificar a lei como casuística e disse que “não se pode distinguir casuísmos bons e casuísmos ruins”. E completou, citando Machado de Assis: “A melhor forma de apreciar o chicote é ter o cabo nas mãos. Mas o chicote muda de mãos”. Para o ministro, o "processo eleitoral não começa com as convenções. E até as pedras sabem disso". A fase pré-eleitoral começa em outubro do ano anterior, com a obrigação da filiação partidária.

E, apesar de estar bem mais calmo do que nos julgamentos anteriores, não deixou de alfinetar os defensores da lei: “Para temas complexos há sempre uma solução simples. E, em geral, errada”. Para Gilmar, “a Lei da Ficha Limpa tem uma conotação que talvez tenha escapado a muitos ditadores”.

Posições firmes
O ponto nevrálgico da discussão foi, mais uma vez, sobre se a lei se submeteria ou não ao chamado princípio da anterioridade previsto no artigo 16 da Constituição Federal. Os rachas anteriores entre os ministros se deram exatamente pelas diferenças entre o conceito do que é processo eleitoral.

Os ministros mantiveram suas posições. Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e Cezar Peluso, como Luiz Fux, reforçaram que a lei deveria respeitar o princípio da anterioridade eleitoral. Outros cinco ministros — Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa, Ayres Britto e Ellen Gracie — entendem que sua aplicação é imediata porque novas hipóteses de inelegibilidade não alteram o processo eleitoral. Logo, não teriam de cumprir o prazo de carência de um ano previsto na Constituição Federal.

Para os ministros que defenderam a aplicação imediata da lei, só tem poder de interferir no processo eleitoral uma regra que desequilibra ou deforma a disputa. Como a Lei da Ficha Limpa é linear, ou seja, se aplica para todos indistintamente, não se pode afirmar que ela interfere no processo eleitoral. Logo, sua aplicação é imediata. O argumento foi reforçado pelo ministro Ricardo Lewandowski, que é presidente do TSE.

Os que sustentaram – e venceram o julgamento – a que a lei tinha que obedecer ao prazo fixado no artigo 16 da Constituição Federal, fizeram com o argumento de que não há interferência maior no processo eleitoral do que estabelecer novas regras que criem restrições para que um cidadão se candidate.

“Ninguém em sã consciência pode afirmar que a Lei Complementar 135 não altera o processo eleitoral”, afirmou o ministro Marco Aurélio em julgamentos anteriores. Nesta quarta, disse que “a primeira condição da segurança jurídica é, sem dúvida nenhuma, a irretroatividade das leis”. O ministro também disse que o tribunal não tem culpa pelo fato de o Congresso Nacional ter aprovado a lei em ano eleitoral.

Os ministros discordaram até de quando se inicia o processo eleitoral. Para a maior parte do time pró-aplicação imediata da lei, o processo se inicia com as convenções partidárias, que pela Lei Eleitoral devem ser realizadas entre 10 e 30 de junho, e com os registros de candidatura, que devem ser feitos até as 19h do dia 5 de julho.

Para a outra metade do Supremo, o processo eleitoral começa um ano antes das eleições, com o fim do prazo para as filiações partidárias. Se para concorrer o candidato tem de estar filiado ao partido um ano antes das eleições, é nesta data que começa o processo rumo ao próximo pleito.

Decisão final
A decisão encerra o impasse a que os ministros chegaram nos dois julgamentos do ano passado. Em 27 de outubro do ano passado, o STF tinha decidido que a Lei da Ficha Limpa tinha aplicação imediata e gerava efeitos sobre os pedidos de registro de candidaturas de políticos que renunciaram ao mandato para escapar da cassação, mesmo antes de as novas regras de inelegibilidade entrarem em vigor.

Os ministros julgavam recurso de Jader Barbalho (PMDB-PA), que disputou uma vaga no Senado pelo Pará, contra decisão do Tribunal Superior Eleitoral que rejeitou o registro de sua candidatura. Barbalho foi barrado por ter renunciado ao mandato de deputado, em 2001, para escapar da cassação por acusação de improbidade.

Para chegar à decisão, contudo, foi usado um critério de desempate incomum em favor da aplicação da lei porque o tribunal precisava dar uma resposta à situação de indefinição às vésperas das eleições. Um mês antes, ao julgar recurso do ex-candidato ao governo do Distrito Federal, Joaquim Roriz (PSC), o empate em cinco votos a favor da aplicação imediata da lei e cinco contra deixou a questão aberta, depois de 11 horas de discussões.

A decisão do Supremo tomada nesta quarta-feira, com o voto de Luiz Fux, mudará o quadro dos eleitos em 2010. Além de mudar os eleitos para a Câmara, devido ao recálculo do quociente eleitoral, os efeitos da decisão serão marcantes no Senado Federal. Jader Barbalho, Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) e João Capiberibe (PSB-AP) tiveram votos suficientes para se eleger, mas foram barrados devido à nova lei. Com a decisão, deverão tomar posse. O caso de Jader pode gerar mais discussões pelo fato de já ter sido julgado pelo Supremo, mas sua defesa irá requerer a aplicação da decisão para o seu caso.

RE 633.703

Mineradoras sem licença não serão indenizadas por construção de hidrelétrica

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou improcedente ação de indenização movida por duas mineradoras que tiveram as atividades interrompidas pela formação do lago da Usina Hidrelétrica do Lajeado, em Tocantins. Os ministros entenderam que a falta de licença do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) para extração de seixo e areia caracteriza a atividade como ilegal, o que afasta a indenização.
A ação de reparação de danos ajuizada pelas empresas contra os concessionários responsáveis pela construção da hidrelétrica havia sido julgada improcedente em primeira instância. O juízo considerou que atividade ilegal não pode gerar indenização. O Tribunal de Justiça de Tocantins (TJTO), entretanto, entendeu que o Plano Básico Ambiental prevê a reparação daqueles que exercem atividades econômicas formal ou informalmente e aceitou, por maioria, a apelação das mineradoras.
No recurso especial, o consórcio alegou que, sem a licença do DNPM, indispensável para o exercício legal da exploração de recursos minerais, inexiste o dever de indenizar pela interrupção das atividades.
O relator, ministro Luis Felipe Salomão, considerou que, para a realização da extração de areia e seixo, cujo aproveitamento é submetido à administração da União, é necessário, antes do início de qualquer atividade, obter licença ou autorização concedida pelo DNPM, permitindo a exploração mineral.
“Nesse passo, se a exploração mineral só é permitida a partir do momento em que outorgada a permissão de exploração, o que somente é cabível em caso de obtenção da licença ambiental, a atividade de extração realizada antes da obtenção da referida permissão, ainda que tenha sido protocolado o pedido junto ao DNPM, é atividade clandestina”, acrescentou o ministro.
O ministro Salomão salientou que a necessidade de autorizações deve-se não só ao fato de os recursos minerais serem parte do patrimônio da União, mas principalmente em função dos impactos ambientais significativos decorrentes da exploração. “Logo, a falta de autorização do DNPM para a realização da atividade de extração mineral não constitui mera irregularidade, mas ilicitude passível de sanções administrativas e penais”.
Ao considerar ilícitas as atividades promovidas pelas mineradoras, a Turma restabeleceu a sentença de primeiro grau, que havia julgado improcedente o pedido de indenização.

REsp 1188683

Governo perde R$ 2,1 bilhões para a corrupção

A Advocacia Geral da União (AGU) recuperou R$ 287,7 milhões em recursos desviados por corrupção no governo no primeiro semestre deste ano, segundo levantamento divulgado pelo órgão.  Ao todo, a AGU monitora 2,3 mil processos dessa natureza, que envolvem mais de R$ 2,1 bilhões em verbas desviadas dos cofres públicos. Embora o resgate represente apenas 13% do total, a expectativa é chegar a R$ 400 milhões neste ano, uma alta de 35% sobre o ressarcimento conseguido em 2009 – R$ 297,5 milhões. A projeção, feita ao jornal Brasil Econômico, é do diretor do Departamento de Patrimônio Público e Probidade Administrativa da AGU, André Luiz Mendonça.

Segundo o especialista, a maior parte dos recursos desviados provém de convênios firmados entre a União e as prefeituras. De um total de 3,5 mil funcionários públicos federais envolvidos nos crimes, 1,1 mil são prefeitos e ex-prefeitos. A segunda categoria do ranking é de servidores (478), ao lado de funcionários de empresas públicas (474). Atrás, aparecem colaboradores particulares – temporários, cargos de confiança – (294) e diretores e presidentes de instituições públicas (261).

“Convênios de saúde e educação são os mais recorrentes nesse quadro. São valores pequenos, mas que envolvem um grande número de ocorrências, o que torna o volume final muito elevado”, afirma Mendonça, embora não revele a quantia exata.

Para o cientista político e consultor de políticas públicas, Rudá Ricci, a própria gestão orçamentária do governo alimenta o desvio de verba pública. “No Brasil, é tradição liberar recursos voltados às áreas sociais nos últimos três meses do ano, quando é atingida a meta de superávit primário (economia para pagamento da dívida pública)”, explica. Desta forma, os estados e municípios recebem a maior parte da verba empenhada quando têm pouco tempo para investir. “Aí vira uma festa. Por que devolver o dinheiro que não dá tempo de gastar para a União?”, ironiza.

Prefeituras do Paraná descumprem Lei da Transparência

Desde 2009, a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios com mais de 100 mil habitantes estão obrigados a divulgar na Internet, em tempo real, informações detalhadas sobre as contas públicas. No Paraná, no entanto, das 18 prefeituras sujeitas à legislação, cinco não obedecem, a rigor, o que manda a Lei Complementar 131, também conhecida como Lei da Transparência, ou Lei Capiberibe.

Londrina, Umuarama, Guarapuava, Almirante Tamandaré e Pinhais disponibilizam apenas relatórios simplificados da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) sobre a execução orçamentária e financeira à população. Segundo apurou o jornal local Gazeta do Povo, estas cidades apresentam documentos onde são registrados somente os valores, vinculados às secretarias ou aos órgãos responsáveis pelo pagamento ou recebimento dos recursos.

Apesar de a legislação ser clara quanto à atualização em tempo real, muitas prefeituras não alimentam os portais de transparência diariamente. Além disso, há sites com conteúdo estático e que não possibilitam identificar, por exemplo, onde foram empregados os recursos ou quais foram os beneficiários.

Os órgãos e administrações públicas que não se adequarem a normatização podem ter suspensas as transferências voluntárias da União. A responsabilidade pela fiscalização é da Secretaria do Tesouro Nacional (STN). Segundo o jornal Gazeta do Povo, que analisou os portais de transparência do estado, outros 13 municípios com população superior a 50 mil habitantes têm até maio para se adaptar às exigências e passar a divulgar na Internet, em tempo real, as receitas e despesas orçamentárias de forma pormenorizada.

Isso porque, para municípios com população entre 50 e 100 mil habitantes, o prazo para o enquadramento na lei é de dois anos, a partir da data da publicação da lei, sancionada em maio de 2009 pelo então presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva. Já para municípios com até 50 mil habitantes, o prazo para providenciar a publicação das informações definidas na lei é de quatro anos. A lei se aplica a todos os Poderes e a todas as entidades da administração direta, às autarquias, às fundações, aos fundos e às empresas estatais dependentes.

quarta-feira, 23 de março de 2011

O debate em torno do controle da motivação da lei

Por Saul Tourinho Leal

O Supremo Tribunal Federal (STF) tem como o primeiro item da pauta desta quarta-feira, dia 23 de março, o RE 633.703/MG, de relatoria do ministro Gilmar Mendes, que traz de volta ao Plenário outro aspecto da Lei Complementar 135/2010, a Lei da Ficha Limpa. Dessa vez, o primeiro ponto da discussão é a aplicabilidade da Lei às eleições de 2010, em razão do artigo 16 da Constituição Federal dispor que a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência.

Trata-se de mais um round dessa disputa que chamou a atenção de todo o país. Por enquanto, num resultado conturbado e de certa forma enigmático, o que está valendo é que a Lei da Ficha Limpa tem aplicação imediata.

Outro aspecto que deve ser retomado, agora com a nomeação do ministro Luiz Fux, uma vez que a Corte conta com quorum completo, trata da rejeição dos pedidos de registro de candidatura de políticos que renunciaram ao mandato para escapar da cassação, mesmo antes de as novas regras de inelegibilidade entrarem em vigor.

O STF manteve a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que rejeitou o registro da candidatura de Jader Barbalho, senador eleito pelo Pará, mas que, em 2001, renunciou ao mandato evitando uma possível cassação.

Durante o julgamento, chamou a atenção manifestação do ministro Gilmar Mendes para quem: “A lei é casuística, reprovável e hedionda”. Para Sua Excelência a alínea ‘k’ da lei, que torna inelegível o político que renuncia evitando sua cassação, foi incluída pelo Partido dos Trabalhadores (PT) para “resolver a eleição no Distrito Federal”. No DF, o principal adversário do candidato petista ao governo era Joaquim Roriz, que, em 2007, renunciou ao mandato de senador evitando uma possível cassação.

Essa afirmação, contudo, fora contestada posteriormente, sustentando-se que o dispositivo, na verdade, constava da versão original da proposta da Lei da Ficha Limpa. Ainda assim, o argumento trazido pelo ministro Gilmar sai do senso comum reinante e caminha em direção a um dos mais fascinantes temas do controle de constitucionalidade contemporâneo, qual seja, a possibilidade de o Judiciário declarar uma lei inconstitucional em razão de suas motivações violarem a Constituição.

É possível que o STF ingresse na motivação das leis em vigor para que defina se haveria, na hipótese, inconstitucionalidade? Parece ser esse o questionamento.

Os Estados Unidos da América realizaram discussão semelhante e provaram que, por vezes, o legislador, motivado por clamores populares e também pelo próprio jogo da política partidária, é capaz de violar a Constituição escondendo-se por trás do manto da “boa intenção legislativa”.

No início da década de 70, a Suprema Corte daquele país contava com maioria formada no sentido de que não seria possível que o Judiciário declarasse a nulidade de uma lei pelo fato de ela ter motivação inconstitucional.

No caso Palmer v. Thompson, 403 U.S. 217, (1971), a Corte entendeu que “em nenhum caso proposto à apreciação da Corte constatou-se que um ato legislativo violara a igualdade de proteção unicamente em virtude das motivações dos homens que votaram a favor dele”[1]. Negando-se a ingressar na motivação do ato legislativo, a Corte compactuou com a manutenção de uma lei que, por motivação racial, determinou o fechamento de piscinas municipais na cidade de Jackson, Estado do Mississippi, no qual já vigorava ordem judicial de dessegregação de todos os espaços públicos.

A reticência da Suprema Corte em ingressar na discussão acerca da motivação de atos legislativos no exame de sua constitucionalidade foi mantida e o festival de decepções com os resultados dos julgamentos também. A cada negativa de ingressar na motivação da lei, a violação à Constituição se mostrava mais evidente.

Nos Estados Unidos vigora a cláusula constitucional do artigo I que estabelece que não serão aprovados atos legislativos condenatórios (Bill of Attainder) sem o competente julgamento, assim como leis penais com efeito retroativo.

Em 1974, o então presidente Richard Nixon se viu atropelado por uma intensa disputa partidária, e diante do escândalo denominado Watergate, foi forçado a renunciar à presidência da maior potência do mundo. Após a renúncia, o Congresso aprovou uma lei que se chamava Lei ‘Richard Nixon’ e previa que, diferente de outros ex-presidentes, Nixon não poderia ter acesso aos seus papéis e fitas arquivados na Casa Branca até que eles tivessem sidos catalogados e revisados. A Lei não se aplicava a qualquer futuro presidente alvo de impeachment.

Uma lei feita sob medida, oxigenada por forças partidárias, para alcançar adversários específicos. No caso, um adversário: o ex-presidente dos Estados Unidos.

A Suprema Corte foi acionada quanto à constitucionalidade da Lei por meio do caso Nixon v. Administrator of General Services. Embora dividida, concluiu que a lei não era um Bill of Attainder vedado. A Corte justificou que Nixon não estava sendo punido, embora admitisse que a lei humilhava-o — humilhação à qual nenhum presidente tinha sido submetido, nem um futuro presidente o seria. O resultado do julgamento foi inusitado. A maioria entendeu que Nixon era uma legítima "classe de um"[2]. Curioso!

A luz do julgamento veio com os votos divergentes dos justices Burger e Rehnquist. Burger entendeu que a lei consistia em um Bill of Attainder proibido, pois “impunha um estigma de descapacitação a alguém que foi retirado do poder, merecidamente ou não, no sentido de que identificava explicitamente o indivíduo ou indivíduos que deviam ser penalizados”.

Burger também afirmou que “os momentos de grande sofrimento nacional dão origem às paixões e isso nos faz lembrar a razão pela qual os três ramos do Governo foram criados separados e co-iguais, cada um destinado a uma verificação, por sua vez, sobre possíveis excessos cometidos por um ou por ambos”. Para ele “o ato praticado pelo Congresso de elaborar uma lei para punir uma pessoa, ato este posteriormente ratificado pela Suprema Corte, rasga o tecido do quadro constitucional norte-americano”[3]. Burger registrou ainda que não precisaria, nem faria, qualquer investigação acerca dos motivos do Congresso em impor essa privação para apenas uma pessoa. Isso porque a jurisprudência indicava que a retaliação e a vingança não seriam elementos formadores do Bill of Attainder.

Já o justice Rehnquist fez constar na nota de rodapé 5/2 lançada no seu voto: “Eu não esqueci dos excessos de Watergate, e do impulso que esses excessos deram a esta legislação”. Vejam que os votos divergentes destacaram os excessos cometidos pela política-partidária contra um adversário político, excessos estes materializados numa lei com nome e sobrenome: Lei Richard Nixon.

Apesar da contundência dos argumentos, os justices ficaram vencidos.

Poucos anos depois, a Suprema Corte norte-americana teve um novo encontro com o seu legado. Desta vez, ela tratou de corrigir a sucessão de equívocos históricos quanto ao modo pelo qual vinha exercendo o controle de constitucionalidade de leis com motivações inconstitucionais. Apreciando os casos Washington v. Davis, 426 U.S. 229 (1976[4]) e Village of Arlington Heights v. Metropolitan Housing Development Corp, 429 U.S. 252 (1977)[5], entendeu ser “necessário provar a intenção ou o objetivo de discriminação racial para demonstrar que houve violação da Cláusula de Igual proteção”, reconhecendo, assim, a possibilidade de sindicar a intenção do legislador em atendimento ao mandamento constitucional do devido processo legislativo.

John Hart Ely, autor importante para a compreensão das nuances do judicial review norte-americano, defende a possibilidade de ingressar na motivação dos atos legislativos a fim de declará-los inconstitucionais, caso haja uma motivação contrária à Constituição. Para ele: “em primeiro lugar, existem casos concretos em que uma motivação inconstitucional, mesmo da parte do Legislativo, pode ser constatada com toda plausibilidade; e, em segundo lugar, haverá casos em que um ato que intuitivamente parece inconstitucional só poderá ser apresentado efetivamente como tal com base na teoria da motivação”[6].

Ely nos traz um interessante exemplo: “Suponhamos que um sargento da Guarda Nacional precise escolher três membros de seu pelotão, composto por seis homens, para uma tarefa particularmente perigosa de repressão a uma rebelião civil, e acabe por escolher Fulano, Beltrano e Sicrano”[7]. Nesse caso, não teríamos qualquer violação à Constituição caso a escolha tenha se baseado, por exemplo, na pontuação mais alta alcançada nas provas de tiro. Contudo, Ely fornece outro cenário. Para ele, “suponhamos, entretanto, que eles foram escolhidos por serem metodistas, ou republicanos, ou por terem ascendência polonesa – ou simplesmente porque o sargento não gostava deles. Nessas circunstâncias, nossa intuição nos diz que Fulano, Beltrano e Sicrano receberam um tratamento que não condiz com a Constituição”[8].

Não se nega a dificuldade de comprovação por parte da Corte da presença de uma motivação inconstitucional em atos legislativos. Isso porque, o Tribunal necessita demonstrar racionalmente e por meio de argumentos a presença de tal mácula. John Hart Ely, reportando-se ao exemplo da Guarda Nacional acima, diz ser óbvio que “os problemas de produção de provas seriam enormes (principalmente se os três escolhidos fossem de fato os melhores atiradores), mas é preciso perceber o que sugere o exemplo que o mesmo ato do Estado pode ser constitucional ou inconstitucional dependendo dos motivos pelos quais foi efetuado”[9].

Ely faz questão de destacar que o raciocínio não faz sentido somente na prática, mas também do ponto de vista teórico, uma vez que, “se certas pessoas forem privadas de determinado direito por motivos de raça, religião ou política, ou simplesmente porque a autoridade que faz a seleção não gosta delas, isso será incompatível com as normas constitucionais. No momento em que tal princípio de seleção foi adotado, o sistema passou a funcionar mal: de fato, podemos dizer com exatidão que a seleção negou o devido processo”[10].

No caso da Lei da Ficha Limpa poder-se-ia argumentar a impossibilidade de definir qual motivação única ou pelo menos a dominante teria maculado o processo legislativo ao qual ela fora submetida. Ely é sensível a esse tipo de questionamento e diz que “as considerações que dão pertinência à motivação não exigem que se descubra uma motivação ‘única’ (será que isso existe?) ou mesmo ‘dominante’ (o que quer que isso signifique), e sim que nos perguntemos se uma motivação inconstitucional parece ter influenciado de modo significativo a escolha: se houve tal influência, o procedimento foi ilegítimo – negou-se o ‘devido processo legislativo’ – e seu resultado deve ser declarado nulo”[11].

Vale lembrar um último caso no qual a Suprema Corte dos Estados Unidos ingressou na discussão a respeito dos motivos que guiaram a aprovação de uma dada lei.

A Assembléia Legislativa do Alabama havia aprovado uma lei que reordenava os limites do município de Tuskegee, excluindo de sua área geográfica a grande maioria dos quatrocentos eleitores negros que lá residiam. A lei teve sua constitucionalidade questionada por meio do caso Gomillion v. Lightfoot. A Suprema Corte declarou a nulidade da lei, entendendo que “leis ordinariamente legais podem tornar-se ilegais quando feitas para a obtenção de fins ilegais”[12]. A decisão foi unânime.

É preciso refletir sobre a afirmação do ministro Gilmar Mendes quanto às intenções do legislador quando introduziu a alínea ‘k’ da Lei da Ficha Limpa, que torna inelegível o político que renuncia ao mandato evitando cassação. Isso porque, não seria retórico dizer que se trata, sim, de um casuísmo e, assim o sendo, está aberta a possibilidade de o STF ingressar nesse campo para aferir sua constitucionalidade.

Leis casuísticas existem no Brasil e em outros países. Julgamentos proferidos por supremas cortes mantendo tais leis também são rapidamente identificados. O que talvez mude é a disposição da crítica jurídico-literária em rebater os argumentos da Suprema Corte. É preciso desnudar precedentes judiciais, não só o da Ficha Limpa, como também todos aqueles que afetam diretamente a vida pública brasileira.

Esse é a maior contribuição que se pode esperar daqueles que acompanham os debates constitucionais no nosso país.


[1] Relato disponível em http://www.oyez.org/cases/1970-1979/1970/1970_107. Acesso mar 2011.

[2] TRIBE, Laurence DORF, Michael. Hermenêutica Constitucional. Tradução de Amarílis de Souza Birchal; coordenação e supervisão de Luiz Moreira. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 39.

[3] Relato disponível em http://www.oyez.org/cases/1970-1979/1976/1976_75_1605. Acesso mar 2011.

[4] Relato disponível em http://www.oyez.org/cases/1970-1979/1975/1975_74_1492. Acesso mar 2011.

[5] Relato disponível em http://www.oyez.org/cases/1970-1979/1976/1976_75_616. Acesso mar 2011.

[6] ELY, John Hart. Democracia e desconfiança: uma teoria do controle judicial de constitucionalidade. Título original: Democracy and distrust: a theory of judicial review. Tradução Juliana Lemos. Revisão técnica Alonso Reis Freire. Revisão da tradução e texto final Marcelo Brandão Cippola. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2010, p. 186.

[7] Ibidem, p. 183/184.

[8] Ibidem, p. 184.

[9] Ibidem, p. 184.

[10] Ibidem, p. 184.

[11] Ibidem, p. 185/186.

[12] Relato disponível em http://www.oyez.org/cases/1960-1969/1960/1960_32. Acesso mar 2011.

terça-feira, 22 de março de 2011

Enccla é contra projeto de anistia a dinheiro ilegal

A Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (Enccla) divulgou nota em que se manifesta contrária ao Projeto de Lei 354/2009, do Senado, que concede anistia para que recursos financeiros que brasileiros possuem no exterior, não declarados à Receita Federal, sejam trazidos de volta ao território nacional.

A Enccla é formada por diversos órgãos, dentre eles o Ministério da Justiça, Ministérios Públicos federais e estaduais, polícias, Receita Federal, Tribunal de Contas da União, Controladoria-Geral da União e Advocacia-Geral da União. De acordo com a nota, o projeto pode causar graves danos ao sistema nacional de combate à corrupção, lavagem de dinheiro e crime organizado, além de afrontar a imagem e posição assumida pelo país em foros internacionais, como no Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro (Gafi).

O projeto prevê a extinção da punibilidade de crimes relacionados aos valores repatriados e, de acordo com a Enccla, "dessa forma, na contra-mão do esforço nacional e internacional de combater o nefasto crime de lavagem de dinheiro, o Estado estará auxiliando na realização da etapa final do processo de lavagem, qual seja, a integração à economia formal de valores ilicitamente expatriados e sua consequente legalização".

A proposta está na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, aguardando a designação de relator para a proposta. Caso seja aprovado, segue para votação na Câmara dos Deputados. Com informações da Assessoria de Imprensa do Ministério da Justiça.

Leia aqui a íntegra da nota da Enccla.