segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Suspenso julgamento sobre competência do STF para julgar atos de improbidade

Pedido de vista do ministro Luís Roberto Barroso suspendeu o julgamento do agravo regimental interposto contra decisão do ministro Ayres Britto (aposentado) na Petição (PET) 3240, na qual foi determinada a baixa para a primeira instância de uma ação por improbidade administrativa contra o deputado federal Eliseu Padilha, por suposto delito cometido quando era ministro de Estado. Único a votar, o atual relator do processo, ministro Teori Zavascki, manifestou-se no sentido da competência do Supremo Tribunal Federal (STF) para julgar o caso.

No agravo, a defesa de Eliseu Padilha sustenta que existem decisões do STF no sentido de que os agentes políticos, por estarem regidos por normas especiais de responsabilidade, não respondem por improbidade administrativa com base na Lei 8.429/1992, mas apenas por crime de responsabilidade. De acordo com o relator, o STF ainda não tem posição firmada sobre o tema, que na verdade envolve duas questões: a possibilidade de submissão de determinados agentes públicos ao duplo regime sancionatório – com relação aos dispositivos e normas que tratam dos atos de improbidade administrativa (Lei 8429/1992) e dos crimes de responsabilidade (Lei 10.079/1950) –, e a existência de prerrogativa de foro para atos de improbidade administrativa.

Duplo regime

Sobre o duplo regime, o ministro revelou que a única alusão a ato de improbidade como crime de responsabilidade é o artigo 85 (inciso V) da Constituição Federal, que trata dos atos de improbidade praticados pelo presidente da República. Só nesse caso, no âmbito material, haveria concorrência de regimes, entre o que dispõe o artigo 37 (parágrafo 4º) da Constituição e o artigo 85 (inciso V), também da Carta da República.

Para o ministro, exceto nesses casos de atos de improbidade administrativa cometidos pelo Presidente da República, que prevê regime especial, não há na Constituição Federal qualquer dispositivo que imunize os agentes políticos, sujeitos a crime de responsabilidade, a qualquer das sanções previstas para atos de improbidade.

Prerrogativa de foro

Quanto à prerrogativa, Teori Zavascki disse entender que a solução prevista para o problema seria reconhecer para as ações de improbidade a prerrogativa de foro assegurada para as ações penais, da mesma forma como se entende competir ao STF julgar ação de improbidade contra seus próprios membros. Esta solução respeita o sistema de competências estabelecido na Constituição. Para o ministro, não se pode permitir a um juiz de primeira instância processar um ministro do Supremo, ou um agente público de relevo nacional, principalmente se a decisão puder acarretar a perda do cargo.

Além disso, o ministro disse entender que o ato de improbidade, embora não tenha natureza penal, mantém laços fortes com a seara criminal. Segundo ele, são semelhantes as consequências das reprimendas, sendo que somente a pena privativa de liberdade é característica da ação penal. No mais, as consequências são iguais, garantiu.

Mesmo se dizendo não favorável ao regime extensivo de prerrogativa de foro previsto na Constituição, o ministro frisou que, sob o ponto de vista constitucional, é legítima a preservação da prerrogativa de foro para as ações de improbidade administrativa. Não há base para excluir da aplicação das sanções por improbidade os ministros de Estado, concluiu o ministro.

Assim, o ministro Teori Zavascki votou no sentido de dar provimento ao agravo para reconhecer a competência do STF para processar e julgar ação de improbidade contra o requerido, hoje deputado federal, por atos praticados quando era ministro de Estado, determinando o desmembramento quanto aos demais processados, que não detêm prerrogativa perante o STF.

Clésio Andrade

Antes de analisar o processo que trata do caso de Eliseu Padilha, os ministros declararam prejudicada a PET 3067, que envolve suposto ato de improbidade administrativa praticado pelo ex-senador Clésio Andrade. No início do julgamento, o ministro Luís Roberto Barroso, relator, havia se manifestado no sentido de não existir prerrogativa de foro para parlamentar federal em casos de improbidade administrativa.

O julgamento foi retomado hoje, com voto-vista do ministro Teori Zavascki, que informou ao Plenário que, após seu pedido de vista, o senador renunciou ao cargo. Diante do fato, ele propôs que o STF declare a competência do juízo de primeiro grau para processar a causa. A decisão, nesse caso, foi unânime.

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Adiada análise de RE sobre indenização por declarações de ministro de Estado supostamente ofensivas

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) definirá se deve haver indenização por dano moral sobre declarações públicas, supostamente ofensivas à honra, proferidas por ministro de Estado no exercício do cargo. O julgamento da matéria foi interrompido por pedido de vista do ministro Luiz Fux na análise de Recurso Extraordinário (RE) 685493, com repercussão geral reconhecida.
O recurso foi interposto por Luiz Carlos Mendonça de Barros, ministro das Comunicações à época dos fatos, contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que o condenou ao pagamento de indenização de mais de dois milhões de reais, por danos morais, a Carlos Francisco Ribeiro Jereissati. Isto porque em novembro de 1998, durante o processo de privatização do sistema Telebrás, foram divulgadas gravações clandestinas de conversas telefônicas entre ele e o então presidente do BNDES, André Lara Resende.
O teor das conversas foi publicado por uma revista de grande circulação e, de acordo com os autos, “as gravações exprimiam a preferência do ministro das Comunicações pela vitória de um dos consórcios que viriam a disputar o leilão para a alienação do controle do grupo Tele Norte Leste, fato que colocaria em dúvida a lisura do certame licitatório”. Depois disso, Luiz Carlos Mendonça de Barros passou a atribuir publicamente a Carlos Jereissati a autoria da divulgação do conteúdo de gravações de áudio do episódio que ficou conhecido como “grampo do BNDES”. Por entender que a conduta do então ministro ofendeu sua honra, Carlos Jereissati ajuizou ação de indenização por danos morais.
Liberdade de expressão
No RE, Luiz Carlos Mendonça de Barros sustenta que a decisão questionada teria violado o princípio da liberdade de expressão, na medida em que somente haveria veiculado uma opinião pública de cunho crítico, alcançada pela garantia constitucional da livre manifestação do pensamento, não se verificando dano moral em tais críticas. Alega também que as declarações de ministros de Estado, prestadas no âmbito do cargo acerca de temas inerentes à respectiva atuação, não ensejariam indenização resultante de dano moral, salvo em situações excepcionais.
Ressalta ter o tribunal de origem, ao equiparar o dano moral supostamente sofrido pelo recorrido à “morte moral” e fixar a indenização em vultosa quantia, transgredido os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Assevera ausência de abalo nos negócios do recorrido após as declarações, bem como inexistência de transtorno na vida política e social desse.
Voto do relator
Relator do processo, o ministro Marco Aurélio votou pelo provimento do recurso a fim de que seja reformado o acórdão do STJ. De início, o ministro observou que o cerne da questão é saber se ministros de Estado e demais agentes públicos possuem imunidade relativa pela veiculação de opinião e palavras. “Incumbe ao Supremo revelar qual é a extensão da liberdade de expressão conferida aos agentes políticos à luz do artigo 5º, inciso IX, da Carta de 1988”, ressaltou o ministro ao salientar que a liberdade de expressão é um “direito de primeira grandeza na ordem constitucional de 1988”.
Para o ministro Marco Aurélio, os agentes políticos inseridos no Poder Executivo, embora não possuam imunidade absoluta no exercício da função, devem também ser titulares de algum grau de proteção conferida pela ordem jurídica constitucional. O relator destacou que existe evidente interesse público em que os agentes políticos mantenham os administrados plenamente informados a respeito da condução dos negócios públicos, bem como quanto ao funcionamento das instituições e de eventuais prognósticos. Além disso, ele ressaltou a necessidade de reconhecer algum grau de simetria entre a compreensão do direito à privacidade e do regime a liberdade de expressão. 
Segundo o relator, o público pode ter interesse em saber como anda a condução da política econômica, a apuração de um crime e quais os possíveis impactos de nova uma política pública no campo da segurança. “Reconhecer a imunidade relativa no tocante aos agentes do Poder Executivo – tal como ocorre com os membros do Poder Legislativo no que tange às opiniões, palavras e juízos que manifestem publicamente –, é importante no sentido de fomentar o livre intercâmbio de informações entre eles e a sociedade civil”, avaliou.
“Interpretar o ordenamento jurídico de modo a restringir demasiadamente o grau de liberdade de manifestação pública conferida aos agentes políticos serve ao propósito de criar uma mordaça, ainda que sob a roupagem de proteção de outros direitos fundamentais”, afirmou o ministro Marco Aurélio. “Além disso, mostra-se necessária a existência de um ambiente de segurança jurídica para que pessoas verdadeiramente comprometidas com o interesse público venham a ocupar os cargos políticos”, lembrou, acrescentando que o risco de um agente público “ser processado a todo o tempo por grupos politicamente descontentes tem como consequência uma atitude defensiva a dificultar a prestação de contas à população, além de desestimular que os indivíduos concorram a cargos públicos de cúpula”.
O relator do RE destacou que aqueles que ocupam cargos públicos têm a esfera de privacidade reduzida porque o regime democrático impõe que estejam mais abertos à crítica popular. “Em contrapartida, devem ter também a liberdade de discutir, comentar e manifestar opiniões sobre os mais diversos assuntos, com maior elasticidade que os agentes privados, desde que naturalmente assim o façam no exercício e com relação ao cargo público ocupado”, ressaltou.
Quanto ao caso concreto, o ministro Marco Aurélio afirmou que as opiniões das partes foram veiculadas no “calor do momento”, sem maior reflexão ou prova das declarações. Segundo ele, em nenhuma entrevista o autor do RE explicitou a acusação de que Carlos Francisco Ribeiro Jereissati teria praticado crime referente à interceptação ilegal das linhas telefônicas, “ao contrário, as manifestações eram sempre no sentido da ausência de certeza quanto ao que apontado: a divulgação das fitas”. O relator também observou que as afirmações feitas pelo recorrente ocorreram durante o processo de privatização da telefonia no país, conduzido por ele na condição de ministro. “É gravíssima a interceptação telefônica de um ministro de Estado à margem da lei”, disse o ministro ao completar que “esse tema mostra-se de interesse público”.