A Procuradoria-Geral da República (PGR) ajuizou, no Supremo Tribunal
Federal (STF), a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4899, com
pedido de liminar, tendo por objetivo impedir que os candidatos a cargos
eletivos que tenham suas contas desaprovadas pela Justiça Eleitoral
obtenham certidão de quitação eleitoral.
Para tanto, pede que seja dada interpretação conforme a Constituição
Federal (CF) ao parágrafo 7º do artigo 11 da Lei 9.504/97 (Lei das
Eleições), para que a expressão “apresentação de contas”, dele
constante, seja compreendida em consonância com os preceitos
constitucionais.
A Lei
A 9.504/97 estabeleceu em seu artigo 11, parágrafo 1º, inciso VI, a
exigência de certidão de quitação eleitoral, emitida pela Justiça
Eleitoral, como condição para registro de candidaturas a cargos
eletivos.
Entretanto, a Lei 12.034/09, entre várias modificações introduzidas
na Lei 9.504/97, acrescentou o parágrafo 7º ao artigo 11, dispondo que
“a certidão de quitação eleitoral abrangerá exclusivamente a plenitude
do gozo dos direitos políticos, o regular exercício do voto, o
atendimento a convocações da Justiça Eleitoral para auxiliar os
trabalhos relativos ao pleito, a inexistência de multas aplicadas em
caráter definitivo, pela Justiça Eleitoral e não remitidas, e a
apresentação de contas de campanha eleitoral”.
A PGR sustenta a tese de que “a única exegese compatível com a
Constituição Federal da expressão ‘apresentação de contas’, constante no
parágrafo 7º do artigo 11 da Lei 9.504/97, é aquela que a entende em
seu sentido substancial, interpretando-a, portanto, como a apresentação
totalmente regular da prestação de contas de campanha (em tempo oportuno
e sem que sejam detectadas falhas que lhes comprometam a
regularidade)”.
É que, segundo a Procuradoria-Geral, o Tribunal Superior Eleitoral
(TSE) tem dado, em diversos precedentes, interpretação literal à norma
em questão. De acordo a PGR, tal entendimento “importa em violação ao
dever constitucional de prestação de contas (artigos 17, inciso III, e
70, parágrafo único), ao princípio da moralidade para o exercício do
mandato e ao dever do Estado de proteger a normalidade e a legitimidade
das eleições contra o abuso do poder econômico (artigo 14, parágrafo
9º)”.
TSE
A Procuradoria recorda que, na ausência de previsão normativa
específica sobre a abrangência do conceito de quitação eleitoral, o TSE
editou, em vista da previsão do artigo 11, parágrafo 1º, inciso VI, da
Lei 9.504/97, a Resolução 21.823/04. De acordo esta norma, entre outras
situações, a ausência de regular prestação de contas de campanha
constituiria obstáculo à obtenção de certidão de quitação eleitoral.
Esse entendimento, de acordo com o PGR, vigorou nas eleições de 2006.
Assim, candidatos que não prestaram contas dos recursos utilizados em
eleições anteriores tiveram indeferidos seus registros de candidatura,
por ausência de quitação eleitoral.
Também nas instruções relativas às eleições de 2008, a Resolução
22.715/08 do TSE, que regulamentou a aplicação dos recursos de campanha
nas eleições municipais, estabeleceu, em seu artigo 41, parágrafo 3º,
"que a decisão que desaprovar as contas de candidato implicará o
impedimento de obter a certidão de quitação eleitoral durante o curso do
mandato ao qual concorreu”. E nesse contexto, “impedimento” para
obtenção da certidão de quitação eleitoral alcançava as hipóteses de não
apresentação das contas, de sua apresentação fora de prazo ou,
ainda, sua desaprovação, durante o período do mandato para o qual o
candidato concorreu, até a efetiva apresentação.
Em 2009, foi incluído o parágrafo 7º ao artigo 11 da Lei das Eleições
e, inicialmente, o TSE manteve, mesmo depois da edição dessa lei, o
entendimento de que a satisfação do requisito da quitação eleitoral
exige, além da apresentação das contas, sua correspondente aprovação.
Mas, observa a PGR, ao julgar processos referentes a registros de
candidaturas para as eleições de 2010, o TSE deferiu registros com
fundamento na tese de que, com a edição da Lei 12.034/09, “a mera
apresentação de contas de campanha seria suficiente para a obtenção da
certidão de quitação eleitoral, não havendo que se valar em sua
aprovação”.
Ainda segundo a Procuradoria, ratificando essa posição, em virtude da
modificação na composição do TSE, aquele tribunal editou a Resolução
23.376/12, mudando a jurisprudência no sentido de que a simples
apresentação de contas de campanha seria suficiente à obtenção da
quitação eleitoral. Assim, conforme a autora, candidatos cujas
prestações de contas foram desaprovadas pela Justiça Eleitoral não mais
estão impedidos de disputar novas eleições, já que a desaprovação de
suas contas de campanha não implica a impossibilidade de obter a
certidão de quitação eleitoral.
Lembra a PGR que o entendimento vigente anteriormente visava
resguardar os princípios constitucionais da moralidade, de probidade e
da transparência, sob pena de esvaziar-se o seu conteúdo. E, ainda de
acordo com a autora, os números da própria Justiça Eleitoral evidenciam
as consequências da falta de eficácia das normas referentes à prestação
de contas. Para tanto, cita levantamento da Corregedoria do TSE no qual
consta que, em março de 2012, 21 mil candidatos haviam tido suas contas
desaprovadas pela Justiça Eleitoral.
“Assim, o posicionamento atual do TSE, ao esvaziar o conteúdo do
dever dos candidatos de prestarem contas, permitindo a impunidade
daqueles que praticam irregularidades graves na movimentação de recursos
nas campanhas eleitorais, contraria as diretrizes constitucionais, às
quais deve conformar-se todo o sistema jurídico eleitoral”, afirma PGR.
Pedidos
Ao requerer o deferimento de medida liminar, a Procuradoria-Geral da
República sustenta a plausibilidade do direito invocado e o risco na
demora em definir o conteúdo do conceito de quitação eleitoral,
observando que a Justiça Eleitoral examina, no momento, as prestações de
contas dos candidatos que concorreram às eleições de 2012, “sendo de
todo recomendável que tal análise ocorra já a partir das balizas de
interpretação fixadas pelo Supremo Tribunal Federal quanto às
implicações das decisões que eventualmente desaprovem as contas de
campanha”.
No mérito, pede a procedência do pedido para que a expressão
"apresentação de contas", constante no parágrafo 7º do artigo 11 da Lei
das Eleições, seja compreendida de acordo com princípios
constitucionais.
O relator da ADI 4899 é o ministro Luiz Fux.
FK/AD
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