domingo, 21 de agosto de 2011

Uma nova governança para as agências reguladoras

Deixando de lado a questão político-partidária e a interpretação equivocada quanto ao modelo weberiano, o texto apresenta o estágio da evolução da gestão pública brasileira. Vale lembrar que David Rogers ofereceu argumentos semelhantes, mas relativos à realidade norte americana nos idos de 1981 (AMACOM, May 1981). Outro ponto que merece destaque se refere à tendência universal de aumento de indicações políticas para cargos da alta administração, tal como nos Estados Unidos (Dunn: 1997; Light: 1995; Peters and Pierre: 2004). Na montagem da equipe de governo, os indicados políticos podem assumir posições tanto em órgãos setoriais (Matheson: 2007) quanto em assessorias políticas descoladas da hierarquia formal do governo (James: 2007).
Por Sérgio Guerra
Sabe-se que a organização pública brasileira vem sendo paulatinamente aprimorada visando à estruturação de um Estado (pós) moderno, mais preocupado com os interesses dos cidadãos. Contudo, muito há que ser feito para se alcançar satisfação mínima e legitimação do Estado perante o cidadão brasileiro.
O que, na prática, se observa no Brasil está próximo de um modelo ainda não totalmente superado de uma administração inspirada — mas, não totalmente alcançada— no modelo weberiano, com ilhas de excelência, rotulada de pesada, lenta e ineficiente, que acaba por frustrar a sociedade.
Nesse contexto muito se debate acerca da forma ideal de atuação da administração pública brasileira nos tempos atuais. Parece ser unânime que deva ter como vetor a agilidade, eficiência, e, assim, ter capacidade para resolver os problemas cotidianos da população.
Por que essa questão vem se intensificando e pautando os debates mais recentes sobre a atuação da administração pública, inclusive a sua reforma, não só na formulação de mecanismos de controle da qualidade de gasto público, como também no estabelecimento de diretrizes?
Inicialmente, em função da Constituição Federal de 1988. Ali está posto o desenho de um novo Estado de Direito, agora democrático, estruturando a ordem social focada no trabalho, bem-estar e justiça social, e a ordem econômica sobre os pilares da livre iniciativa e valorização do trabalho humano.
Sob o ideal de que compete ao Estado formular políticas públicas visando, cumulativamente, regular a competitividade nos mercados e promover o bem-comum da sociedade (meio), o foco, a meta maior, passa a ser alcançar instrumentos de elevação e proteção da dignidade da pessoa humana (fim).
Presencia-se um novo e instigante sistema, em que o protagonismo do Poder Executivo — o conhecido intervencionismo exacerbado, no campo econômico — deve ceder lugar à atuação estatal regulatória, com desafios atinentes à alta complexidade cotidiana e questões sociais que demandam novas soluções para atingir o bem-estar do cidadão.
Diante desses desafios impostos à chefia do poder Executivo, ainda que se leve em conta a teoria da “reserva do possível”, não há dúvida de que as ações governamentais necessitam de melhor aplicação dos recursos orçamentários, ao contrário do que, em muitos casos, ainda ocorre sob o rótulo da vetusta escolha discricionária. Áreas que abrangem políticas públicas voltadas à distribuição de renda, alimentação, oferta de empregos, segurança, investimentos em educação, acesso à justiça, melhorias na saúde e programas de infraestrutura para moradia e saneamento básico devem ser a base central do planejamento, imposto, de forma aberta, aos governos pelo atual sistema constitucional.
Em suma, se o Estado brasileiro passa a ser regulador, com objetivos definidos constitucionalmente, a sociedade necessita de uma governança pública orientada para o planejamento e a transparência dos resultados alcançados com a ação governamental. Ainda hoje, no Brasil, depara-se com certa opacidade no planejamento e na capacidade para implementar, adequadamente, as políticas públicas nessas áreas essenciais para o desenvolvimento da sociedade. Ao contrário, o acompanhamento dos resultados deve ser realizado, objetivamente, por meio de indicadores de desempenho, métricas e índices. Os resultados da ação estatal devem ser avaliados, mensurados e controlados pela sociedade. Só assim, será possível abandonar o casuísmo e traduzir as consequências das ações políticas, das escolhas públicas, em melhores condições de vida para a população.
O governo federal anterior ao governo Dilma Rousseff já tentou alterar a forma de executar algumas das ações estatais em áreas estratégicas. Seguindo tal posicionamento, órgãos da administração federal passariam a trabalhar sob um novo formato de atuação: a administração gerencial. Dentre várias ações foram criadas, ou reestruturadas, no bojo do processo de desestatização, entidades reguladoras independentes (autarquias especiais vinculadas, e não subordinadas ao poder público central), compondo, em parte, a chamada administração descentralizada ou indireta.
Essas agências reguladoras, contudo, vêm sofrendo grande pressão política e atuando de forma pouco transparente. Veja-se, por exemplo, a questão dos chamados bens reversíveis nas concessões reguladas pela Anatel.
O cerne dos problemas das agências reguladoras está, especialmente, na composição do seu quadro de dirigentes. No atual cenário político nacional a chefia do poder Executivo federal — e seu partido político — se vale de um “governo de coalizão” para obter maioria no Congresso Nacional e aprovar as políticas públicas de seu interesse. Também parece ser indisputável que esses partidos políticos “aliados” acabam por não ter efetivo compromisso com os programas do governo eleito e, assim, visam, salvo raras exceções, alcançar interesses menores, que se aproximam do fisiologismo.
Assim, se mantidas como originalmente criadas, é de todo recomendável que o governo siga na linha da recente criação da Câmara de políticas de gestão, desempenho e competitividade, tendo à frente o empresário Jorge Gerdau Johannpeter, além de Abílio Diniz, Antônio Maciel Neto e Henri Reichstul.
Para dar eficiência às agências reguladoras dever-se-ia ter, no mínimo, um conselho consultivo para cada sistema regulado, atuante, e composto por pessoas de notório reconhecimento público no setor.
A identificação dos diretores das Agências deveria ser feita por esse conselho consultivo ou por meio de um comitê de busca, escolhido pelo conselho, formado por personalidades de notório reconhecimento público. Cada conselho deveria ter como responsabilidade: 1) defender um orçamento factível para a agência, junto ao poder público central; 2) estabelecer o plano de gestão e o plano de execução das metas a serem alcançadas anualmente; 3) criar mecanismo de controle efetivo (não meramente formal), dentre outros controles já institucionalizados no país, das atividades desenvolvidas pela direção do ente regulador; e, 4) disponibilizar, via internet, o processo de acompanhamento e controle da gestão e das metas.
Com a adoção dessas medidas a presidente Dilma estaria direcionando os entes reguladores para o desenvolvimento de atividades típicas de Estado e, assim, atuariam eficazmente em áreas que demandam decisões preponderantemente técnicas visando o bem-estar da sociedade e de cada um dos cidadãos brasileiros, nos termos preconizados na Constituição Federal de 1988.

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