quarta-feira, 16 de maio de 2012

Entidades começam a fazer pedidos à Lei de Informação

Diversas organizações públicas já se preparam para protocolar hoje, ou nos próximos dias, pedidos para a abertura de informações em todos os níveis de governo, baseadas na Lei de Acesso à Informação que entra em vigor hoje. Os pedidos em preparação envolvem os mais variados assuntos, do andamento real das obras da Copa do Mundo em todas as cidades-sede às condições de saúde de presas no sistema prisional paulista, passando por como são aplicados recursos do fundo setorial da indústria para a inovação e uma lista de cada um dos proprietários de títulos da dívida pública brasileira.
A Lei de Acesso à Informação (12.527), sancionada em novembro do ano passado, entra em vigor hoje. Ela obriga o poder público em todas suas esferas - municipal, estadual e federal - a fornecer informações solicitadas por cidadãos, empresas e entidades da sociedade civil organizada. Para especialistas, trata-se de um marco da organização do Estado brasileiro e um avanço democrático, além contribuir para o controle social de governos e ajudar no planejamento e decisões sobre negócios.
O Instituto Ethos, grupo que trabalha para promover a prática da responsabilidade social no setor privado, participou de todos os momentos da discussão e elaboração da nova legislação. O gerente-executivo da entidade, Caio Luiz Carneiro Magri, informa que vai acionar as prefeituras das 12 capitais-sede da Copa do Mundo. "Estamos prontos para protocolar 12 pedidos de informação sobre toda a situação de infraestrutura e dos recursos utilizados nas obras da Copa. É preciso ter uma ação de acompanhamento dessas obras, faz um ano que tentamos e até hoje não conseguimos sistematizaras informações", diz.
Segundo ele, a iniciativa será uma prova para testar a nova lei e uma oportunidade para dar mais transparência aos processos relacionados ao evento esportivo. "Queremos essas informações, saber onde elas estão e qual a capacidade de transparência do poder público. Aí vamos analisar os dados e podemos criar um ranking de transparência municipal."
No setor produtivo, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) também está atenta à nova legislação e tem perguntas para fazer, principalmente à administração federal. Segundo Pablo Silva Cesário, gerente da unidade de relacionamento com o Poder Executivo da CNI, o país está estreando um novo formato de avaliação e monitoramento das políticas públicas. "Teremos um pacote, que ainda não está fechado porque é um leque grande de assuntos. Vamos buscar informação sobre execução de obras públicas, formação das taxas do Siscomex [sistema integrado de dados sobre comércio exterior ligado à Receita Federal] e várias outras sobre os fundos setoriais do setor produtivo, como o de inovação. A arrecadação desse fundo está correta? Está indo para o lugar certo? Não é trivial saber isso", comenta Cesário.
A lista de demandas do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra é extensa, abrange várias áreas do governo federal e não aborda apenas temas ligados à reforma agrária. O movimento social quer saber do Tesouro Nacional quem é cada um dos proprietários de títulos da dívida pública brasileira, o valor do título, a data da compra e os rendimentos por mês. Para o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, será solicitado o registro de cada uma das famílias assentadas, com nomes por assentamento, data da criação do projeto dos lotes e detalhamento (via desapropriação, compra, terra pública ou regularização fundiária), e também será cobrada uma lista das propriedades com mais de 1.000 hectares, com tamanho da área, local e nome do proprietário.
Entre as demandas dos sem-terra também está a relação de empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) a empresas do agronegócio, com especificações referentes ao valor da operação, data do empréstimo, condições, taxa de juros e prazo para o pagamento.
Rafael Custódio, coordenador do programa de justiça da Conectas, conta que a ONG de direitos humanos também pedirá hoje ao governo paulista detalhamento sobre o sistema prisional do Estado. "Queremos saber quais são as condições de higiene e saúde principalmente das mulheres presas. Há um déficit de dados que inviabiliza uma profunda e firme discussão sobre o tema, já que o quadro que se pinta daquele cenário é borrado, quando não incompleto". A Conectas ainda vai solicitar ao Itamaraty a divulgação de um relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) que aborda questões de tortura e maus-tratos em cadeias e unidades de saúde mental de internação forçada.
Fabiano Angélico, jornalista especializado em transparência pública, explica que a Lei de Acesso à Informação terá vários níveis de implementação até se alcançar um nível razoável de sistematização de dados, o que "depende muito" da publicação do decreto que detalha o funcionamento da legislação. O especialista vê problemas na implementação da regra em Estados e municípios e também lembra que o governo federal está melhor preparado por ter um órgão como a Controladoria Geral da União (CGU) envolvendo as outras áreas da administração.
"A lei é clara: a transparência é regra, sigilo é exceção. Além de questões de sigilo e risco comerciais, todo o resto é informação potencialmente pública. Mas pelo que eu tenho acompanhado não é um assunto muito popular. Jornalistas e entidades mais organizadas têm mais contato com isso, uma lógica que mudará pouco a pouco quando as pessoas e empresas perceberem que o potencial da lei", diz Angélico.
Em seminário na Fundação Getulio Vargas (FGV) que discutiu a nova lei, Francisco Bernardes Costa Filho, da Procter & Gamble, disse que a lei é útil para a obtenção e organização de informações que possam subsidiar o planejamento e a decisão de investimento de empresas. Valter Pedrosa, da Braskem, comentou sobre a pressão que o setor privado terá para melhorar suas práticas institucionais. "É um novo mecanismo de controle social que vai envolver também as empresas com relação com o poder público, por isso elas têm que fortalecer cada vez mais áreas de responsabilidade social.
Decreto que regulamenta a regra só será divulgado hoje
Entra em vigor hoje a Lei de Acesso à Informação (LAI), que permite a qualquer cidadão solicitar aos órgãos da administração pública informações sobre seus dados, atividades e aplicação de recursos. A legislação vale para os três Poderes e abrange também as autarquias, fundações, empresas públicas e todas as entidades controladas pela União, Estados e municípios. De acordo com a Controladoria-Geral da União (CGU), responsável pelo acompanhamento da aplicação da lei no Executivo federal, mais de 300 servidores de todos os órgãos foram treinados para responder às solicitações. Embora a lei entre em vigor hoje, o decreto que a regulamenta só será publicado hoje no Diário Oficial.
Cada ministério terá um Serviço de Informações ao Cidadão (SICs), onde as pessoas poderão preencher pessoalmente um formulário - com nome e documento de identificação - solicitando os dados. Haverá ainda o E-SIC, para os pedidos pela internet, por meio de site (ver abaixo).
Segundo o secretário de Prevenção à Corrupção da CGU, Mário Vinícius Spinelli, as solicitações feitas por meio dos SICs presenciais serão lançadas no sistema eletrônico. "O E-SIC vai centralizar todas as solicitações de informação, será a porta de entrada única. Nós criamos o sistema para que possamos produzir estatísticas, acompanhar os prazos, o tempo médio de resposta dos ministérios", explicou.
De acordo com Spinelli, todos os ministérios já estão prontos para atender à população. Em todas as Pastas consultadas pelo Valor, de dois a cinco servidores foram deslocados para essa função. Após a solicitação, os órgãos terão 20 dias, prorrogáveis por mais dez dias mediante justificativa, para responder a demanda. Em caso de negativa do órgão em fornecer a informação, o cidadão poderá apresentar recurso. Os detalhes desse processo e as possíveis punições ao funcionário público que se recusar a atender ao pedido, entre outras pendências da lei, serão definidos no decreto que sai hoje.
A lei de acesso à informação também prevê a divulgação, pelos órgãos públicos, em seus sites na internet, de dez itens obrigatórios, entre eles, estrutura organizacional, ações e programas, auditorias, convênios, despesas, servidores, licitações e contratos. "Isso é o que nós chamamos de transparência ativa, que é o órgão divulgar a informação sem a solicitação do cidadão", explicou Spinelli. Todos os ministérios ligados à área econômica (Fazenda, Planejamento, Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, além do Banco Central) já vão disponibilizar essas informações a partir de hoje.
Luciano Máximo - De São Paulo
Yvna Sousa - De Brasília

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